segunda-feira, 1 de agosto de 2016

Menino 23: infâncias perdidas no Brasil (Reprodução)

29 de julho de 2016

O documentário “Menino 23: infâncias perdidas no Brasil” nasce da pesquisa de doutorado do historiador Sidney Aguilar e ocupa as telas sob a direção de Belisario Franca. Ganhou recentemente o prêmio de melhor documentário no Festival Cine Ceará de 2016. Para o crítico Felippo Pitanga, o diretor “consegue não apenas confirmar a excelência dos documentários brasileiros contemporâneos, como exceder as expectativas narrativas com este mote ousado e urgente para os dias atuais”.
O questionamento, que dará início as pesquisas, surge numa aula de ensino médio sobre o Nazismo/Segunda Guerra Mundial. Aguilar relata que, durante essa aula, uma aluna disse que a fazenda da família estava toda marcada com a inscrição nazista: os tijolos, documentos da fazenda, fotos do gado. Trabalho engenhoso que investiga como e por que a suástica nazista estaria presente dessa maneira em uma fazenda do interior de São Paulo. A partir daí se descobre que 50 meninos negros foram levados de um orfanato do Rio de Janeiro (Romão de Matos Duarte), em 1933, para trabalhar como escravos nessa mesma fazenda, onde permaneceram até 1942, quando foram “liberados”.

O que mais surpreende é que esse grupo de garotos foram “adotados” por um fazendeiro branco para que pudessem estudar e se desenvolver. Teoricamente, esse senhor, da tradicional família brasileira, estava fazendo um grande bem a humanidade. No entanto, a partir dos relatos, principalmente de Aloísio Nunes (o menino 23), percebemos que a aparente legalidade se transfigurava em trabalho forçado. Ou seja, a escravidão era uma realidade, mesmo em plena República, que deveria garantir a liberdade e a igualdade entre todos os brasileiros.

A atribuição de números aos meninos era uma clara alusão ao que acontecia nos campos de concentração. É pela fala que transparece o sofrimento dos sobreviventes desse período: o sr. Aloísio explica que os garotos eram submetidos a uma rotina diária que incluía o trabalho com os animais e na roça, sem intervalos e sem recebimento de salário, castigos físicos e banhos frios. Só conseguiam pensar em fugir daquela prisão, enfatiza.

A partir do documentário e da memória dos agentes, podemos perceber que a realidade desses meninos dizia que o Brasil era um país preconceituoso, permeado pela teoria eugenista, que pregava a supremacia branca e uma suposta limpeza étnico-social.

Teorias e ideias que estão presentes, ainda hoje, na sociedade brasileira de forma silenciosa e dissimulada, desnudadas pelo documentário e pela perspicácia estética, cuidadosa nas transições dos depoimentos para as imagens do período. Evidenciamos, assim, o quanto o racismo está entranhado em nossa sociedade e o quanto sair do silêncio se faz necessário e urgente.

Nádia Cristina Ribeiro

*Doutora em História Social pela Universidade Federal de Uberlândia, Prof. da Rede Estadual de Ensino em Uberlândia, da Faculdade Santa Rita de Cassia (IFASC) – campus Itumbiara e integrante do Núcleo de Estudos em História Social da Arte e da Cultura – NEHAC.

Original disponível em: http://www.correiodeuberlandia.com.br/colunas/nehac-2/menino-23-infancias-perdidas-no-brasil/

Reproduzido por: Lucas H.

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