Enviado por Mauro Ventura -
18.03.2015
09h00m
Silvana Do Monte Moreira era especializada em advocacia empresarial. Até que resolveu ajudar uma amiga que queria adotar filhos. Em seguida, ela mesma quis adotar. Havia tido uma filha biológica, queria mais, só que não conseguiu.
- Fizemos inseminação artificial, mas não deu certo. Tentamos uma vez só, foi uma frustração terrível. Além do investimento financeiro, abala o casamento - diz Silvana, entrevistada da coluna Dois Cafés e a Conta.
Ela e o marido acabaram adotando uma menina, em apenas nove meses.
- Na época, em 1999, não havia tanta procura. A adoção saiu do armário.
Após a experiência, ela trocou de área – hoje é uma das maiores especialistas no país em adoção.
- Não conseguia mais pensar em junta comercial, ações, alteração contratual, debêntures.
Ela está na vanguarda da luta contra o Estatuto da Família, recém-desarquivado por Eduardo Cunha, que restringe família ao núcleo formado por um homem, uma mulher e seus descendentes. E que também proíbe a adoção de crianças por casais homoafetivos. Nessa batalha, ela tira dinheiro do próprio bolso na viagens pelo país.
- Semana retrasada, por exemplo, fomos a Brasília para uma reunião. As viagens são pagas por nós, e ficamos na casa de parentes e amigos. Não temos patrocínio.
O que salva são os grupos de apoio à adoção espalhados pelo Brasil, que ajudam na logística. Silvana está por três do movimento #emdefesadetodasasfamílias, no Twitter e no Facebook, que está dando o que falar. E sabe ser insistente.
- Minha mãe era considerada a maluca do telefone lá em Alagoas, onde eu nasci. Tudo que ela queria ela ligava para alguém, até para o governador. E conseguia. Eu posso ser a maluca da internet.
Ela fez a adoção do filho de Maria Padilha, Manoel, e pediu que a atriz batesse uma foto com ele e postasse nas redes sociais, para o movimento #emdefesadetodasasfamílias.
- E você não tem ideia do que mandei de tweet para o Aguinaldo Silva, por causa da família poliafetiva de “Império”. Queria que postasse uma foto da novela no Twitter. Também passei mais de 300 tweets para o Ricardo Linhares, um dos autores de “Babilônia”, para botarem uma foto do casal que será formado por Fernanda Montenegro e Natalia Thimberg na campanha. Ele ainda não respondeu, mas estou insistindo muito.
Silvana vê com preocupação os ataques homofóbicos que se multiplicam pelo país, como o que vitimou um adolescente de 14 anos, filho adotivo de um casal gay.
- Fiz a adoção dos três filhos de Toni Reis, presidente da ALGBTI (Lésbicas, Gays, Bissexuais, Trans e Intersexuais). Ele está apavorado. Disse: “Imagina o que pode acontecer com meus filhos, eu, que seguro essa bandeira?”
Uma das coisas que mais angustiam Silvana é a demora nos processos de adoção, fruto da inoperância do Estado. Não só pela falta de concursos para psicólogos e assistentes sociais como pela insistência a todo custo em se buscar a família biológica da criança – mesmo que não haja laço de afetividade ou afinidade dela com o parente de origem. Ou mesmo que essa família já tenha demonstrado não querer acolher aquela criança.
- No Rio vão atrás até de parente desaparecido. Enquanto isso a criança envelhece. Encontram um pai alcoólatra, ele diz que vai se tratar, a criança espera seis meses, ele não se trata, aí tem que proporcionar mais uma chance porque o Estado não deu condições a ele de parar de beber, e o processo vai se arrastando. Temos que parar de dar prioridade ao adulto e seus erros. Conseguimos que dois irmãos fossem adotados por um casal. Estavam em guarda provisória quando acharam uma tia biológica dos meninos. Foram morar com ela, mas a tia não teve condições de ficar com eles e tiveram que voltar para o abrigo, onde estão até hoje.
Essa demora na destituição do poder familiar ou na reintegração faz com que muitos casais recorram ao exterior.
- Na Índia e na Indonésia se alugam barrigas por 15 mil dólares. Aqui, só pode barriga solidária. Temos tanta criança para ser adotada no Brasil e as pessoas têm ido buscar lá fora por causa da morosidade da máquina estatal.
Silvana faz muitas adoções de filhos por parte de casais homoafetivos. Ela refuta o preconceito de que a criança precisa ter pai e mãe.
- Estudos internacionais comprovam que as funções parentais são igualmente exercidas por pais e mães. Não são papéis estanques. Não têm a ver com gênero. Eu posso ser mulher e ter uma pegada mais de pai, ou posso ser homem e ser mais acolhedor. E todo homem tem sempre avó, mãe, tia, irmã, prima, alguma figura feminina que vai ajudar a desempenhar esse papel. E se todos os filhos de gays fossem gays significaria que todos os filhos de heterossexuais seriam heterossexuais.
Silvana consegue muitas adoções foram do usual.
- Fiz a adoção de dois meninos pré-adolescentes por um casal de pastores gays, e os dois estão muito bem. Conseguimos com que um grupo de cinco irmãos, negros, fossem adotados. Duas meninas para um casal de homens, um menino e uma menina para um casal hetero, e um menino para outro casal hetero. Os irmãos mantém um relacionamento mesmo depois de adotados.
http://oglobo.globo.com/rio/ancelmo/dizventura/posts/2015/03/18/contra-estatuto-da-familia-563067.asp
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