domingo, 3 de novembro de 2013

Casal que mora no Rio vive drama da adoção interrompida

Marido e mulher lutam para reaver guarda de menina que criaram por 2 anos e foi devolvida à mãe biológica

Waleska Borges (Email · Facebook · Twitter)
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Márcio dos Santos e Maria Paula no quarto que era da filha adotiva: o casal ainda luta na Justiça para reaver a guarda da menina
Foto: Leo Martins


Márcio dos Santos e Maria Paula no quarto que era da filha adotiva: o casal ainda luta na Justiça para reaver a guarda da menina Leo Martins
RIO - Morena de olhos esverdeados, a pequena R. tem apenas 2 anos, mas já é protagonista de um drama que envolve duas famílias. No último dia 25, ela foi retirada do casal que a adotara e criara desde o nascimento. Por decisão da juíza Juliana Leal de Melo, da 1ª Vara da Infância, Juventude e Idoso, foi devolvida à mãe biológica. Da casa onde morava, a menina levou apenas uma mochila com duas fraldas, lenços umedecidos, mamadeira com água e um potinho de biscoitos.
— Não fomos avisados de que seria feita a reintegração — lembra, aos prantos, a professora Maria Paula de Almeida, de 48 anos, a mãe adotiva. — Por telefone, uma psicóloga me pediu apenas que fosse à Vara da Infância com a menina. Ela chorava muito e tentava se agarrar ao meu pescoço para não ser levada. Infelizmente, foram considerados apenas os laços sanguíneos e não o que era melhor para ela.
A menina foi devolvida a Aline Freire dos Santos, de 24 anos, sua mãe biológica. Foi através de uma amiga em comum que Maria Paula e seu marido, o radialista Márcio André dos Santos, de 46 anos, a conheceram. O casal, que mora na Tijuca e está junto há 12 anos, conta que R. lhes foi entregue com a permissão da mãe biológica. Ainda durante a gravidez, alegam os dois, foi feito um acordo informal para a adoção.
— Ela não queria a gravidez. Apertava a barriga para esconder e dizia que desconhecia o pai. Tinha um outro filho, de 2 anos. Meu coração ficou sensibilizado com aquela história. Fomos cativados e resolvemos ficar com a criança — lembra Márcio, acrescentando que ele e a mulher já tinham passado por tentativas frustradas de ter um bebê. — Minha esposa engravidou quatro vezes, mas em nenhuma delas a gestação foi adiante.
O casal acompanhou a gravidez de Aline e, em 5 de setembro de 2011, R. nasceu no Hospital Estadual Albert Schweitzer, em Realengo. Da unidade de saúde, a menina seguiu direto para casa dos pais adotivos. Ganhou um quarto branco e rosa, todo decorado de ursinhos. Um mês após o nascimento, segundo Márcio, Aline assinou na Vara da Infância uma declaração de anuência, dizendo que dera, de livre vontade, a filha ao casal.
— Logo ficamos embevecidos e apaixonados pela menina — recorda Márcio. — A Aline sumiu. Mas, cinco meses depois, fomos procurados por ela. Marcamos um encontro na Praça Saens Peña. Aline apareceu com um namorado, dizendo que ele era o pai da menina. Ela disse que queria a criança de volta. Não aceitamos e sugerimos que ela procurasse a Justiça.
Foi o que ela fez. O processo pela guarda da menina tramitou na 1ª Vara da Infância, Juventude e Idoso. Os dois lados foram acompanhados por defensores públicos. Em julho deste ano, depois de uma audiência, o pedido de adoção foi indeferido, e a Justiça determinou a reintegração gradativa da criança. Márcio e Maria Paula recorreram da decisão e ainda aguardam uma resposta.
— Nunca mais vou esquecer aquele julgamento — diz Márcio. — Naquele dia, a nossa defensora foi trocada. E a que nos representou só chorou durante toda a audiência. O julgamento durou horas, e até a juíza estava irritada. Ela chegou a pedir pizza e refrigerante. Foi um dia horrível. Os dias sem ela têm sido péssimos. A nossa casa está toda impregnada dela. Não vamos desistir de lutar por ela.
Já com a guarda da menina, Aline afirma que deu a filha ao casal num momento de “depressão e desespero”, quando estava separada do pai da criança. Ela diz que não vai abrir mão de criar R., que tem dois irmãos, um de 4 anos e outro de 5 meses. De acordo com Aline, a menina passa bem e a está conhecendo aos poucos.
— Não sou viciada e nunca tive problemas com a polícia. Quando quis dar minha filha, estava fora da minha razão. Minha filha é muito amada. Quis pegá-la de volta quando ela estava com 5 meses, mas eles (os pais adotivos) não deixaram. Poderiam ter evitado todo esse sofrimento. Não posso voltar atrás no meu erro e lamento por isso, mas agora não vou mais dar a minha filha a ninguém. Quem quiser adotar que procure um abrigo — diz Aline, informando que concordaria em deixar o casal acompanhar o crescimento da menina.
Modelo de adoção tem riscos
Segundo a diretora jurídica da Associação Nacional dos Grupos de Apoio à Adoção (Angaad), Silvana do Monte Moreira, o caso de R. é diferente do da menina X., de 4 anos, nascida em Contagem, na Região Metropolitana de Belo Horizonte. Lá, após um ano e oito meses vivendo num abrigo, a criança foi adotada provisoriamente. Ela e seus seis irmãos haviam sido retirados pela Justiça do convívio com a família biológica. Quase três anos depois, em meio à espera pelo julgamento da guarda definitiva, os pais adotivos agora correm o risco de perder a menina para a família biológica. Já no Rio, a adoção de R. foi consensual. Nesse caso, a lei dá à mãe biológica a possibilidade de desistir de entregar o filho até a sentença transitar em julgado (ou seja, até não caber mais recursos) — e o processo pode se arrastar por anos.
— Quando a pessoa diz que quer fazer a adoção consentida, orientamos dizendo que é um processo perigoso, porque há a possibilidade de desistência dos genitores. Os processos também são muito morosos e não existe um prazo de manifestação para desistência enquanto eles estiverem tramitando — explica Silvana. — Com o passar do tempo, por causa da separação, o sofrimento da criança será absurdo.
Desembargador alerta para risco de danos emocionais
Para o desembargador Siro Darlan, o rompimento do laço afetivo da criança com seus pais adotivos pode causar a ela grande sofrimento. Segundo ele, a Justiça já tem condenado por danos morais pais que não demonstram afeto por seus filhos.
— Depois que a família abre mão da criança, não tem como reaver essa decisão. Uma criança não é um objeto para ser rejeitado e depois apanhado de volta. O afeto é considerado uma entidade jurídica protegida por lei — disse o desembargador, que já foi juiz da Vara da Infância e Juventude.
Procurador de Justiça do Estado do Rio, Sávio Bittencourt lembra que a adoção é um ato jurídico que se dá por sentença judicial. Para ele, a criança não pode ser tratada “como uma coisa” ou uma “propriedade dos seus pais biológicos”.
O procurador ressalta, porém, que o melhor caminho para a adoção é a pessoa se habilitar na Vara da Infância e Juventude da sua comarca. A partir daí, ela será inserida no Cadastro Nacional de Adoção.Recurso ainda é analisado
Por meio da sua assessoria de imprensa, a 1ª Vara da Infância, Juventude e Idoso informou, ao ser perguntada sobre o processo referente à menina R., que as ações de adoção tramitam em segredo de Justiça. “Com relação à fase processual, a demanda está em sede recursal, não havendo, ainda, decisão definitiva”, acrescentou a assessoria de imprensa.

Leia mais sobre esse assunto em http://oglobo.globo.com/rio/casal-que-mora-no-rio-vive-drama-da-adocao-interrompida-10671040#ixzz2jcYEgHZj
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2 comentários:

Unknown disse...

Compreendo as questões legais e mesmo que não me agrade eu respeito, mas o que não consigo aceitar é a falta de padrão e incoerência do judiciário em casos semelhantes a criança X. e semelhante ao meu. Nó tbm somos fruto de uma adoção consentida de um casal separado que já havia feito o mesmo com as outras 3 filhas mais novas(nem sei se "consentida" seria o termo correto, pois os biológicos queriam com palavras próprias:"se livrar da filha de 12 anos", que segundo relato dela e de conhecidos era largada no morro, só teve certidão de nascimento aos 9 anos por denúncia ao conselho tutelar e só então foi posta mega atrasada na escola, desnutrida, sofrendo maus tratos físicos e emocionais e sem referência ou direção de vida e família, cheia de medos e angustias e ainda carregando nos ombros a saudade dos irmãos que ela mesma criou desde que começou a fazer as coisas com as próprias mãos aos 5 anos de idade. E o biológico ainda disse que só não "se livrou" dela antes porque "ela é quem tinha que tomar conta dos irmãos". As irmãs dela foram dadas em adoção uns 2 ou 3 anos antes de nós a conhecermos e todo processo foi feito pela Praça xI/RJ e as famílias já tem a guarda definitiva (a adoção, com nova a nova certidão) tudo direitinho... e nós que ficamos com a mais velha, que ninguém queria por causa da idade, que reaproximamos as irmãs que já tinham sido adotadas, que amamos, cuidamos e temos por filha legítima e nos empenhamos pela sua saúde, educação e reconstrução emocional, completamos 4 anos de tormentas na Vara de Santa Cruz. Nossa filha já fará 17 anos no início de 2014 e acredite se quiser... nossa G.P. vence em janeiro e chegamos até a presente data sem nenhuma posição. A advogada já pediu audiência, julgamento antecipado, até nossa filha quer ir lá falar, mas permanece o silêncio e a estática, já até fiz reclamação a ouvidoria do TJ por descumprimento de prazo e praticamente me responderam que era assim mesmo. Minha filha sonha com seu batismo na fé que assumiu e vem caminhando conosco a 4 anos e ficou protelando a recepção do sacramento pois seu desejo é ser batizada com o novo sobrenome, o nosso e ter em seus documentos o nosso nome, mas o batismo será no próximo dia 10 e o sonho dela de ver concluído esse processo que mais parece tortura, não foi realizado, ela será batizada com o nome dos biológicos mesmo sem eles e nem nenhum possível familiar ter procurado por ela ao longo desses 4 anos e alguns meses. Isso é justiça??? Isso é o melhor interesse da criança??? Nem querem nos ouvir, é justo??? Nossa filha daqui a pouco tempo fará 18 anos, é isso que a justiça quer??? Esperar que ela tenha 18 e eles não precisem se manifestar. Mas e os estragos que isso vem causando a minha filha emocionalmente ao longo desse período querem prolongar pra que ela fique dependente dos tratamentos psicológicos??? Peço desculpas pelo desabafo mas ela já tem discernimento e não aceita que as irmãs já estejam inseridas definitivamente em outras famílias amigas e eram menores de 4 anos o que sabemos que é sempre muito questionado pela justiça até mesmo por conta do CNA, uma faixa etária muito desejada... mas e o nosso caso??? Qual o entrave??? Alegam que não localizam a biológica. No processo da irmãs ela foi localizada mas não compareceu, a biológica vive mudando de endereço por razões diversas, mas até eu sei onde ela está e a justiça não a encontra??? Problemas no sistema ou falta de interesse??? Peço desculpas pelo desabafo e agradeço e fico muito feliz de ter pessoas como vc, a Rosimar e tantas outras pessoas lutando pra que a verdadeira justiça seja feita. Que vc continue com essa garra, muita saúde e sabedoria pra lutar por nós, pelas "Dudas" e tantos indefesos e aqui incluo as famílias que se formam, que sofrem injustiças da justiça. Um forte abraço.

Silvana do Monte Moreira disse...

São tempos de lamento, são tempos de luta pela adoção legal, segura e para sempre. A adoção não é filiação de segunda categoria, não é a última opção, na maioria das vezes é a única opção. Abraços, Silvana do Monte Moreira