segunda-feira, 5 de junho de 2017

Educação do DF concede a professor efetivo 180 dias de licença pós-adoção (Reprodução)

02, 2017

Mais de seis anos foram necessários para que o sonho de Alexandre Marques de ser pai finalmente fosse realizado. Apesar da similaridade com o caso de outros milhares de brasileiros que alcançaram o direito a maternidade ou paternidade pela adoção, a história do servidor público guarda particularidades e conquistas que merecem as linhas seguintes. Com apoio do marido, o dentista Júnior Vieira, o professor de português do Centro de Ensino Fundamental (CEF) 02 do Riacho Fundo adotou dois irmãos – um de 2 e outro de 11 anos de idade – e se tornou o primeiro servidor do sexo masculino do DF a desfrutar licença de 180 dias, até então restrita a mulheres.

Após a concessão da guarda das crianças, a preocupação com o período de transição e de estar presente para os recém-chegados levou o casal para uma próxima batalha: a de conseguir para Alexandre uma licença de 180 dias, superior aos 90 previamente concedidos para qualquer servidor do DF que passa pelo processo de adoção, independentemente do gênero. De acordo com a Lei Complementar 769, do Distrito Federal, a licença de 180 dias é restrita somente à adotante do sexo feminino ou, no caso de homens, de criança de até 1 ano de idade – e esta foi a resposta obtida, administrativamente, no setor de pessoal da Secretaria de Educação. Entretanto, o professor, que também é advogado, fez requerimento com base no artigo 227, da Constituição Federal, que estabelece que não pode haver qualquer discriminação entre filhos biológicos e adotivos, solicitando prolongação do prazo de afastamento, encaminhada à Assessoria Jurídico-Legislativa da pasta.
“Essa licença não é só direito meu, como homem ou como homossexual, mas principalmente dos meus filhos”, defendeu o servidor. E o entendimento de Alexandre foi compartilhado pelos advogados da Secretaria de Educação do Distrito Federal, que emitiram parecer favorável ao pleito e, com o aval do gabinete, encaminharam para apreciação da Procuradoria Geral do Distrito Federal. Após análises internas controversas, tendo em vista o ineditismo do caso, os procuradores julgaram como legítimo o direito do servidor sem que ele precisasse recorrer à justiça para ter o benefício assegurado. “A partir deste precedente, que surgiu de um entendimento razoável por parte da nossa equipe jurídica, agora todo servidor público distrital passa a ter o mesmo direito”, comemora o secretário de Educação, Júlio Gregório Filho, confirmando que a política será adotada em toda a esfera do Governo do Distrito Federal.

“Em casa, eu acabo trabalhando muito mais do que se estivesse no meu emprego. Aqui eu troco fralda de criança, arrumo cama, acompanho as tarefas de casa, dou comida. Acordo no meio da madrugada para cuidar do mais novo, quando ele começa a chorar”, celebra Alexandre, que agora se dedica integralmente às crianças por um período de seis meses, similar à licença-maternidade.

O processo de adoção

Essa semana, Alexandre abriu as portas de sua casa, no Núcleo Bandeirante, para receber nossa reportagem e falar dos desafios que enfrentou ao longo desse período. Logo na sala de estar conhecemos LFPC*, o mais novo dos garotos. Sentado no sofá, o pequeno vestido de Batman parece não se importar com a presença da nossa equipe. Com os olhos fixos na televisão, ele acompanha o desenho animado de super-heróis. Já MVPC* está na escola. O garoto mais velho cursa regularmente o 4º ano da Escola Classe 04 do Núcleo Bandeirante. O pai, que se revela bastante exigente, orgulha-se do rendimento do garoto em sala de aula. “No ano passado, ele já estava aprovado no 3º bimestre”, contou.

Há pouco, completou-se um ano e meio da chegada dos filhos de Alexandre em casa. Até o cenário atual, de calmaria e rotina, o professor diz ter enfrentado uma via crucis. Tudo começou antes de 2010, quando o processo de adoção deixou de ser meramente administrativo e tornou-se judicial. Um dos efeitos principais da mudança foi a lentidão. “Por um lado foi bom, uma vez que deu mais segurança para a criança e para o adotante. Por outro, tornou o trâmite mais moroso, porque era necessário passar pela apreciação de um juiz e de um promotor especializado em atendimento à criança”, disse ele.

Alexandre passou por todas as etapas exigentes. Realizou o curso de adoção, se submeteu à avaliação de psicólogos e à visita em casa que avalia as condições daquele lar. Até que em março de 2015, se deparou com uma nova alteração. A ministra Cármen Lúcia, do Supremo Tribunal Federal (STF), concedeu a um casal de homossexuais do Paraná o direito de adotar duas crianças. A magistrada considerou que a união estável entre um casal homossexual é equivalente à entidade familiar e a decisão histórica abriu precedentes para outros casos e refletiria na vida de Alexandre e Júnior. O casal teve que [re]inciar todo o procedimento, dessa vez, com os dois constando nos autos. “Faltava pouco. Bastava o processo ir para o gabinete do juiz para eu entrar na fila de adoção. Com essa decisão do STF, voltamos à estaca zero, porque o promotor entendeu que, se eu tinha um companheiro, nós dois tínhamos que figurar no processo”, explicou o professor. Depois de um recomeço e de cumprir novamente todas as etapas, o casal finalmente teria os filhos em sua morada, seguindo um esquema de guarda provisória.

Dois pais

Desde o primeiro contato que o casal teve com as crianças, a homossexualidade foi tratada de forma franca. Alexandre e Júnior se preocuparam em explicar, principalmente ao mais velho, que eles constituíam um casal de pais, formado por dois homens. “Sempre que eu perguntava se havia alguma problema, o MVPC dizia que não. Mesmo quando explicamos para ele que outras pessoas poderiam pensar de outra forma, ele continuou afirmando que não havia problema algum. Muito pelo contrário, a única preocupação que ele tinha era de que ele e o irmão mais novo finalmente tivessem um lar, e que não teriam que voltar mais para a rua”, relembra.

O professor lembra que a primeira prova de fogo aconteceu ainda na escola. Na ocasião uma colega de sala do mais velho perguntou ‘quem é aquele rapaz de branco que vem te deixar?’ e que ele falou ‘meu pai’. Foi então que e garota insistiu: ‘Não, mas tem um de terno, que também vem te buscar’; ele prontamente respondeu: ‘Meu pai também’. Então, a menina questionou surpresa: ‘Então você tem dois pais?’; e meu filho respondeu: ‘Você não sabe de nada! Há pouco tempo, eu não tinha nenhum pai!’ Agora ele tem dois”, gargalhou o pai, orgulhoso.

A paternidade foi tão reveladora para Alexandre Marques e Júnior Vieira, ambos de 39 anos, que ambos já pensam na vinda de um novo membro para a família. Dessa vez, o casal pensa em adotar uma menina.

*As siglas dos nomes foram utilizadas para preservar a identidade das crianças

Original disponível em: http://noticias.se.df.gov.br/noticias/ultimas-noticias/educacao-do-df-concede-a-professor-efetivo-180-dias-de-licenca-pos-adocao/

Reproduzido por: Lucas H.

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