07/06/2017
“A opção pela adoção é um gesto puro, nobre; é um sonho grandioso, e um sonho que só é vivido por pessoas animadas por uma vontade e por um amor imensuráveis”. Dita com propriedade pela juíza Lívia Zwetsch, a frase confirma e exterioriza as intenções de alguém que se empenha para mitigar quaisquer pendências que mantêm crianças e adolescentes depositados em abrigos. Titular da Comarca (de vara única) de Santa Rosa do Sul, em Santa Catarina - a qual abrange mais quatro municípios do interior do estado - desde abril de 2016, a magistrada e sua equipe conseguiram zerar os processos de adoção na região. O resultado? Crianças, antes “esquecidas”, conduzidas a novos lares, sob os cuidados de pais afetivos, além de uma gratificante sensação de que seu trabalho, por vezes, está direcionado a um propósito maior.
“Eu sinto que todos os servidores acabam, em maior ou menor grau, sendo contagiados por histórias cheias de coincidências e com ‘finais felizes’”, afirma a juíza. Entretanto, a trajetória que culminou no alcance dos resultados positivos foi árdua. Lívia conta que os desafios foram muitos, especialmente na questão organizacional: “Gerenciar as entradas, compatibilizar os diferentes ritos processuais e peculiaridades de cada matéria, as urgências, as prioridades, as preferências legais, promover o andamento e julgamento do acervo, equalizar o trabalho observando processos físicos e virtuais e, claro, acima de tudo, manter a qualidade técnica da prestação jurisdicional”.
Desta forma, de acordo com a juíza, foram regularizadas todas as pendências apontadas pela Corregedoria em procedimento de correição e instituídos alguns procedimentos de rotina, a fim de preservar a regularidade dos pontos sanados. Hoje, portanto, o julgamento do acervo da Comarca ocorre de forma gradativa, respeitando um planejamento efetuado no início dos trabalhos. “Zerar processos é relativo, ainda mais em comarca de vara única. Mas hoje, de fato, não temos nenhum processo de destituição do poder familiar em andamento, e os processos de adoção dos menores foram todos concluídos com êxito”, atesta, orgulhosa.
Ela recorda que, quando assumiu como juíza titular em Santa Rosa do Sul, havia diversas pendências a serem sanadas, e que foram observadas prioridades legais e orientações contidas nos relatórios de correição da Corregedoria. “Julgar com propriedade só se tornou possível pelo trabalho conjunto de toda a minha assessoria, da presteza da assistente social forense da Comarca, Priscila Moreira Fabre, e, claro, por conta do magnífico serviço prestado pela promotora Larissa Zomer Loli - é importante um membro do Ministério Público engajado e atuante, e ela e seus assessores têm sido fundamentais para todo o sucesso alcançado”, revela.
Histórias memoráveis
A juíza Lívia Zwetsch e sua equipe se orgulham de todos os casos de destituição do poder familiar e adoção, tratados por eles na Comarca de Santa Rosa do Sul, os quais tiveram desfecho favorável e satisfatório para ambos - crianças/adolescentes e pais afetivos. Duas histórias, entretanto, marcaram a trajetória da magistrada. A primeira delas foi a adoção de um grupo de três irmãos - um bebê e duas meninas com aproximadamente cinco e sete anos. “Se a adoção de uma criança com mais idade já é complicada, ‘três?’, ‘irmãos?’”, pensou. Ela relembra que, na Comarca, não havia pretendentes aceitantes de grupos de irmãos, e que a primeira família, convocada pelo Cadastro Estadual, desistiu dias antes do início da aproximação.
“Surgiu uma segunda família, também localizada no Cadastro Estadual. Eles já tinham um filho adolescente, e vieram de muito longe para conhecer as crianças. Foi amor à primeira vista! O pessoal da instituição acolhedora ligou dizendo que não tinha como deixar os menores longe do casal, que eles choravam demais e pediam pelos pais. Então, tudo foi formalizado, e, no fundo, nós já sabíamos que ali havia se formado uma nova família”, conta.
O segundo caso ocorreu recentemente, envolvendo uma sucessão de coincidências. No dia 19 de maio deste ano, um casal de pretendentes à adoção, habilitado desde 2008, foi convocado pelo Cadastro Estadual para adotar uma menina de cinco anos, que estava numa cidade do norte de Santa Catarina. “Dias antes, tínhamos reorganizado a lista de pretendentes da Comarca e, naquele dia, pedi à assistente social que fizesse uma ‘busca inversa’ nos cadastros. A resposta retornou negativa, e ela observou que havia uma informação que restringia a opção do casal nº 2 a crianças colocadas à adoção em regiões próximas. Orientei-a a entrar em contato para verificar e, se fosse o caso, retificar a informação. Porém, antes mesmo disso ocorrer, naquele mesmo dia, o casal foi convocado. Todos ficamos surpresos e comemoramos junto dos novos pais. Tínhamos a certeza de que aquele casal, enfim, havia ganhado sua filha”.
‘Fica a dica’
Lívia entende ser crucial a necessidade de padronizar o procedimento de adoção e estabelecer a ordem de convocação por meio da inscrição no Cadastro Estadual, de forma a conferir a todos os pretendentes iguais chances de concretizar o sonho de adotar. A juíza, porém, se reserva o direito de não revelar detalhes, mas deixa o recado: “Debater a questão já é um começo, e isso legitima os caminhos e as soluções que possam surgir do debate. Como todos os procedimentos, a adoção certamente está sujeita a melhorias, e nesse contexto parece-me imprescindível acolher medidas que atinjam todos os pretendentes de forma igualitária”.
Acesse os links abaixo e confira mais ações e projetos - além do relato das famílias - que contribuem para a redução do número de acolhidos:
O Brasil tem hoje mais de 47* mil crianças e adolescentes depositados, esquecidos em abrigos. É uma situação cruel e dramática, que envergonha o País. A edição 31 da Revista IBDFAM, lançada em maio, tratou do tema adoção. Prestes a completar 20 anos de existência, o IBDFAM se junta à causa da adoção com a proposta de um anteprojeto de Lei do Estatuto da Adoção, ponto de partida para o Projeto “Crianças Invisíveis”, que será lançado no XI Congresso Brasileiro de Direito das Famílias e Sucessões, de 25 a 27 de outubro, em Belo Horizonte, do qual esta série, Um olhar sobre a adoção**, também faz parte.
* Números oficiais do Cadastro Nacional de Crianças Acolhidas: 47.133, em 24 de maio de 2017 – Fonte: Conselho Nacional de Justiça – CNJ.
Original disponível em: http://www.ibdfam.org.br/noticias/6305/S%C3%A9rie+%E2%80%9CUm+olhar+sobre+a+ado%C3%A7%C3%A3o%E2%80%9D#.WTkrNBJYaIg.facebook
Reproduzido por: Lucas H.
** Consultoria: Silvana do Monte Moreira, presidente da Comissão de Adoção do IBDFAM
“A opção pela adoção é um gesto puro, nobre; é um sonho grandioso, e um sonho que só é vivido por pessoas animadas por uma vontade e por um amor imensuráveis”. Dita com propriedade pela juíza Lívia Zwetsch, a frase confirma e exterioriza as intenções de alguém que se empenha para mitigar quaisquer pendências que mantêm crianças e adolescentes depositados em abrigos. Titular da Comarca (de vara única) de Santa Rosa do Sul, em Santa Catarina - a qual abrange mais quatro municípios do interior do estado - desde abril de 2016, a magistrada e sua equipe conseguiram zerar os processos de adoção na região. O resultado? Crianças, antes “esquecidas”, conduzidas a novos lares, sob os cuidados de pais afetivos, além de uma gratificante sensação de que seu trabalho, por vezes, está direcionado a um propósito maior.
“Eu sinto que todos os servidores acabam, em maior ou menor grau, sendo contagiados por histórias cheias de coincidências e com ‘finais felizes’”, afirma a juíza. Entretanto, a trajetória que culminou no alcance dos resultados positivos foi árdua. Lívia conta que os desafios foram muitos, especialmente na questão organizacional: “Gerenciar as entradas, compatibilizar os diferentes ritos processuais e peculiaridades de cada matéria, as urgências, as prioridades, as preferências legais, promover o andamento e julgamento do acervo, equalizar o trabalho observando processos físicos e virtuais e, claro, acima de tudo, manter a qualidade técnica da prestação jurisdicional”.
Desta forma, de acordo com a juíza, foram regularizadas todas as pendências apontadas pela Corregedoria em procedimento de correição e instituídos alguns procedimentos de rotina, a fim de preservar a regularidade dos pontos sanados. Hoje, portanto, o julgamento do acervo da Comarca ocorre de forma gradativa, respeitando um planejamento efetuado no início dos trabalhos. “Zerar processos é relativo, ainda mais em comarca de vara única. Mas hoje, de fato, não temos nenhum processo de destituição do poder familiar em andamento, e os processos de adoção dos menores foram todos concluídos com êxito”, atesta, orgulhosa.
Ela recorda que, quando assumiu como juíza titular em Santa Rosa do Sul, havia diversas pendências a serem sanadas, e que foram observadas prioridades legais e orientações contidas nos relatórios de correição da Corregedoria. “Julgar com propriedade só se tornou possível pelo trabalho conjunto de toda a minha assessoria, da presteza da assistente social forense da Comarca, Priscila Moreira Fabre, e, claro, por conta do magnífico serviço prestado pela promotora Larissa Zomer Loli - é importante um membro do Ministério Público engajado e atuante, e ela e seus assessores têm sido fundamentais para todo o sucesso alcançado”, revela.
Histórias memoráveis
A juíza Lívia Zwetsch e sua equipe se orgulham de todos os casos de destituição do poder familiar e adoção, tratados por eles na Comarca de Santa Rosa do Sul, os quais tiveram desfecho favorável e satisfatório para ambos - crianças/adolescentes e pais afetivos. Duas histórias, entretanto, marcaram a trajetória da magistrada. A primeira delas foi a adoção de um grupo de três irmãos - um bebê e duas meninas com aproximadamente cinco e sete anos. “Se a adoção de uma criança com mais idade já é complicada, ‘três?’, ‘irmãos?’”, pensou. Ela relembra que, na Comarca, não havia pretendentes aceitantes de grupos de irmãos, e que a primeira família, convocada pelo Cadastro Estadual, desistiu dias antes do início da aproximação.
“Surgiu uma segunda família, também localizada no Cadastro Estadual. Eles já tinham um filho adolescente, e vieram de muito longe para conhecer as crianças. Foi amor à primeira vista! O pessoal da instituição acolhedora ligou dizendo que não tinha como deixar os menores longe do casal, que eles choravam demais e pediam pelos pais. Então, tudo foi formalizado, e, no fundo, nós já sabíamos que ali havia se formado uma nova família”, conta.
O segundo caso ocorreu recentemente, envolvendo uma sucessão de coincidências. No dia 19 de maio deste ano, um casal de pretendentes à adoção, habilitado desde 2008, foi convocado pelo Cadastro Estadual para adotar uma menina de cinco anos, que estava numa cidade do norte de Santa Catarina. “Dias antes, tínhamos reorganizado a lista de pretendentes da Comarca e, naquele dia, pedi à assistente social que fizesse uma ‘busca inversa’ nos cadastros. A resposta retornou negativa, e ela observou que havia uma informação que restringia a opção do casal nº 2 a crianças colocadas à adoção em regiões próximas. Orientei-a a entrar em contato para verificar e, se fosse o caso, retificar a informação. Porém, antes mesmo disso ocorrer, naquele mesmo dia, o casal foi convocado. Todos ficamos surpresos e comemoramos junto dos novos pais. Tínhamos a certeza de que aquele casal, enfim, havia ganhado sua filha”.
‘Fica a dica’
Lívia entende ser crucial a necessidade de padronizar o procedimento de adoção e estabelecer a ordem de convocação por meio da inscrição no Cadastro Estadual, de forma a conferir a todos os pretendentes iguais chances de concretizar o sonho de adotar. A juíza, porém, se reserva o direito de não revelar detalhes, mas deixa o recado: “Debater a questão já é um começo, e isso legitima os caminhos e as soluções que possam surgir do debate. Como todos os procedimentos, a adoção certamente está sujeita a melhorias, e nesse contexto parece-me imprescindível acolher medidas que atinjam todos os pretendentes de forma igualitária”.
Acesse os links abaixo e confira mais ações e projetos - além do relato das famílias - que contribuem para a redução do número de acolhidos:
O Brasil tem hoje mais de 47* mil crianças e adolescentes depositados, esquecidos em abrigos. É uma situação cruel e dramática, que envergonha o País. A edição 31 da Revista IBDFAM, lançada em maio, tratou do tema adoção. Prestes a completar 20 anos de existência, o IBDFAM se junta à causa da adoção com a proposta de um anteprojeto de Lei do Estatuto da Adoção, ponto de partida para o Projeto “Crianças Invisíveis”, que será lançado no XI Congresso Brasileiro de Direito das Famílias e Sucessões, de 25 a 27 de outubro, em Belo Horizonte, do qual esta série, Um olhar sobre a adoção**, também faz parte.
* Números oficiais do Cadastro Nacional de Crianças Acolhidas: 47.133, em 24 de maio de 2017 – Fonte: Conselho Nacional de Justiça – CNJ.
Original disponível em: http://www.ibdfam.org.br/noticias/6305/S%C3%A9rie+%E2%80%9CUm+olhar+sobre+a+ado%C3%A7%C3%A3o%E2%80%9D#.WTkrNBJYaIg.facebook
Reproduzido por: Lucas H.
** Consultoria: Silvana do Monte Moreira, presidente da Comissão de Adoção do IBDFAM
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