Nélida Reis Caseca Machado
RESUMO
Este estudo analisa a adoção de crianças e adolescentes quilombolas,
prevista no Estatuto da Criança e do Adolescente, art. 28, §6º, I e II.
Verifica que os princípios que regem a proteção dos menores, mormente o
princípio da proteção integral, não se coadunam com a proteção prevista
para os quilombolas, pois esta prevê uma proteção ao grupo, tendo como
objeto a cultura. Considera que as possibilidades hermenêuticas do texto
poderiam significar um retrocesso na proteção integral da criança e do
adolescente e faz algumas ponderações acerca da interpretação e das
implicações decorrentes da previsão normativa. Pretende contribuir para a
discussão ante o escasso material que aborda a questão.
INTRODUÇÃO
O nome escolhido para este trabalho, adoção em terras quilombolas,
embora sugira, não tem a intenção de detalhar ou retratar como é feito a
adoção dentro dos grupos quilombolas conforme os costumes das
comunidades. O objeto é avaliar como a sociedade majoritária quer
disciplinar a adoção do grupo vulnerável quilombola.
Esta questão
revela ser de grande importância em virtude de ser uma forma de política
pública e demonstrar a intenção e o agir do Estado. Inclusive porque
Marie Pierre Poirier, a representante do Unicef - Fundo das Nações
Unidas para a Infância no Brasil – criticou, no 1º Encontro Nacional de
Crianças e Adolescentes Quilombolas[1], a exclusão de crianças
quilombolas e negras das políticas públicas implementadas no Brasil.
Alegou que não há conhecimento específico acerca do número destas
crianças e por isso elas ainda estariam na invisibilidade. Sustenta que,
em pleno século 21, a realidade brasileira demonstra que nascer branco,
negro ou indígena continua determinando as oportunidades que as pessoas
têm de ter acesso ao trabalho, à saúde, à educação, à proteção contra
os abusos e violações de direitos[2]. E, ainda que haja projetos
criativos na área social, existem enormes desigualdades no Brasil.
Em sua avaliação, é grave que muitas crianças quilombolas com menos de
um ano morram antes de obter a certidão de nascimento e não seria
coincidência que, das 800 mil crianças brasileiras de 7 a 14 anos que
estão fora da escola, 500 mil sejam negras[3]. E mais, a exclusão
através da discriminação e do racismo continua ao longo da vida escolar e
profissional.
Considerando estes dados, o cenário de inserção dos
quilombolas, um grupo vulnerável, não revela ser uma paisagem de orgulho
para o Brasil. No entanto, há várias previsões legislativas no intuito
de proteger e incluir os quilombolas, mesmo não sendo uma legislação
exatamente eficaz.
Em 2009, em mais uma tentativa, desta vez
veiculada às crianças e adolescentes quilombolas, através da Lei n.
12.010 tentou-se proteger o grupo vulnerável. Esta Lei incluiu no
estatuto da criança e dos adolescentes, nas disposições gerais – Da
família substituta – art. 28, o parágrafo 6º, I e II[4],que dispôs que
deveriam ser consideradas e respeitadas a identidade social e cultural,
os costumes e tradições, bem como instituições como requisito
obrigatório para a colocação de criança ou adolescente quilombola em
família substituta, seja em virtude da guarda, da tutela ou da adoção.
E mais. Que a colocação familiar ocorra prioritariamente no seio da
comunidade ou junto de membros da mesma etnia, com a participação de
antropólogos, perante a equipe interprofissional ou multidisciplinar
para acompanhar o caso.
Entretanto, esta previsão normativa gera
mais dúvidas do que exatamente uma efetiva proteção, tanto que quase
nenhum material aborda o tema e os poucos encontrados apenas se referem a
ela como um ganho na proteção. A dúvida advém, então, em qual seria
exatamente a proteção à criança quilombola.
Isto porque a proteção,
nos moldes normativos, não é bem delimitada e há várias situações a
serem analisadas para se encontrar um resultado real e não se vislumbra,
inicialmente, um bom diálogo entre as fontes, seja analisando a
proteção das crianças e dos adolescentes, seja analisando a proteção do
quilombola, bem como do quilombola em adoção, como se verá.
Assim,
este artigo, como se disse, tem como objetivo lançar luzes ao preceito
normativo, para que se possa avançar, realmente, na defesa da criança
quilombola e auxiliar na aplicação da norma. Para tanto, o trabalho foi
dividido em três itens. O primeiro aborda a adoção com seu evoluir
histórico, o segundo trata de identificar o quilombola e o terceiro
questiona a adoção do quilombola.
(...)
Nélida Reis Caseca
Machado - Mestre em Direito (Constitucionalismo e Democracia) pela
Faculdade de Direito do Sul de Minas (FDSM). Assessora do Tribunal de
Justiça do Estado de Minas Gerais. Professora e Pesquisadora no Centro
Universitário de Formiga (UNIFOR), com fomento da FAPEMIG, e membro do
grupo de pesquisa Direitos Humanos e Vulnerabilidades na Faculdade
Católica de Santos (UNISANTOS).
ESTUDO COMPLETO NO SITE:
http:// www.criticadodireito.com.br/ todas-as-edicoes/ numero-3-volume-54/ adocao-em-terras-quilombolas
Nélida Reis Caseca Machado
RESUMO
Este estudo analisa a adoção de crianças e adolescentes quilombolas, prevista no Estatuto da Criança e do Adolescente, art. 28, §6º, I e II. Verifica que os princípios que regem a proteção dos menores, mormente o princípio da proteção integral, não se coadunam com a proteção prevista para os quilombolas, pois esta prevê uma proteção ao grupo, tendo como objeto a cultura. Considera que as possibilidades hermenêuticas do texto poderiam significar um retrocesso na proteção integral da criança e do adolescente e faz algumas ponderações acerca da interpretação e das implicações decorrentes da previsão normativa. Pretende contribuir para a discussão ante o escasso material que aborda a questão.
INTRODUÇÃO
O nome escolhido para este trabalho, adoção em terras quilombolas, embora sugira, não tem a intenção de detalhar ou retratar como é feito a adoção dentro dos grupos quilombolas conforme os costumes das comunidades. O objeto é avaliar como a sociedade majoritária quer disciplinar a adoção do grupo vulnerável quilombola.
Esta questão revela ser de grande importância em virtude de ser uma forma de política pública e demonstrar a intenção e o agir do Estado. Inclusive porque Marie Pierre Poirier, a representante do Unicef - Fundo das Nações Unidas para a Infância no Brasil – criticou, no 1º Encontro Nacional de Crianças e Adolescentes Quilombolas[1], a exclusão de crianças quilombolas e negras das políticas públicas implementadas no Brasil.
Alegou que não há conhecimento específico acerca do número destas crianças e por isso elas ainda estariam na invisibilidade. Sustenta que, em pleno século 21, a realidade brasileira demonstra que nascer branco, negro ou indígena continua determinando as oportunidades que as pessoas têm de ter acesso ao trabalho, à saúde, à educação, à proteção contra os abusos e violações de direitos[2]. E, ainda que haja projetos criativos na área social, existem enormes desigualdades no Brasil.
Em sua avaliação, é grave que muitas crianças quilombolas com menos de um ano morram antes de obter a certidão de nascimento e não seria coincidência que, das 800 mil crianças brasileiras de 7 a 14 anos que estão fora da escola, 500 mil sejam negras[3]. E mais, a exclusão através da discriminação e do racismo continua ao longo da vida escolar e profissional.
Considerando estes dados, o cenário de inserção dos quilombolas, um grupo vulnerável, não revela ser uma paisagem de orgulho para o Brasil. No entanto, há várias previsões legislativas no intuito de proteger e incluir os quilombolas, mesmo não sendo uma legislação exatamente eficaz.
Em 2009, em mais uma tentativa, desta vez veiculada às crianças e adolescentes quilombolas, através da Lei n. 12.010 tentou-se proteger o grupo vulnerável. Esta Lei incluiu no estatuto da criança e dos adolescentes, nas disposições gerais – Da família substituta – art. 28, o parágrafo 6º, I e II[4],que dispôs que deveriam ser consideradas e respeitadas a identidade social e cultural, os costumes e tradições, bem como instituições como requisito obrigatório para a colocação de criança ou adolescente quilombola em família substituta, seja em virtude da guarda, da tutela ou da adoção.
E mais. Que a colocação familiar ocorra prioritariamente no seio da comunidade ou junto de membros da mesma etnia, com a participação de antropólogos, perante a equipe interprofissional ou multidisciplinar para acompanhar o caso.
Entretanto, esta previsão normativa gera mais dúvidas do que exatamente uma efetiva proteção, tanto que quase nenhum material aborda o tema e os poucos encontrados apenas se referem a ela como um ganho na proteção. A dúvida advém, então, em qual seria exatamente a proteção à criança quilombola.
Isto porque a proteção, nos moldes normativos, não é bem delimitada e há várias situações a serem analisadas para se encontrar um resultado real e não se vislumbra, inicialmente, um bom diálogo entre as fontes, seja analisando a proteção das crianças e dos adolescentes, seja analisando a proteção do quilombola, bem como do quilombola em adoção, como se verá.
Assim, este artigo, como se disse, tem como objetivo lançar luzes ao preceito normativo, para que se possa avançar, realmente, na defesa da criança quilombola e auxiliar na aplicação da norma. Para tanto, o trabalho foi dividido em três itens. O primeiro aborda a adoção com seu evoluir histórico, o segundo trata de identificar o quilombola e o terceiro questiona a adoção do quilombola.
(...)
Nélida Reis Caseca Machado - Mestre em Direito (Constitucionalismo e Democracia) pela Faculdade de Direito do Sul de Minas (FDSM). Assessora do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais. Professora e Pesquisadora no Centro Universitário de Formiga (UNIFOR), com fomento da FAPEMIG, e membro do grupo de pesquisa Direitos Humanos e Vulnerabilidades na Faculdade Católica de Santos (UNISANTOS).
ESTUDO COMPLETO NO SITE:
http://
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