quarta-feira, 31 de agosto de 2016

PERFIL PADRONIZADO DE CRIANÇAS GERA BARREIRA PARA NOVAS ADOÇÕES EM BLUMENAU (Reprodução)

30/08/2016

Por Aline Camargo

Cada dia de vida é uma pedrinha guardada numa mala. Algumas são pequenas e levinhas, outras são grandes e pesadas, difíceis de carregar, mas sempre estarão lá, dentro da mala. Uma criança com oito ou dez anos de idade, que espera por uma família que a aceite como ela é, muitas vezes tem pedras grandes demais para levar sozinha, e mesmo assim ela segue crescendo e esperando que alguém a ajude a carregar o peso de sua própria história.

É assim que o vice-presidente do Grupo de Estudos e Apoio à Adoção de Blumenau (Geaab), Gilberto Alba Parisotto, 48 anos, explica por que crianças e adolescentes acabam demorando mais para serem adotados:

— A mala invisível da história de vida do recém-nascido, do bebê até dois, três anos de idade, é muito menor e essa nova família vai construir junta essa história. A verdade é que muitos candidatos a adotar têm medo do que pode vir com as crianças.

Parisotto se tornou pai em uma das categorias da chamada "adoção necessária", que no caso dele foi a tardia. Quando descobriu que não podia ter filhos ele e a esposa optaram pela adoção. Como a maior parte dos casais almejavam um bebê.

Algum tempo depois e com a participação no Geaab foram mudando o pensamento e abrindo o coração para crianças mais velhas e cheias de amor e esperança. Encontraram a felicidade em um casal de irmãos de sete e oito anos de idade, dos quais são pais há seis anos.

A história de Parisotto e dos filhos pode não ser uma exceção, mas está longe de ser a regra. Em Santa Catarina há mais pais dispostos a adotar — 2,5 mil candidatos estão aptas para a adoção em todo o Estado — do que crianças e adolescentes para serem adotados — que somam 1,4 mil menores que aguardam uma nova família.

Na comarca de Blumenau a diferença é ainda mais gritante: há apenas uma criança e um adolescente para serem adotados, ambos com problemas de saúde, enquanto há 241 processos de pessoas habilitadas a adotar. Então, por que, a conta não fecha e estas crianças continuam sem um lar?
Para a juíza da Vara da Infância e da Juventude de Blumenau, Simone Faria Locks, o perfil de criança que a maioria das famílias quer para adotar está longe da realidade dos que esperam para ser adotados. Muitos candidatos a pais, quando questionados, almejam uma criança entre zero e dois anos, menina, branca e sem doenças.

Locks, no entanto, afirma que só a mudança de mentalidade de quem quer adotar vai fazer com que essas crianças encontrem esses tantos pais dispostos a dar amor a um filho do coração:

— Precisamos que mais pessoas estejam dispostas a fazer a adoção necessária: de crianças mais velhas, adolescentes, grupos de irmãos e com doenças tratáveis. É preciso ampliar o horizonte para diminuir o tempo de espera pela adoção e, acima de tudo, ter em mente que nós estamos aqui para encontrar uma família para a criança, e não uma criança para a família, porque são coisas totalmente diferentes.

LAÇOS DE AMOR

Para promover as adoções "fora do padrão" a Assembleia Legislativa (Alesc), o Tribunal de Justiça (TJ-SC), o Ministério Público de Santa Catarina (MP-SC), a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), as Secretarias de Estado da Assistência Social e de Saúde, a Defensoria Pública, a Federação das Indústrias (Fiesc) e a Federação Catarinense dos Municípios (Fecam) relançaram a campanha Laços de Amor.

Encabeçada por vídeos que contam a história de famílias que adotaram crianças, jovens e grupos de irmãos, também tem uma série de ações previstas para difundir entre os candidatos a pais a importância de olhar para todas as crianças sem fazer distinção.

Para a coordenadora da Comissão da Criança e do Adolescente da OAB Blumenau, Denise Alessandra Krug Demmer, que também é mãe adotiva, a população do Vale do Itajaí já mudou a opinião em relação à uma série de questões sobre a adoção, com a inter-racialidade, mas ainda há o que evoluir, principalmente, no que ela chama de "cultura do bebê".

Além disso, ela também acredita que uma mudança na legislação pode agilizar o andamento dos processos e facilitar a redução da diferença entre a quantidade de candidatos à adoção e crianças aptas a serem adotadas:

— A destituição do poder familiar ainda é um processo demorado, até porque é preciso ter cuidado para evitar que um processo de adoção seja revertido depois que a guarda dessa criança já está com a família. Mas eu acredito que ainda há uma pequena gordura que pode ser eliminada nos trâmites burocráticos, apesar de estarmos falando de uma legislação nacional.

JORNAL DE SANTA CATARINA - JORNAL DE SANTA CATARINA

Disponível em: http://dc.clicrbs.com.br/sc/estilo-de-vida/noticia/2016/08/perfil-padronizado-de-criancas-gera-barreira-para-novas-adocoes-em-blumenau-7351896.html

Reproduzido por: Lucas H.

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