Com a trama de “O filho de todos”, que acaba de ser traduzido no Brasil, a escritora americana de origem indiana Thrity Umrigar toca num tema pouco falado nos Estados Unidos, a adoção e suas consequências. Mais do que mostrar como uma adoção pode ser instrumentalizada por famílias privilegiadas, ela a usa como um símbolo dos conflitos de identidade e tensões raciais no país.
— Não foi uma decisão consciente, já que a trama inteira se apresentou a mim como um flash de inspiração — diz a autora, que se mudou de Bombaim para os Estados Unidos com 21 anos, em entrevista por e-mail. — Mas entendo agora como pude contar uma história mais ampla sobre os Estados Unidos e as tensões raciais nesse país, através da história íntima de um garoto adotado por uma poderosa família branca.
Dependente de drogas, a mãe de Anton, Juanita, havia sido encontrada desacordada enquanto o filho, trancado sozinho em casa, tentava fugir pela janela. Foi o suficiente para que a guarda lhe fosse tirada. Mas, por trás da versão oficial, há um segredo envolvendo o importante pai adotivo de Anton, que usou sua influência e manipulou Juanita para colocar o filho em sua família.
— Discordo dessa caracterização — diz a autora. — Anton é um filho muito amado por seus pais. Acredito que o seu corpo é um campo de batalha no qual os adultos estão tentando trabalhar suas diferentes disfunções e seus problemas. Mas nunca duvidei que todos eles o amam o máximo que lhes é possível, levando em consideração as limitações e os pontos fracos de cada um.
“O filho de todos” é o primeiro livro de Thrity com um protagonista negro — e nenhum indiano. Autora de livros de sucesso como “A distância entre nós” (sobre duas mulheres de classes sociais opostas na Bombaim contemporânea), ela usou suas próprias experiências de vida num país estrangeiro para entrar melhor na cabeça de Anton, que precisa viver como um negro numa família branca que não é sua. “Eu ainda não sei se você é o homem branco mais negro que já encontrei ou se é o negro mais branco”, diz a namorada do personagem, ao terminar o relacionamento com ele.
— Essa frase é baseada em algo que um jovem garoto me disse quando eu estava viajando com amigos para a América do Sul — lembra a escritora. — Foi décadas atrás. Eu estava em uma pequena cidade onde não havia asiáticos, e esse garoto negro ficou me encarando, voltou-se para a mãe e disse: “Mãe, não sei se essa garota é negra ou branca”. Nunca esqueci disso.
Thrity acredita que, para o bem ou para o mal, os Estados Unidos estão fortemente interessados em questões de identidade neste momento. A autora, que também é jornalista e colaboradora de veículos como o “The Washington Post”, não escapou de críticas sobre “lugar de fala” por abordar não apenas um personagem negro, como adotado.
“O FILHO DE TODOS”
AUTORA: Thrity Umrigar. TRADUÇÃO: Claudio Carina. EDITORA: Globo Livros. PÁGINAS: 344. Quanto: R$ 39,90.
Original disponível em: https://oglobo.globo.com/cultura/livros/thrity-umrigar-aborda-questoes-morais-em-livro-sobre-menino-negro-educado-por-familia-branca-22164755
Reproduzido por: Lucas H.
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