terça-feira, 2 de janeiro de 2018

Histórias de mulheres que adiaram o sonho de ser mãe (Reprodução)

31 dez 2017

O assunto ter filhos já deve ter chegado à roda de conversa das suas amigas. Você pode estar começando a pensar no assunto, tem aquela sua amiga que casou há um tempo e não consegue engravidar e uma outra que não quer nem saber. De repente, virou tema recorrente. É que vocês fazem parte de um número crescente no Brasil, o das mulheres que querem engravidar depois dos 30. Segundo a última pesquisa Estatísticas do Registro Civil, do IBGE, de 2015, houve um aumento de mães engravidando entre 30 e 39 anos, de 22,5% em 2005 para 30,8% em 2015. Claro, a gente não quer ter filhos com 20, 25 anos, quando as chances biológicas de isso acontecer naturalmente são mais altas. Tem tanta coisa para fazer antes! Curtir a vida, viajar para onde quiser e na hora em que bem entender, estudar fora, se encontrar na profissão, crescer na carreira… Tudo isso é prioridade na vida antes dos 30 de mulheres como nós. Acontece que nosso organismo não acompanhou nossa evolução e independência. “Na década de 60, quando a pílula anticoncepcional surgiu, pudemos postergar a gravidez e cuidar de outros aspectos da vida. Hoje, adiamos mais e passamos por problemas de infertilidade que crescem, não tem um processo para barrar isso. Estudos com rejuvenescimento dos óvulos ainda são muito experimentais”, diz a médica especializada em reprodução Melissa Cavagnoli, da Clínica Huntington, em São Paulo. Dentro dessa realidade, existem chances de que você seja uma das que vão encontrar dificuldade para ser mãe de maneira natural. E aí a medicina entra com alguns recursos possíveis com tratamentos invasivos, mas que podem realizar seu sonho. “Quem decide por esse caminho terá de lidar com questões profundas e reconstruir suas expectativas, dar um novo significado a elas”, explica a psicóloga Ellen Cortez, da Clínica Fertilis, em Sorocaba (SP). Talvez seja um baque saber que você terá de tentar muitas vezes, que precisará da doação de óvulo ou espermatozoide, que a adoção é a melhor opção ou que ser mãe não será sua realidade. Nessa jornada, precisará ter paciência — e, sim, vai ser difícil. Para que você compreenda a questão, conversamos com quatro mulheres, que dividem suas experiências diante do tempo em que escolheram para a gravidez. Inspire-se na garra que elas tiveram e lembre-se: estamos juntas nessa.

Fiz vários tratamentos e engravidei

“Tinha acabado de me formar em direito quando casei, aos 27 anos. Trabalhava, e meu marido também. Ele é engenheiro e foi transferido para algumas cidades longe — ficamos por dois anos nos vendo a cada 15 dias. Nem tinha como pensar em filhos. Quando ele foi para Santa Catarina, resolvi acompanhar. A gente morava em Imbituba, uma cidade muito pequena. Foi difícil, mas não me arrependo, pois quis priorizar minha família. E ele ganhava mais, o que pesou também. Ficamos dois anos curtindo a vida juntos e aos 33 resolvi que queria engravidar. Depois de seis meses sem conseguir, fiz exames e não deu nada de anormal. A partir daí, todo mês que vinha a menstruação era um luto para mim. Mudamos de cidade, fomos para o litoral paulista e procurei um ginecologista. A gente vai a um médico, aí ele fala ‘Já está tarde…’ e dá um desespero. Fizemos um procedimento chamado coito programado, que consiste em fazer ultrassom na clínica com frequência para descobri quando está ovulando e transar. Não era mais fazer amor, e sim fazer filho. Não chegou a atrapalhar a relação, mas é aquela coisa: ‘Tô ovulando, a que horas você chega?’ Não deu certo. Até que foi preciso ir a um especialista. Nossos exames não deram nada de errado e foi diagnosticada uma infertilidade sem causa. Tentamos a inseminação artificial, não deu. Depois do procedimento, passaram uns dias e eu menstruei. Parecia que tinha perdido um filho, tinha certeza de que ia dar certo. Fiquei muito mal. Eu estava sozinha, meu marido tinha ido viajar a trabalho e fiquei uma semana chorando. Depois pensei: ‘Vamos partir para outra’. E partimos também para o Rio de Janeiro. Lá, visitamos um especialista, mas tendo em mente que seria a última vez. Por mais que questionasse ‘Por que comigo?’ e não entendesse, queria tentar. Além das injeções e remédios, dia sim, dia não ia à clínica para fazer ultrassom. Era tudo muito desgastante e caro, gastamos entre 18 mil e 20 mil reais. Coloquei dois embriões e esperei, preparando minha cabeça para não sofrer. Doze dias depois, quando o telefone tocou, vi o identificador de chamadas, atendi e o médico disse ‘Parabéns, mamãe’. Ajoelhei no chão e chorei muito. Minha filha, Eduarda, está com 3 anos. É uma delícia. No começo foi difícil, ela não mamava muito, teve cólicas e só melhorou no quinto mês. Mesmo que a gente sonhe muito, a maternidade também tem suas dificuldades. Não deixou de ter uma adaptação para a vida nova, mas hoje é só felicidade.”
Kelly Ramos Ritzmann, 38 anos, advogada, São Paulo (SP).

Decidimos adotar

“Tenho 44 anos e as meninas chegaram à minha vida este ano. Sou casada com o Joachim. Ele é alemão e mudou para cá em 2007. A gente se conheceu no ano seguinte em um site de relacionamento, começamos a namorar e fomos morar juntos logo em seguida. Tínhamos muito em comum: a gente ama a natureza, fazer trilhas… Até que em 2011 nos mudamos para o interior de São Paulo para ter uma vida mais tranquila, em uma casa com cachorro e mato, para fazer nossas aventuras. Aí, começamos naquelas de ‘se engravidar, engravidou’, eu estava com 37 anos. E entramos na fila da adoção ao mesmo tempo. Essa questão era forte para a gente, pois o Joachim é adotado. Depois de um ano, começamos a investigar e descobrimos que ambos temos problema de fertilidade. Partimos para a fertilização. Fiz uma em um ano, outra no outro — dei esse tempo, pois é uma bomba hormonal. Você fica em uma TPM constante, é difícil. Até que consegui lidar bem, pois fiz bastante esporte, ioga e retiros. Para o casal, acho que, além do desgaste emocional, tem a coisa da grana. É muito caro e você pensa ‘Podia estar viajando, mas estou aqui no médico’. Um fraqueja, o outro apoia… É um investimento de tempo e dinheiro — gastamos cerca de 20 mil reais em cada fertilização. Mas, como queria meu passaporte para o futuro, fui em frente. Como não deu certo, continuei esperando a adoção, que demorou seis anos! E olha que o meu perfil de criança não era restrito. Eu nem queria um bebê de colo. Podia ser uma de até 6 anos, de qualquer sexo, e não importava a origem. Quando a assistente social, que me conhecia bem, me ligou, disse: ‘Depois de tanto tempo, chegou uma menina que tem exatamente o perfil, mas só tem uma questão, ela tem duas irmãs’. Eu pensei: ‘Vou conhecer sem expectativa; se durante o convívio conseguir amar todas igualmente, vão ser minhas filhas, pois uma mãe ama todos de maneira igual’. Precisava rolar a química dos dois lados. O primeiro encontro foi no fórum da cidade onde elas viviam. Estavam lá Gabriela, Rafaela e Emily, hoje com 7, 5 e 3 anos. Meu marido se acabou de chorar só de olhar para elas. Nos abraçamos e a mais velha disse na despedida: ‘Tchau, mamãe’. Eu gamei nelas, mas tentei ser racional e esperar o processo de convivência: passar um dia, um fim de semana… Aí, chegou o dia em que não precisava mais voltar ao abrigo! Passamos para a vida real, escola, roupa, uniforme, dentinhos caindo… Agora é muito lindo ver como elas já estão ficando parecidas com a gente, vão pegando nosso jeito. O mais incrível foi como minha família acolheu muito as três. Meu pai e minha mãe estão apaixonados, e isso eu sabia que ia acontecer. Mas as meninas também aproximaram tios, primos, todo mundo. A casa sempre fica cheia, é uma alegria. Para quem sonhou muito em ser mãe, agora é ‘mamãe isso, mamãe aquilo’ o dia todo, pra lá e pra cá, em triplo!”
Malu Abib, 44 anos, assessora de imprensa, São Paulo (SP).

Fiz tratamento, adotei e depois tive naturalmente

“Aos 33 anos, estava no primeiro casamento e até então tinha um foco na carreira, fiz MBA, estudei fora. A gente pensa ‘Ah, vamos ter filho’ e acha que está decidido, mas muita coisa pode acontecer. Quando parei com o anticoncepcional, veio um monte de coisa. Não menstruava, tinha dores pélvicas, fiz cirurgia para tentar descobrir uma possível endometriose. As investigações duraram um ano e, por causa de distúrbios hormonais, as chances de ficar grávida e segurar a gravidez seriam mínimas. Tentei uma fertilização in vitro, mas não deu certo. Emocionalmente é muito puxado, e fica aquela contagem regressiva de que quanto mais tempo passa, pior estão os óvulos. Me separei e decidi que seria mãe mesmo sozinha, com produção independente ou adoção. Aí, conheci meu marido, o Renato, e falei de cara qual era a situação. Tinha 36 anos quando entramos na fila de adoção. A habilitação foi rápida, depois de quatro meses, e ficamos esperando o telefone tocar. É uma espera e tanto, você não sabe se é menino ou menina, a idade… Eu estava calma, pois comecei a frequentar grupos de adoção mesmo antes de entrar com o processo. Era nossa gravidez, momento de se preparar, de eliminar dúvidas e tirar a ansiedade. Depois de dois anos e meio, a equipe da vara da Justiça ligou para dizer que havia uma menina de 1 ano e 3 meses. A gente foi primeiro ao fórum conhecer a ficha dela, ver fotos… Depois de uns dias, ficamos esperando para vê-la no abrigo. Aí, bateu a ansiedade, eu não dormia, ficava imaginando como ela seria. Conheci a Gabriela. Quando a vi, não bateu de cara, tem gente que sente assim, mas em dois ou três dias já senti que ela era minha filha. Íamos todos os dias visitar e ficávamos à noite até ela dormir, depois íamos aos finais de semana por mais tempo. Até que ela veio para casa… A Gabriela vai fazer 3 anos em dezembro, é superfalante, inteligente e muito segura. Voltei a trabalhar muito motivada com a vida corrida de mãe e de repente descobri que estava grávida. Somente cinco meses depois da adoção, iria ser mãe de novo, totalmente sem esperar, aos 40 anos. Descobri com quase dois meses de gravidez achando que estava desregulada mais uma vez, só fui investigar porque tinha muito suor à noite. Fiz o teste de farmácia e deu positivo. Fiquei feliz, mas levei um susto. Eu estava cansada com a mudança da vida, queríamos entrar no processo de adoção de novo, mas seriam mais dois anos pelo menos para nos organizar. Não tenho muita explicação para o que aconteceu. O que eu acho mais provável é que me realizei tanto com a Gabriela que meu corpo relaxou. A Beatriz agora está com 5 meses, estou radiante, mas é puxado. Acho que pesa ser mãe aos 40 em termos de energia, mas hoje sou uma pessoa tão melhor do que era aos 30… Estou me realizando — é tudo o que sonhei.”
Ana Luisa Bartolo, 41 anos, administradora de empresa, São Paulo (SP).

Percebi que não queria ser mãe

“Achei que a hora que eu quisesse conseguiria. Casei pela segunda vez aos 37 anos e achei que com 39 iria engravidar e ter filho aos 40. Eu e o Marcos ficamos curtindo a vida por um ano, planejando engravidar em seguida. Não era o maior sonho da vida dos dois, mas eu me via como mãe e sempre amei criança. Aí, um ano se passou e nada. A primeira preocupação nem foi com infertilidade, mas com alguma doença. Procuramos um ginecologista, fizemos exames e ele disse que eu não tinha uma produção boa de óvulos. Me falou que os meus eram como um cacho de uva seco, fez o desenho, e eu só pensava naquilo. Um horror. Comecei a ficar tensa, pois nosso plano morreu. Toda vez que a gente voltava do médico, rolava uma conversa, até cogitamos separação. Essa readequação da realidade, de deixar para trás o que você idealizou, é bem sensível. Bom, meu marido foi relutante de cara, mas chegamos a um consenso sobre fazer fertilização e fomos a um especialista. Fiz a primeira tentativa e foi tranquilo. Mesmo com os remédios e injeções, não foi nada pavoroso como as pessoas falam. Pavoroso para mim foi não ter conseguido naturalmente. Tirei de letra o tratamento. Só que, quando foram fazer a fecundação no laboratório, o embrião não vingou e eu nem cheguei a fazer a implantação. Foi um pouco frustrante, ficamos magoados. Não choramos. Ficamos pensando nos 15 dias seguintes se iríamos fazer mais uma tentativa. ‘É a última; se não for dessa vez, nunca mais’, eu dizia. E esta segunda foi definitiva. O tratamento ficou mais agressivo para eu ovular mais e no meio do processo tive umas crises de ansiedade e muito medo. Acordava chorando. Durante um ultrassom, o médico disse para mim: ‘Não vai ser legal, vou sugerir que a gente interrompa, você não está bem’. Comecei a ir ao psiquiatra e me tratar com terapia e remédios. Tinha muito medo do meu futuro, pensamentos ruins, pavor que meu marido morresse e eu ficasse sozinha com um filho. Durante um ano e meio de terapia, tive um grande entendimento do que queria para minha vida, eu estava rejeitando meu futuro e, no fundo, não desejava ser mãe. Acho que na minha cabeça não existia casar e não ter filhos, era aquela obrigação que parece que toda mulher tem. Uma pressão mesmo. O fato é que vivo muito melhor sem filhos, sou desvinculada das coisas, não sou grudada com minha família e gosto de viajar na hora que quero. Claro que um filho teria sido muito bem-vindo, mas não era para a gente e estamos muito bem assim.”

Patrícia Calazans, 44 anos, revisora, São Paulo (SP).


Reproduzido por: Lucas H.

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