CASO DE IRMÃOS ABANDONADOS EM GARUVA, NORTE DO ESTADO, MOBILIZA A JUSTIÇA
14/09/2013
LEANDRO S. JUNGES
leandro.junges@an.com.br
Mais velho fugiu diversas vezes do abrigo e não aceita a separação dos mais novos para adoção
Crianças foram abandonadas pela mãe há quatro anos Foto: Leo Munhoz / Agencia RBS
O drama vivido por um menino de 15 anos tem mobilizado a Justiça, a
polícia e pelo menos quatro famílias do Norte do Estado. Ele e três
irmãos mais novos – de 13, oito e quatro anos – foram abandonados pela
mãe e a avó materna há cerca de quatro anos. O pai morreu e os tios
também não querem cuidar deles. Desde o fim de semana passado, ele fugiu
três vezes do abrigo provisório de Garuva, onde os quatro estavam
acolhidos por decisão da Justiça.
Em uma das fugas, no domingo
passado, ele convenceu a irmã de 13 anos a ir com ele. Para o casal que
abrigou os quatro durante os últimos três anos, os dois adolescentes
estavam em uma desesperada operação de resgate dos dois irmãos mais
novos, que estão com padrinhos provisórios, uma relação transitória que
pode resultar na adoção.
Para a Justiça, trata-se do auge de um
drama que envolve múltiplos abandonos, sentimento de rejeição e a
dificuldade de chegar a uma solução para o complexo processo de adoção
de quatro crianças com tanta diferença de idade.
Antes de ser
entregue ao abrigo provisório na manhã da última quarta-feira, por uma
advogada da família que o acolheu nos últimos tempos, o adolescente
chorava muito e dizia que não aguentava mais viver assim. Ao fugir no
domingo com a irmã de 13 anos deixou um bilhete em que pedia para ficar
com os outros irmãos.
A história do garoto começou a perder o rumo
há quatro anos. Viúva, envolvida com drogas e prostituição, a mãe deles
decidiu que não queria mais os filhos. A avó materna, coletora de
materiais recicláveis em Garuva, também não teria condições de cuidar
deles. O menino mais velho tinha então de 11 para 12 anos. A mais nova,
pouco mais de um ano.
FAMÍLIA TEMPORÁRIA
Durante os últimos
três anos, os quatro ficaram na casa de um casal de amigos da mãe.
Mesmo já tendo cinco filhos, o casal conseguiu levar a situação por
algum tempo. Enquanto a gurizada estudava, a "nova mãe" se desdobrava
para cuidar da casa e dos bebês. O "pai", que é do Exército, conseguiu
arrecadar colchões com os colegas de quartel e até incluir todos no
plano de saúde da corporação.
Um problema de saúde que o afastou do
trabalho coincidiu com o começo de uma fase difícil. Precisaram de ajuda
da assistência social do município, de vizinhos e de amigos. Acabaram
denunciados à Justiça e foram forçados a decidir: ou entravam com um
processo de adoção oficial dos quatro ou os meninos teriam de ser
levados para o abrigo municipal e oferecidos para a adoção.
Há
alguns meses, alegando que não haveria como ficar com as crianças sem
ajuda financeira, alimentos e roupas, acabaram abrindo mão da adoção. A
chance de as quatro crianças ficarem juntas começava a ruir. A rotina do
abrigo, para o mais velho, foi sempre de fugas. Um vai e volta que
mobilizou a Polícia Militar, os funcionários do abrigo, a ex-família
provisória, advogados, promotora e juíza.
SITUAÇÃO DIFÍCIL DE RESOLVER
Nenhuma autoridade sabe exatamente como tratar a situação. O abrigo não
é uma prisão onde alguém fica 24 horas por dia na porta, controlando
entradas e saídas. O menino não cometeu nenhuma infração, não pode ser
caçado como um criminoso ou detido como um procurado pela Justiça.
A
cada novo passo no processo ou episódio mais grave, como as fugas do
abrigo, o menino é ouvido por uma psicóloga que trabalha em parceria
direta com o Ministério Público e a Vara da Infância e Juventude (em
Garuva, há uma única juíza para atender a todos os tipos de processo).
Para os profissionais, o adolescente manifestou concordar com os
processos de adoção dos irmãos mais novos. Disse entender que seria a
chance de eles terem uma família, um lar, mesmo que distantes. Em outros
momentos, inconformado, diz que lhe garantiram que os irmãos não seriam
separados.
Entre uma fuga e outra, solta pipa, faz as tarefas do
abrigo e brinca como um menino de 15 anos que já tem muita história de
vida para contar.
Mesmo tendo oficialmente aberto mão da
possibilidade de adotar os quatro irmãos, o casal que os acolheu por
três anos se diz inconformado com o drama que está tomando conta da
situação. A mulher, que é chamada de mãe pelos quatro, guarda todos os
cadernos, trabalhos de aula, cartinhas e até as receitas médicas e
prontuários de vacinação.
Em uma mesa, ela reúne os cartões feitos pelas crianças e teme pelo futuro delas.
— A gente não sabe mais o que fazer, o que vai dar isso. Se pudéssemos,
ficaríamos com eles. Mas se não dá, a Justiça precisa entender que eles
têm de ficar juntos — diz a mulher.
A cada fuga, um novo drama recomeça: se ele aparecer na casa, eles não podem abrigá-lo.
— Ele vem aqui em casa, chora e diz que vai se esconder para não voltar
para o abrigo. Não sei o que fazer. Não podemos deixá-lo na rua. Mas
corremos o risco de ser presos — diz a mulher.
http://anoticia.clicrbs.com.br/sc/geral/noticia/2013/09/caso-de-irmaos-abandonados-em-garuva-norte-do-estado-mobiliza-a-justica-4268478.html
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