quarta-feira, 15 de fevereiro de 2017

Drama inspirado em história real e indicado a seis Oscars, 'Lion' estreia nesta quinta no Brasil (Reprodução)

15/02/2017

TORONTO - ‘Lion — Uma jornada para casa”, a partir de quinta nos cinemas, são dois filmes em um. Na primeira e melhor parte da história de Saroo Brierley, a câmera do australiano Garth Davis, em sua estreia em longas-metragens, registra a improvável e trágica aventura de um menino de cinco anos das favelas indianas tal qual um conto de fadas contemporâneo. Após adormecer em um vagão de trem aparentemente fora de uso perto de sua cidade, ele acorda, em um dia ensolarado de 1986, do outro lado da Índia, na caótica Calcutá. Sem comunicação com a família, é levado a um orfanato, e mais tarde adotado por um casal de australianos, vividos por Nicole Kidman e David Wenham.
Duas décadas depois, com a ajuda da revolução digital, o espectador acompanha a busca de Saroo por sua família biológica, que, ele aposta, ainda aguarda uma resposta para o seu desaparecimento. Com a passagem de bastão do menino Sunny Pawar, 8 anos, para Dev Patel, 26, a segunda metade da narrativa é mais sentimentalista, com o uso de muita música incidental e acenos a “Quem quer ser um milionário?”, de Danny Boyle, vencedor do Oscar de 2009, também passado na Índia, com o mesmo Patel. “Lion” disputa seis estatuetas na festa da Academia de Artes de Hollywood, incluindo melhor filme, ator coadjuvante (Patel), atriz coadjuvante (Kidman), roteiro, cinematografia e trilha sonora original.
— Decidimos dividir a história em duas partes e não usar flashbacks, pois queríamos que o público tivesse a sensação de que estava crescendo com o Sunny. É como se, quando encontrássemos o Dev, ainda tentando se lembrar com exatidão de seu passado, nós, de nossas cadeiras no cinema, tivéssemos tido uma experiência mais intensa do que a do próprio personagem — diz o roteirista Luke Davies, que usou como material de pesquisa a autobiografia de Saroo e entrevistas com os personagens de carne e osso, na Índia e na Austrália.
Um dos pontos altos de “Lion”, que contou com a participação entusiasmada das duas famílias durante a produção do filme, é o tratamento realista dado ao processo de adoção internacional. Mais conhecido por sua atuação nas áreas de publicidade e design, Garth Davis — indicado ao Emmy de melhor diretor de minissérie em 2013, com Jane Campion, por “Top of the lake” — trata tanto das alegrias quanto das dificuldades da chegada de uma criança com vivência familiar completamente díspare a um novo cenário. Para o papel da mãe adotiva, Sue, ele escalou Nicole Kidman, cujos dois filhos mais velhos, Bella, 23, e Connor, 21, adotados durante o casamento com Tom Cruise, foram morar com o pai após a separação do casal, em 2001. Kidman teve outros dois filhos com o segundo marido, o cantor Keith Urban. Trailer 'Lion'

— A Sue me contou que teve uma visão em que claramente sentia que um menino de pele morena chegaria na vida dela e do marido, o que me tocou profundamente. Mas posso garantir que não houve fantasia ao se mostrar a realidade de um casal decidido a ter filhos adotando uma criança — diz Kidman. — Garth mostrou o choque cultural dos dois lados, e pelos olhos de uma criança, o que não é nada fácil.

Patel, em sua primeira experiência como galã em Hollywood, encarna o Saroo reinventado nas praias do estado australiano da Tasmânia, corpo sarado de surfista, às voltas com o fim da faculdade, a entrada no mercado de trabalho e uma enorme sensação de culpa:

— É como se tivesse um buraco que vai crescendo dentro dele. Ele precisa saber o que aconteceu com sua família biológica. Nunca vivi um papel tão difícil. O dilema de viver ao lado de quem o ama sem restrições, mas ser assombrado pela ideia da mãe e dos irmãos ainda estarem procurando por ele, isso me consumiu de uma forma inesperada.

Com a ajuda da namorada (vivida por Rooney Mara), do Google Earth e de vestígios de lembranças de um passado humilde, Saroo retorna à Índia natal. O reencontro com a mãe, Kamla, vivida por Priyanka Bose, é o ápice de uma saga que, diz Patel, mudou sua maneira de pensar sobre temas universais como família, amor e compaixão:

— Quando encontrei Saroo, perguntei quanto tempo levou sua busca pela família biológica, o que, obviamente, não poderíamos reproduzir com precisão cirúrgica no filme. Foram três anos de trabalho árduo, diário, sem cessar! — conta o ator. — Ele é um sobrevivente. Lembro-me de ter me perdido de minha mãe em um supermercado, em Londres, quando menino, por cinco minutos, e de meu desespero até escutar aquela voz no alto-falante, “Dev Patel, sua mãe o espera no caixa cinco”.
Imagina o que ele viveu! O humanismo do filme é sua maior preciosidade.

Vencedora do Oscar de melhor atriz em 2003 por “As horas”, Kidman diz esperar que a divulgação da história de Saroo vá além dos lenços repletos de lágrimas (“Minha irmã, que tem seis filhos, viu comigo e começou a choradeira aos 16 minutos de projeção, e só parou no fim!”) e jogue luz sobre o árduo processo de adoção internacional:

— A adoção precisa ser cada vez mais acessível em nossa realidade globalizada. Sue passou seis anos estudando as leis na Índia e na Austrália para viver sua maternidade, um aspecto talvez menos cinematográfico, mas igualmente emocionante em uma história de amor incondicional que ultrapassou todas as barreiras. Inclusive quando Saroo decidiu reencontrar sua mãe biológica: Sue estava lá, a postos, para apoiar, uma vez mais, o seu leãozinho. O que você precisa saber sobre o Oscar 2017

AOS 8 ANOS DE IDADE, UM ÍMÃ PARA A CÂMERA

As armadilhas estavam claras para Garth Davis. Seria fácil contar a história de Saroo no cinema tendo como cenário uma Índia colorida e exótica. Ou, pior, render-se à estética preguiçosa de um turismo audiovisual da miséria voltado para as plateias ocidentais. O maior antídoto para os possíveis passos em falso acabou tendo nome e sobrenome: Sunny Pawar. Escolhido depois de uma seleção que envolveu duas mil crianças matriculadas em escolas indianas, o menino de oito anos, em sua estreia no cinema, se tornou um ímã para a câmera do diretor na metade inicial do filme.

Sunny não fala inglês. Para se comunicar com Davis no set, contou com a ajuda de um intérprete. O ator-mirim decorou suas falas foneticamente. Na festa do Globo de Ouro, ele foi aplaudido de pé ao apresentar, sorriso no rosto e de carona no colo de Dev Patel para alcançar o microfone, “Lion” como um dos concorrentes a melhor filme. Patel diz que, depois de duas semanas com preparadores de elenco locais, “Sunny se transformou em um profissional completo”.

— Estávamos aterrorizados com a decisão de ter uma criança comandando a cena por tanto tempo. Queríamos um diretor que não tivesse medo de expor emoções na tela, mas aquilo nos parecia arriscado demais. Até que a câmera descobriu o Sunny e respiramos aliviados — afirma o produtor David C. Glasser.

* Eduardo Graça se hospedou a convite do Festival de Cinema de Toronto

Original disponível em: http://www.oparana.com.br/noticia/drama-inspirado-em-historia-real-e-indicado-a-seis-oscars-lion-estreia-nesta-quinta-no-brasil/46795/#.WKRTv-dmxTs.facebook

Reproduzido por: Lucas H.

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