domingo, 13 de agosto de 2017

Apadrinhamento permite que crianças acolhidas voltem a conviver em família (Reprodução)

12/08/2017

Ana Elísia, de 36 anos, encontrou no programa de apadrinhamento a oportunidade de trazer algum impacto positivo na vida de crianças em situação de vulnerabilidade social. O sonho de montar uma creche, que não deu certo, abriu portas para que o amor que ela possui por crianças fosse depositado nos irmãos Pedro* e Lucas*, de 8 e 9 anos.

Pedro e Lucas moram em uma casa de acolhimento em Maceió, mas foram apadrinhados por Elísia e seu esposo, Rodrigo Salcedo, de 42 anos. Nos fins de semana, os meninos podem vivenciar todos os momentos que existem em uma família comum: brincadeiras, almoços, viagens, banhos de piscina e festinhas de aniversário.

Momentos assim parecem passar despercebidos para aqueles que já os vivenciam cotidianamente. No entanto, para 77 crianças de Alagoas, que estão no Cadastro Nacional de Adoção, essas ocasiões quase não existem. E, para crianças como Pedro e Lucas, a situação se complica, já que eles se enquadram no perfil de órfãos mais difíceis de serem adotados porque são considerados velhos demais.

É quando entra o programa de Apadrinhamento Afetivo, trazido para Alagoas em junho de 2016, pelo Juiz Ygor Vieira de Figueirêdo, da 28ª Vara Cível de Maceió - Infância e da Juventude, que coordena o projeto no estado. O objetivo é levar para crianças e adolescentes abandonadas, e geralmente vítimas de algum tipo de violência, valores fundamentais para o seu desenvolvimento. O programa é direcionado para crianças a partir de 7 anos, quando as chances de serem adotadas começam a diminuir.

Para a criação do projeto, Ygor Figueirêdo levou em consideração o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), em que sustenta o direito dos acolhidos de viverem em um ambiente semelhante aquele encontrado no ambiente familiar. O juiz considera, que, mesmo com todos os esforços das casas de acolhimentos, as instituições "não favorecem o desenvolvimento pleno de seus acolhidos, nem evitam sua estigmatização e as dificuldades em sua inserção social", acrescenta  no Diário da Justiça Eletrônico, em 20 de junho de 2016.

O programa de apadrinhamento já existia em outros estados antes da chegada dele em Alagoas. Um dos estados é o Rio de Janeiro, onde o projeto foi criado pelo juiz Sérgio Luiz Ribeiro de Souza, da 4ª Vara da Infância, da Juventude e do Idoso. O programa deu tão certo que foi o vencedor do XII Prêmio Innovare, de 2015.  

Neste programa, há três opções: o apadrinhamento afetivo - quando o acolhido passa a conviver com um familiar nos fins de semana, feriados ou férias escolares -, o apadrinhamento provedor - quando o suporte é financeiro e material, em que muitas vezes o padrinho não tem vínculo afetivo com a criança -, e o apadrinhamento prestador de serviços - quando o padrinho presta um serviço de acordo com a sua área profissional.

Atualmente, em Alagoas, o apadrinhamento atende 15 crianças em seis abrigos do estado. O número é considerado baixo, segundo a psicóloga Fátima Malta, da 28ª Vara Cível de Maceió - Infância e da Juventude. "Aos poucos o projeto está sendo conhecido e divulgado. Até o ano passado era totalmente desconhecido", afirma a psicóloga. 

Ainda há tempo para o amor 

Ana Elísia está grávida de 39 semanas do primeiro bebê. Mas, antes de saber que um novo membro da família estava por vir, ela e o marido, Rodrigo Salcedo, de 42 anos, entregaram-se às graças de Lucas e Pedro, há 10 meses. Quando surgiu a ideia do apadrinhamento, a enfermeira conta que houve uma resistência de Rodrigo, porque não se sentia preparado para cuidar de uma criança. Hoje, ela conta que vê no marido a figura de um pai, principalmente quando ele brinca com as crianças.

"No momento em que aceitamos foi com o propósito de ajudar. Na primeira vez, quando tentamos com outra criança, foi muito difícil, porque não soubemos lidar, meu marido ficou nervoso e preocupado. Mas já com os dois meninos, meu marido tem muita disposição e uma relação muito saudável", explica a enfermeira.

No início também foi difícil para Lucas e Pedro. Como foram acostumados a presenciar situações de violência do pai contra a mãe e os irmãos mais velhos, Elísia e Rodrigo trabalham aos poucos para desconstruir a imagem negativa que as crianças têm de família.

"Desde o início deixamos claro que o queríamos era mostrar para eles o que é uma família. Acho que isso está mais claro para eles. Eles relatavam casos de violência com muita frequência. Conversamos sobre respeito, carinho,  princípios e valores, que aos poucos eles estão conseguindo absorver", relata Elísia. Ela ressalta, que apesar de os irmãos falarem com frequência sobre a violência do pai, eles também demonstravam carinho especial pela mãe, já falecida.

Dentre as atividades que o casal faz com as crianças estão as de ensiná-las a ler e escrever, jogar baralhos, dominó, tomar banho de piscina, assistir filmes, ir ao shopping, viajar para o interior para visitar os parentes. "Para onde vamos, levamos os meninos conosco", acrescenta.

O casal agora espera um bebê. E Elísia garante: Lucas e Pedro participarão deste momento. "Eles sempre  perguntam o que o bebê vai ser deles. Perguntam o que meus sobrinhos são deles. Sempre digo que são primos, e que as mães deles são tias.

Por que o programa é importante?  

Segundo a psicóloga da 28ª Vara Cível de Maceió - Infância e da Juventude, Fátima Malta, independente de o apadrinhamento não resultar em adoção, ele é eficaz, porque dá a oportunidade de convívio social e afetivo, que sem ele, poderia não existir.

"O apadrinhamento dá a criança a opção de um convívio social e afetivo com pessoas que poderão de uma forma dedicar tempo para transmitir conhecimentos, ensinar bons costumes, propiciar momentos de lazer. É tão importante quanto uma adoção, mesmo que esse apadrinhamento não seja definitivo. Além do mais eleva bastante a autoestima e oferece a oportunidade de desfrutar o mundo além dos muros da instituição", defende a psicóloga.

Sem o convívio familiar, explica a psicóloga, a criança perde etapas da vida que são essenciais para a formação da sua identidade e personalidade. Além disso, a perda de confiança nos pais, por exemplo, acarreta em consequências para o convívio social.

"A família deveria ser o ninho acolhedor. A perda da confiança e admiração pelos heróis primários, que são os pais, provoca uma distorção nos valores primordiais de significação afetiva. Não viver num ambiente familiar, faz a criança perder etapas da vida, sua própria identidade afetiva e relacional. É ser mais uma num meio de tantos outros", explica Fátima Malta.

Saiba como apadrinhar  

O trabalho acontece de forma conjunta entre a 28ª Vara da Infância, as instituições de acolhimentos, os padrinhos e os afilhados. Após o interesse de uma família em apadrinhar, o processo começa quando a instituição de acolhimento faz a indicação de quais crianças estão aptas a serem apadrinhadas. Após os primeiros contatos com a criança beneficiada, os interessados passam por um breve estágio de convivência nas instituições, assinando, logo após, um termo de compromisso de responsabilidade.

Podem ser padrinhos indivíduos maiores de 18 anos, que sejam 16 anos mais velhos do que os apadrinhados. Não precisa ser casado, a exigência é que tenha um ambiente saudável.

Documentação 

Para a inscrição como padrinho afetivo: 

- Ficha de cadastro devidamente preenchida, também disponível na Vara da Infância e da Juventude;

- Cópias da identidade, CPF e comprovante de residência;

- Atestado médico de sanidade física e mental, assinado por clínico geral ou psiquiatra e atestado de idoneidade moral, assinado por duas pessoas.

Acesse a ficha de inscrição para padrinho afetivo clicando aqui.

Para a inscrição como padrinho financeiro ou profissional: 

- Pessoas jurídicas:

a) Preenchimento de Ficha de Inscrição pelas citadas instituições e empresas que será disponibilizada na Vara da Infância e da Juventude;

b) CNPJ atualizado;

c) Ata da última assembleia onde conste nomes e números dos documentos pessoais da atual diretoria.

- Pessoas físicas:

a) Ficha de cadastro devidamente preenchida que será disponibilizada na Vara da Infância e da Juventude;

b) Cópias da identidade, CPF e comprovante de residência;

c) Exclusivamente para a prestação de serviço, é necessário ainda: apresentar comprovação de habilitação legal para o exercício da profissão, quando for o caso; atestado médico de sanidade física e mental, assinado por clínico geral ou psiquiatra; e atestado de idoneidade moral, assinado por duas pessoas.

Original disponível em: https://www.blogger.com/blogger.g?blogID=1101128651123092416#editor/target=post;postID=4361372693539372569

Reproduzido por: Lucas H.

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