Sexta-feira, 18 de dezembro 2015
Gylmar Chaves
Especial para O Estado
Sobre o universo observável existem afirmações que ele tem vida própria, e os planetas podem ser assumidos por galáxias as quais não são originários, inclusive pela Via Láctea, a qual faz parte o nosso Sistema Solar. Nada vive só no universo. Tudo se entrelaça. Faz conexão. Algumas estrelas também escapolem do seu local de nascimento e são adotadas por outras galáxias. No universo, tudo vive em equilíbrio. Ele é livre e se depende para se expandir. Podemos então perceber que a adoção é também uma prática sideral, é uma dádiva absorvida pelo ser humano, é um caminho sensível e luminoso, é uma construção de novos mundos, como nos revela Dora Andrade, idealizadora da Edisca – Escola de Desenvolvimento Humano para Criança e Adolescente, reconhecida internacionalmente pela proposta de transformar vidas por meio da dança.
A Adoção é surpreendente! Em cada fase do desenvolvimento da criança percebo o quanto o ser humano é admirável. Quando aparece o primeiro dentinho, quando uma criança engatinha, fica em pé, dar os primeiros passos, fala as primeiras palavras, expressa o primeiro pensamento inteligente e com conteúdo… Não existiu um dia na vida de minhas filhas que elas não soubessem que eram adotivas. Eu escrevi um livro bordado para as minhas duas filhas adotivas contando a história delas. Eu criava músicas e cantava a história delas. Então elas sempre souberam de forma muito natural que eram adotadas. Não teve um marco assim: hoje eu vou contar para as meninas. Isso nunca aconteceu.
Quando Dora Andrade adotou suas duas filhas, Ana Isabel Holanda de Andrade e Dora Alice Holanda de Andrade, hoje com 17 e 9 anos, respectivamente, ela se encontrava solteira. Com a chegada de Gilberto de Holanda Vasconcelos Filho em sua vida, elas também passaram a fazer parte da história de vida dele:
O Professor Antônio Carlos Gomes da Costa, que é um conceituado educador, foi conselheiro da Edisca durante muitos anos. Ele é padrinho da minha filha Isabel. Em nossas conversas ele falava que toda criança precisa ser adotada, até as biológicas. A adoção é ato de amor, e de responsabilidade para com uma pessoa.
Então Adoção é o primeiro SIM, o sim fundamental que você dá a uma pequena vida. Eu tive uma imensa emoção ao ver cada uma das minhas filhas pela primeira vez. Para mim, foi uma felicidade única, uma sensação de felicidade inconcebível, uma alegria misturada com senso de responsabilidade muito grande para com o destino de cada uma delas, e também um sentimento profundo de gratidão, uma gratidão a Deus, aos Anjos, aos Deuses, a vida e a tudo, porque essas meninas foram um divisor de águas em minha vida. Posso afirmar que elas me salvaram porque preencheram de sentido a minha vida. Não só a mim, como também ao pai delas.
Desde criança, Isabel, sua primeira filha adotiva, aprendeu a conviver com assuntos referentes a dança, com plantas e árvores regadas no jardim de sua casa, a desenvolver vínculos afetivos pelos animais, desde formigas a coelhos, galinhas, gatos e cachorros. Menina cheia de vida acompanhava sua mãe nas frequentes viagens, mesmo antes de completar um ano de idade, e provavelmente foi assim que absorveu o sentido dos limites e responsabilidades pelo fazer e o realizar. Não optou pela arte de ser bailarina, no entanto tem na alma o sentimento aguçado da solidariedade.
Os constantes compromissos profissionais de Dora Andrade pelo Brasil e exterior jamais dificultaram sua relação com as filhas. Sempre há uma boa conversa com as duas sobre as definições de seu dia a dia à frente dos projetos da Edisca, o que a retém dentro de um grande desafio:
Eu sempre trabalhei muito. As minhas duas filhas, ambas chegaram com dois dias de vida. Eu nunca tirei um dia de licença maternidade, mesmo tendo igual direito de uma mulher que tenha parido, nunca tirei um único dia de licença maternidade. Eu não tinha condições de me afastar nesses momentos da Edisca. Eu trabalhava direto. Então foi um período de extremo cansaço. Isabel, a minha primeira filha teve a sua primeira noite inteira de sono somente após dois anos. Ela tinha muita dificuldade para dormir. Mesmo que se tenha uma babá para ajudar é impossível você dormir ouvindo o choro de uma criança. Nesse período, eu vivia com muito sono, muito cansada, mesmo que elas ficassem durante o dia na creche.
A casa de Dora Andrade é um lugar mais para descanso, espaço de meditação, reintegração com a natureza, embora por lá passem alguns amigos para falar sobre arte, filosofia, declamar poesia, ouvir boa música, saborear de sua gastronomia. Sim, Dora Andrade também tem mãos e gosto apurado para essa bendita arte de se alimentar, tanto para nutrir o corpo quanto o espírito.
Somente quinze anos depois chegou Dora Alice, da cor do chocolate, silenciosa, os olhinhos miúdos e sossegados. Até hoje Dora Alice fala com o silêncio. Ela tem paixão pelo desenho, brinca sozinha horas a fio, é aplicada nos estudos, cumprimenta as visitas e escuta algumas conversas tão naturalmente. Às vezes imita os grunhidos das aves, dos cachorros e gatos que se espalham pelo imenso jardim da casa. Ela sobe e desce a escada que dá para o primeiro andar com desenvoltura e elegância. Tem olhos repletos de inteligência e sagacidade. Dora Alice tem o mundo dela, que se mistura com muitos outros, que interage com os pais, com os amigos da escola, com os amigos da família, com a irmã Isabel.
A família de Dora Andrade interage com facilidade com a arte e com os formatos do pensar. Estão sempre juntos, mãe, irmãos e suas filhas, somando-se, trocando reflexões. A solidariedade está na energia emanada entre eles. Não gostam de proibir, preferem orientar, questionar, trazer novidades para a relação cotidiana. Nada sempre tão perfeito assim, pois também se ocuparam em aprender a lidar com pontos de vistas diferentes dentro de casa, com o frio que dá pela possibilidade de não cumprir as metas sociais da Edisca, com as preocupações ofertadas cotidianamente pelo viver.
A vida será para Dora Andrade sempre uma realidade, consciência solidariedade, imensurável gratidão:
Todos estamos aprendendo sobre os limites do mundo e suas responsabilidades. Jamais encontrei empecilhos para legalizar a Adoção. Eu tenho guardado o parecer do Juiz quando ele finaliza o processo de adoção. Muito lindo o que escreveu. Chorei muito quando li o parecer. Não gastei um único centavo. Fui pelos trâmites normais.
Na minha experiência de adoção fui muito bem sucedida. Encheu a minha vida de sentido. Para mim existem ligações muito mais importantes que a genética. É muito legítima adoção de um ser humano. Também não vejo o ato de adoção como uma generosidade. De forma particular, a maior beneficiada na adoção fui eu. Não foram as minhas filhas, certamente. Todos temos ligações. Todos somos filhos.
A minha filha Isabel pensa muito em não ter filhos biológicos. Talvez os tenha, mas, tendo ou não, ela pretende adotar.
Isabel é moça bonita e repleta de sensibilidade, tem a cor da pele branca-perolada, os cabelos compridos que lembram o talhe da palmeira, como assim o escritor José de Alencar descreveu a índia Tabajara Iracema. Seus olhos brilhosos refletem perspicácia e alegria, e bem abertos, acentuam com desmesura o modo de pensar:
Ser adotada representou tudo para mim porque basicamente não saberia como seria minha vida se eu não estivesse adotada, e com a oportunidade que eu tenho de conhecer pessoas tão significativas. Para mim, foi muito importante ser adotada. Eu não tenho vontade de conhecer a minha mãe biológica, o meu pai biológico. Mãe e pai vão ser sempre quem me criou, quem cuidou e continua cuidando de mim. Eu amo a minha família do jeito que ela é!
Original disponível em: http://www.oestadoce.com.br/especiais/adocao/adocao-e-o-primeiro-sim-fundamental-a-uma-vida
Reproduzido por: Lucas H.
Gylmar Chaves
Especial para O Estado
Sobre o universo observável existem afirmações que ele tem vida própria, e os planetas podem ser assumidos por galáxias as quais não são originários, inclusive pela Via Láctea, a qual faz parte o nosso Sistema Solar. Nada vive só no universo. Tudo se entrelaça. Faz conexão. Algumas estrelas também escapolem do seu local de nascimento e são adotadas por outras galáxias. No universo, tudo vive em equilíbrio. Ele é livre e se depende para se expandir. Podemos então perceber que a adoção é também uma prática sideral, é uma dádiva absorvida pelo ser humano, é um caminho sensível e luminoso, é uma construção de novos mundos, como nos revela Dora Andrade, idealizadora da Edisca – Escola de Desenvolvimento Humano para Criança e Adolescente, reconhecida internacionalmente pela proposta de transformar vidas por meio da dança.
A Adoção é surpreendente! Em cada fase do desenvolvimento da criança percebo o quanto o ser humano é admirável. Quando aparece o primeiro dentinho, quando uma criança engatinha, fica em pé, dar os primeiros passos, fala as primeiras palavras, expressa o primeiro pensamento inteligente e com conteúdo… Não existiu um dia na vida de minhas filhas que elas não soubessem que eram adotivas. Eu escrevi um livro bordado para as minhas duas filhas adotivas contando a história delas. Eu criava músicas e cantava a história delas. Então elas sempre souberam de forma muito natural que eram adotadas. Não teve um marco assim: hoje eu vou contar para as meninas. Isso nunca aconteceu.
Quando Dora Andrade adotou suas duas filhas, Ana Isabel Holanda de Andrade e Dora Alice Holanda de Andrade, hoje com 17 e 9 anos, respectivamente, ela se encontrava solteira. Com a chegada de Gilberto de Holanda Vasconcelos Filho em sua vida, elas também passaram a fazer parte da história de vida dele:
O Professor Antônio Carlos Gomes da Costa, que é um conceituado educador, foi conselheiro da Edisca durante muitos anos. Ele é padrinho da minha filha Isabel. Em nossas conversas ele falava que toda criança precisa ser adotada, até as biológicas. A adoção é ato de amor, e de responsabilidade para com uma pessoa.
Então Adoção é o primeiro SIM, o sim fundamental que você dá a uma pequena vida. Eu tive uma imensa emoção ao ver cada uma das minhas filhas pela primeira vez. Para mim, foi uma felicidade única, uma sensação de felicidade inconcebível, uma alegria misturada com senso de responsabilidade muito grande para com o destino de cada uma delas, e também um sentimento profundo de gratidão, uma gratidão a Deus, aos Anjos, aos Deuses, a vida e a tudo, porque essas meninas foram um divisor de águas em minha vida. Posso afirmar que elas me salvaram porque preencheram de sentido a minha vida. Não só a mim, como também ao pai delas.
Desde criança, Isabel, sua primeira filha adotiva, aprendeu a conviver com assuntos referentes a dança, com plantas e árvores regadas no jardim de sua casa, a desenvolver vínculos afetivos pelos animais, desde formigas a coelhos, galinhas, gatos e cachorros. Menina cheia de vida acompanhava sua mãe nas frequentes viagens, mesmo antes de completar um ano de idade, e provavelmente foi assim que absorveu o sentido dos limites e responsabilidades pelo fazer e o realizar. Não optou pela arte de ser bailarina, no entanto tem na alma o sentimento aguçado da solidariedade.
Os constantes compromissos profissionais de Dora Andrade pelo Brasil e exterior jamais dificultaram sua relação com as filhas. Sempre há uma boa conversa com as duas sobre as definições de seu dia a dia à frente dos projetos da Edisca, o que a retém dentro de um grande desafio:
Eu sempre trabalhei muito. As minhas duas filhas, ambas chegaram com dois dias de vida. Eu nunca tirei um dia de licença maternidade, mesmo tendo igual direito de uma mulher que tenha parido, nunca tirei um único dia de licença maternidade. Eu não tinha condições de me afastar nesses momentos da Edisca. Eu trabalhava direto. Então foi um período de extremo cansaço. Isabel, a minha primeira filha teve a sua primeira noite inteira de sono somente após dois anos. Ela tinha muita dificuldade para dormir. Mesmo que se tenha uma babá para ajudar é impossível você dormir ouvindo o choro de uma criança. Nesse período, eu vivia com muito sono, muito cansada, mesmo que elas ficassem durante o dia na creche.
A casa de Dora Andrade é um lugar mais para descanso, espaço de meditação, reintegração com a natureza, embora por lá passem alguns amigos para falar sobre arte, filosofia, declamar poesia, ouvir boa música, saborear de sua gastronomia. Sim, Dora Andrade também tem mãos e gosto apurado para essa bendita arte de se alimentar, tanto para nutrir o corpo quanto o espírito.
Somente quinze anos depois chegou Dora Alice, da cor do chocolate, silenciosa, os olhinhos miúdos e sossegados. Até hoje Dora Alice fala com o silêncio. Ela tem paixão pelo desenho, brinca sozinha horas a fio, é aplicada nos estudos, cumprimenta as visitas e escuta algumas conversas tão naturalmente. Às vezes imita os grunhidos das aves, dos cachorros e gatos que se espalham pelo imenso jardim da casa. Ela sobe e desce a escada que dá para o primeiro andar com desenvoltura e elegância. Tem olhos repletos de inteligência e sagacidade. Dora Alice tem o mundo dela, que se mistura com muitos outros, que interage com os pais, com os amigos da escola, com os amigos da família, com a irmã Isabel.
A família de Dora Andrade interage com facilidade com a arte e com os formatos do pensar. Estão sempre juntos, mãe, irmãos e suas filhas, somando-se, trocando reflexões. A solidariedade está na energia emanada entre eles. Não gostam de proibir, preferem orientar, questionar, trazer novidades para a relação cotidiana. Nada sempre tão perfeito assim, pois também se ocuparam em aprender a lidar com pontos de vistas diferentes dentro de casa, com o frio que dá pela possibilidade de não cumprir as metas sociais da Edisca, com as preocupações ofertadas cotidianamente pelo viver.
A vida será para Dora Andrade sempre uma realidade, consciência solidariedade, imensurável gratidão:
Todos estamos aprendendo sobre os limites do mundo e suas responsabilidades. Jamais encontrei empecilhos para legalizar a Adoção. Eu tenho guardado o parecer do Juiz quando ele finaliza o processo de adoção. Muito lindo o que escreveu. Chorei muito quando li o parecer. Não gastei um único centavo. Fui pelos trâmites normais.
Na minha experiência de adoção fui muito bem sucedida. Encheu a minha vida de sentido. Para mim existem ligações muito mais importantes que a genética. É muito legítima adoção de um ser humano. Também não vejo o ato de adoção como uma generosidade. De forma particular, a maior beneficiada na adoção fui eu. Não foram as minhas filhas, certamente. Todos temos ligações. Todos somos filhos.
A minha filha Isabel pensa muito em não ter filhos biológicos. Talvez os tenha, mas, tendo ou não, ela pretende adotar.
Isabel é moça bonita e repleta de sensibilidade, tem a cor da pele branca-perolada, os cabelos compridos que lembram o talhe da palmeira, como assim o escritor José de Alencar descreveu a índia Tabajara Iracema. Seus olhos brilhosos refletem perspicácia e alegria, e bem abertos, acentuam com desmesura o modo de pensar:
Ser adotada representou tudo para mim porque basicamente não saberia como seria minha vida se eu não estivesse adotada, e com a oportunidade que eu tenho de conhecer pessoas tão significativas. Para mim, foi muito importante ser adotada. Eu não tenho vontade de conhecer a minha mãe biológica, o meu pai biológico. Mãe e pai vão ser sempre quem me criou, quem cuidou e continua cuidando de mim. Eu amo a minha família do jeito que ela é!
Original disponível em: http://www.oestadoce.com.br/especiais/adocao/adocao-e-o-primeiro-sim-fundamental-a-uma-vida
Reproduzido por: Lucas H.
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