segunda-feira, 20 de fevereiro de 2017

“A Juliana só nos trouxe alegria” (Reprodução)

A afirmação é da dona de casa Voniceia Goulart Moraes, que adotou pela primeira vez uma criança há 18 anos.

Jailson Vieira
Tubarão
A mulher que nasceu para ser mãe sabe que a maternidade não depende de gestar e parir. É preciso muito mais, acima de tudo, abrir o coração. Quando mais jovem e ainda noiva, a tubaronense Voniceia Goulart Moraes, a Teka, 44 anos, descobriu que não poderia ter filhos biológicos. Ela foi diagnosticada com ovário policístico (um distúrbio que interfere no processo normal de ovulação em virtude de desequilíbrio hormonal que leva à formação de cistos).

Um turbilhão de coisas passou pela sua cabeça. Ela chegou a cogitar ao noivo, na época, o término do compromisso, mas João Cirineu Moraes foi firme em sua decisão, manteve o noivado e pouco tempo depois casaram. “Ele falou que se não pudéssemos engravidar teríamos filhos do coração”, conta Teka.

Após três anos casados, já na fila de adoção, o presente mais aguardado chegou por meio de um sonho. João comentou com a esposa que em breve eles teriam o tão amado e esperado bebê em seus braços. “Estava certo. Ele sonhou com uma menininha linda e que há quase 19 anos alegra os nossos dias, a nossa Juliana”, emociona-se a mãe.

Atualmente, Juliana está na 5ª fase de engenharia civil na Unisul. Entre os 8 e 15 anos, a jovem praticou balé em uma companhia de dança em Criciúma. Na Cidade Carbonífera, o casal e a menina residiram por alguns anos. “Meus pais me apoiaram em tudo. Por dois anos, já morando em Tubarão, no final das tardes de segundas e sextas-feiras me levavam para Criciúma para os ensaios. Sempre estiveram ao meu lado, não tenho outros pais a não ser eles”, afirma a garota.

Juliana soube que era filha do coração quando tinha somente 2 anos. “Fui informada por uma mulher que ainda hoje mora perto da minha casa. Lembro muito bem da situação e do semblante da senhora me contando. Foi uma situação chata, mas que meus pais souberam trabalhar muito bem. O amor imperou e continua imperando em nosso lar. Foi um episódio triste para a pessoa que não pensou na família quando revelou, mas para mim e meus pais foi um dos capítulos mais fortes que já vivemos”, assegura.

Adoção tardia: decisão foi construída no amor
Um outro caso de adoção também teve um final feliz. A adoção da jovem Adriana Machado, 17 anos, foi um pouco atípica, mas não menos importante ou comovente. Afinal, ela sabe que só o fato de seus pais do coração a terem adotado revela a certeza de que a decisão de ambos foi construída apenas e totalmente no amor. “Não nasci do fruto do amor deles, mas a minha vinda para este lar foi para consolidar e firmar que este laço durará para sempre. Não tenho dúvidas disso”, enfatiza.

A garota conta que sempre morou com os pais biológicos em Tubarão, porém, alguns problemas na família tornaram insustentável a convivência entre o casal e a filha, que na época ainda não tinha 10 anos. “Minha mãe começou a utilizar produtos ilícitos, geralmente quando chegava em casa quebrava tudo, o meu pai como já tinha uma idade avançada, não desejava isso para ele e nem para mim. Ele pediu a separação e passamos a morar só nos dois. Como já era idoso e se preocupava muito comigo, pediu para os seus filhos do primeiro casamento ficarem com a minha guarda caso ocorresse alguma coisa, mas nenhum deles aceitou”, relata.

Um dia antes de falecer, em setembro de 2009, o pai biológico de Adriana passou a guarda provisória da pequena de 10 anos para uma sobrinha que aceitou cuidar da menina. “Foi muito difícil se adaptar, pois saí de um local conhecido para um estranho, a casa de uma família nova. Havia mais pessoas, um casal já com netos e três filhos, dois homens e uma mulher. Mas o amor dispensado a mim foi tão grande e tão milagroso que não há dúvidas que também sou filha deles”.

A jovem afirma que ser adotiva não tem nada de diferente. “No meu caso, o que difere daqueles que são acolhidos quando menor foi o tempo para a adaptação. Temos os mesmos direitos e deveres, nem tudo ocorre maravilhosamente, a exemplo de muitas famílias, mas temos que seguir as regras para ter uma boa convivência. O que Adriana teve de diferente? Os estudos, a educação e o melhor relacionamento com as pessoas”, finaliza.

Experiência deu certo e mais um bebê foi acolhido
Tudo transcorria bem com a criação de Juliana, mas o casal João Cirineu e Voniceia, a Teka, sentia que ainda podia mais. Quando a garota estava com 8 anos, eles resolveram dar um irmãozinho para a menina e, mais uma vez, o processo de adoção legal foi o procurado. Ambos fizeram o cadastro e a espera foi longa, oito anos.

“Queríamos muito mais um filho. Nunca nos importamos se fosse menino ou menina, o que interessava era podermos amar mais um ser que pudéssemos chamar de nosso. Há dois anos, quando meu marido e eu estávamos quase desistindo, porque a espera foi longa, ligaram para a minha mãe avisando que uma criança estava pronta para ser adotada. Ela anotou o número do telefone, mas ficou faltando algum dígito. Por três dias tentamos contato e não conseguíamos resposta, porém, no quarto dia a boa notícia, o nosso pequeno nos aguardava”, lembra a mãe.

Em seguida, o casal e a irmã de Teka viajaram para a instituição onde o bebê de 11 meses estava abrigado. “Fomos conhecer a criança e quando chegamos ao local tive a certeza que ele seria o meu filho. Com a Ju, o João falou: ‘é ela, é ela é ela’, e com o Max Gregori só confirmei: ‘é ele, é ele, é ele’. Não podia traze-lô no mesmo dia, conversamos com os representantes da casa e voltamos para Tubarão. Foi uma viagem longa e a espera pela decisão da juíza se deferia ou não o pedido também”, recorda.

A visita à criança ocorreu em uma sexta-feira, o casal relata que o fim de semana foi o mais demorado durante todo esse tempo de união, 22 anos. “A decisão deveria sair na quinta-feira, mas neste caso a juíza deferiu o pedido na segunda. Na terça pela manhã já estávamos no abrigo para trazer o nosso bebê. Os cuidadores do nosso pequeno estavam muito emocionados. Ainda não contamos que é o nosso filho do coração, mas assim como a Ju, ele saberá de tudo e tenho certeza que nada mudará”, salienta a mãe.

“Nenhum detalhe ficou escondido”
Adjetivos é o que não faltam para qualificar o administrador Felipe Domingos Vieira, 26 anos, de Capivari de Baixo. Popular, prestativo e amado pelos familiares, amigos e colegas, é difícil não vê-lo sempre rodeado por pessoas que desejam o seu bem. O que o difere de seus irmãos Rodnei, Rosane, Roberto, Rosimere, Raul e Ronaldo? Nada, apenas que ele não foi gerado por seus pais Manoel Vieira (morreu em 1992) e Dirce Domingos Vieira, mas foi amado da mesma forma que os demais.

Ele destaca que desde os primeiros anos já sabia de todos os detalhes de como chegou à casa de seus padrinhos de batismo. “Nunca deixaram de contar um só detalhe. Minha mãe procurou ser mais transparente possível, pois acreditava que eu merecia saber a verdadeira história de minha vida. Sei que minha genitora teve problemas com alcoolismo e não tinha condições psicológicas de cuidar de mim. Dava mamadeira do dia anterior, saía e me deixava sozinho”, revela.

O administrador esclarece que a sua mãe biológica, na insistência e na procura por dinheiro para consumir álcool, ofereceu o garoto por 50 cruzeiros (na época) à sua madrinha. “Com essa proposta, a minha mãe adotiva foi até a delegacia para que pudesse ficar comigo. Naquela época tudo era mais fácil no processo de adoção, tudo foi resolvido rapidamente, meus pais que já tinham seis filhos abraçaram a causa e me adotaram com muito amor”, enfatiza.

Ele afirma que sempre procurou compreender que a sua adoção foi algo melhor para a sua vida, porque carinho e amor não faltaram na família que o acolheu.

Dessa forma, não foi difícil aceitar. “Não há diferença em ser um filho do coração, tenho o amor, os irmãos, tive uma infância muito feliz, com muitos primos da mesma idade, mais velhos e também mais novos, e a aceitação de toda família foi extremamente maravilhosa, todos demonstram carinho igual aos filhos, sobrinhos e primos biológicos”, assegura.

Acolher uma criança no futuro é cogitado
Felipe Domingos Vieira afirma que como cresceu sabendo de sua história, via que era nítido o amor de seus parentes e familiares. “Meu pai adotivo veio a falecer meses depois que me acolheu. Essa é uma das partes em que mais me apoio, pois quando adolescente, com 12 anos, fiz uma reflexão de tudo que passou em minha vida, percebi que por mais que tivéssemos sofrido com a morte dele, por mais que minha mãe teve dificuldade de criar sete filhos sozinha, nunca me faltou amor e carinho e nos demais irmãos”, observa.

De acordo com o jovem, ele sempre procurou ser um filho que trouxesse orgulho para a sua mãe. “Eles me deram a chance de viver, procurava evitar o máximo de decepções e alimentava o coração dela com muitas realizações e conquistas, me esforcei para ser um ótimo aluno no ensino fundamental e médio, no curso técnico e na faculdade, no trabalho um bom profissional e ainda, em realizar os afazeres de casa”, relata.

Felipe destaca que não pensaria duas vezes em adotar no futuro. “Adotar é doar o seu coração a um ser que necessita de amor paterno e materno. Assim como tive a chance que deu sentido a minha vida, muitas outras crianças em situações financeiras piores necessitam também dessa compreensão. Se um dia tiver a oportunidade, farei esse papel e amarei da forma que fui amado, e serei muito grato a Deus”, reconhece.

Além dos seis irmãos, ele tem dois biológicos, ambos também foram adotados por outras famílias. “Conversamos e nos encontramos pouco, o carinho é igual. Sinto que precisamos nos unir mais, conversar, rir, contar as diferenças, ninguém teve culpa do afastamento que tivemos. Por isso acredito que há um amor, um sentimento de irmão, sinto isso em meu coração e consigo sentir o mesmo também quando estou perto deles”, finaliza.

O que é necessário para entrar na fila da adoção?
O primeiro passo a ser dado é procurar o Fórum de residência dos pretendentes à adoção. Em Tubarão, deve-se procurar o Serviço Social Forense, local onde repassa todas as informações iniciais e tira as dúvidas. Em termos burocráticos, um processo de habilitação para adoção inicia com a entrega de documentos dos pretendentes (sejam casados, conviventes ou solteiros): RG, CPF, comprovante de residência, comprovante de renda, certidão de casamento ou união estável (se for o caso), atestado médico, certidões de antecedentes criminais e cíveis, além de foto 3×4. Após a entrega dos documentos, os pretendentes à adoção passam por três etapas de avaliação. São elas: 1) Participação obrigatória em curso de preparação para adoção, com carga horária de 16 horas aulas que ocorrem no próprio Fórum; 2) Estudo Social e 3) Avaliação psicológica (estas duas etapas são realizadas pela equipe interprofissional forense).

Qual a abrangência territorial do cadastro de adoção? 
Uma vez habilitados em sua cidade/comarca de residência, automaticamente os pretendentes ficam habilitados no Estado que residem e no país.

Há ainda muitas gestantes que vendem os seus filhos?
Infelizmente não é incomum receber notícias de negociações como estas. É sabido que comumente nos casos de adoção à brasileira existe por trás a oferta de algum valor monetário por aquele bebê.

Irmãos podem ser separados no processo de adoção? 
A Lei 12.010 de 2009, chamada “Nova Lei de Adoção”, preconiza que os grupos de irmãos deverão ser colocados sob adoção de uma mesma família, como forma de evitar o rompimento definitivo dos vínculos fraternais. Como forma de mantê-los juntos, as famílias consultadas para adotá-los serão aquelas que mencionarem no procedimento de habilitação se estão dispostas a receber um grupo de irmãos. Os esforços iniciais serão sempre pela manutenção da convivência fraternal. No caso de não serem encontradas famílias dispostas a receberem todas as crianças juntas, através de uma avaliação individual e pormenorizada realizada pelas equipes técnicas, será trabalhada a possibilidade de separação dos irmãos. Ainda que excepcionalmente sejam encaminhadas para famílias distintas, estas deverão assumir o compromisso de manutenção dos vínculos entre as crianças e adolescentes.
O que é a adoção à brasileira?

É o ato de registrar como seu filho de outrem, acontece quando as famílias recebem crianças de forma direta, sem a intervenção do judiciário. Trata-se de prática criminosa, passível de punição (previsão inclusive de pena de reclusão) conforme o Código Penal.

Posso adotar um bebê que deixaram na minha porta?
A adoção legal, conforme preconizada pelo Estatuto da Criança e do Adolescente, acontece quando todos os procedimentos de habilitação são realizados, conforme já explicitados. No caso de um bebê ser deixado na porta de alguém, a atitude adequada a ser tomada seria a imediata informação ao Conselho Tutelar para que os procedimentos legais sejam encaminhados. Caso de fato essa criança fique apta para adoção, terá preferência sobre ela o pretendente mais antigo no Cadastro de Adoção da Comarca cujo perfil informado seja compatível com o daquele bebê.


Reproduzido por: Lucas H.


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