Silvana do Monte Moreira, advogada, sócia da MLG ADVOGADOS ASSOCIADOS, presidente da Comissão Nacional de Adoção do IBDFAM - Instituto Brasileiro de Direito de Família, Diretora de Assuntos Jurídicos da ANGAAD - Associação Nacional dos Grupos de Apoio à Adoção, Presidente da Comissão de Direitos das Crianças e dos Adolescentes da OAB-RJ, coordenadora de Grupos de Apoio à Adoção. Aqui você encontrará páginas com informações necessárias aos procedimentos de habilitação e de adoção.
terça-feira, 14 de abril de 2015
Juiz é acusado de tirar bebês das mães e mandar à adoção ilegalmente em MG
Passados mais de 90 dias do nascimento, em 17 de janeiro, o berço continua vazio
postado em 10/04/2015 10:36
/ atualizado em 10/04/2015 10:53
Sandra Kiefer
A
Corregedoria-Geral de Justiça de Minas Gerais vai analisar série de
denúncias contra o Juizado da Infância e da Juventude de Barbacena, na
Região Central de Minas, comandado pelo juiz titular Joaquim Martins
Gamonal. Ele e sua equipe são acusados por advogados, mães e
representantes da organização não governamental Comissão de Direitos
Humanos e Ética de Barbacena (Codhe), entidade ligada à Igreja Católica,
de retirar bebês das mães, alguns dentro da maternidade, e entregar a
famílias adotivas, sem o devido processo legal e o conhecimento dessas
mulheres. O presidente da comissão, Luciano Avlis Marioley, vai
solicitar abertura de CPI sobre o caso à Assembleia Legislativa. O juiz
nega irregularidades.
"Já
vai completar dois anos (o processo) e o juiz não dá nenhuma
satisfação", Olímpio Coelho dos Santos (ao lado da irmã Sebastiana
Isabel de Oliveira), tio de bebê que teve guarda disputada pela família,
sem sucesso
Pelo menos três mães
oficializaram as queixas, anexando detalhes e documentos de cada caso. A
representação, de número 0000217605201516, foi protocolada na
Corregedoria-Geral de Justiça de Minas. Segundo o juiz auxiliar Bruno
Teixeira Lino, a apuração ficará a cargo de Soraya Lauar, juíza auxiliar
da Zona da Mata mineira, que está fora esta semana, viajando a serviço
do órgão.
Em pelo menos um deles, Gamonal foi obrigado a reverter
a adoção e devolver a criança à mãe, em cumprimento ao acórdão do
Tribunal de Justiça, que julgou a ilegalidade do processo. Há também
relato de duas adolescentes que, abrigadas na Casa de Acolhimento de
Barbacena, não apenas conseguiram engravidar estando sob a proteção do
Juizado local, como ainda perderam seus bebês por decisão do tribunal.
Em comum entre todas as histórias, está o fato de que as mães são de
origem humilde, que alegam não ter tido chance de se defender em devido
processo legal. Segundo a lei, só poderão perder a guarda das crianças
as famílias com comprovada trajetória de maus tratos, abuso sexual,
negligência ou abandono.
Um dos depoimentos mais incomuns
listados na Corregedoria é o de uma ex-interna da Casa de Passagem de
Barbacena. A adolescente A. de 17 anos, que deveria estar agora sob a
proteção do Juizado da Infância e da Juventude, afirma que já engravidou
duas vezes no abrigo e teve os filhos retirados pelo juiz. No segundo
caso, o filho J.G. teria sido levado logo depois do parto. “Não sei como
é o rosto do meu filho. Só vi meu bebê no parto, quando estavam
limpando ele”, lamenta a jovem mãe.
Passados mais de 90 dias do
nascimento, em 17 de janeiro, o berço continua vazio. O enxoval está
pronto, o quartinho está ganho no Minha casa, minha vida e até os
recursos financeiros para cuidar do bebê estão garantidos. Apesar da
pouca idade, A. tem responsabilidade suficiente para depositar na
poupança, todo mês, R$ 300 da pensão alimentícia deixada pelo pai. Só
falta mesmo receber o bebê, que nasceu na Santa Casa de Barbacena. O
Estado de Minas e TV Alterosa tiveram acesso ao relatório interno do
hospital, que a própria mãe nunca viu, onde consta que “RN
(recém-nascido) está com sua mãe adotiva; Juizado está ciente”.
No
relatório consta que o bebê saiu às 13h15 do dia seguinte da
maternidade, quando começou a angústia da equipe de profissionais de
saúde da Santa Casa, que se recusam a dar a notícia à mãe biológica. Em
um dos trechos, pode-se ler que “solicitam que o hospital através do
serviço de psicologia assuma a responsabilidade de contar para a
paciente que seu RN foi retirado e que foi para a adoção. Questiono e
pontuo qual o motivo pelo qual não seria dado à mãe a oportunidade de
tentar cuidar deste filho e ainda, se não fariam contato com familiares
para verificarem essa possibilidade. Sendo assim, faço a intervenção de
que esta conduta não é nossa e que não assumiria tal fato”.
Perguntado
sobre o paradeiro do bebê, o juiz Gamonal afirma que o caso em questão
não é dele e que seguiu ordens da promotoria, mas que “faria exatamente a
mesma coisa” como titular da Vara da Infância e da Juventude. Em
entrevista à TV Alterosa, ele tenta justificar dizendo que a jovem é
portadora de dificuldade de aprendizado, além de não ter parentes
próximos capazes de se responsabilizarem por ela. No processo, porém,
não consta o laudo de insanidade mental da mãe. Segundo uma fonte, ainda
que fosse verdade, por si só a doença mental de uma mãe não é motivo
para perda da guarda, o que só ocorre em casos comprovados de usuários
de drogas, abusadores sexuais, violência doméstica ou de abandono.
Juiz Joaquim Martins Gamonal nega as irregularidades nos processos de adoção
TJ devolveu criança à mãe biológica Essa
não é a primeira denúncia de retirada ilegal de bebês em Barbacena, com
o envio da criança diretamente para a família adotiva, sem autorização
da mãe biológica. Em setembro de 2009, o sexto filho da babá G. foi
levado da maternidade. A mãe descobriu que o bebê estava no abrigo de
Barbacena e ficou ao lado do filho, amamentando. Depois de meses, o
menino foi tomado da mãe e entregue em adoção a um casal, que mora no
condomínio Vale das Andorinhas, onde reside o juiz Gamonal.
Ela
perdeu a guarda do menino depois de uma denúncia anônima que, sem provas
concretas, dizia que ela se preparava para vendê-lo filho a um casal do
Rio de Janeiro. “Nunca contei isso a ninguém, mas agora vou dizer que
jamais daria meu filho para adoção, porque eu mesma fui adotada e até
hoje busco o carinho dessa mãe que me criou. Faço de tudo para ela ter
orgulho de mim, mas não sou correspondida”, desabafa.
A mãe
contratou diversos advogados até chegar ao escritório de um profissional
especializado em direito de família, que pede para não ser identificado
porque alega ter sofrido represálias do Juizado. Ele conseguiu reverter
a adoção, impetrando habeas corpus para reaver o bebê, que ficou cinco
meses com os candidatos a pais adotivos. “O juiz tomou a criança da mãe e
entregou a um casal que não podia ter filhos antes mesmo de abrir
inquérito policial para apurar o caso”, diz o advogado. O processo
transitou em julgado no Tribunal de Justiça, que reconheceu a
ilegalidade da adoção, “com a retirada de um bebê do seio da família
biológica com base em denúncia anônima não apurada – e sem o
contraditório e devido processo legal”.
“Não foi ajuizada ação
que viesse a apurar a denúncia anônima posta contra os pais biológicos
da criança – que foi colocada em família substituta sem que os fatos
denunciados fossem, portanto, regularmente apurados. (...) Não foi
sequer ajuizado pedido de tutela, adoção ou de perda do poder familiar
os pais biológicos”, manifesta o texto do acórdão. O relator
desembargador do TJ-MG, Wander Marotta, finaliza a sentença,
determinando que a situação fosse “revertida para evitar maiores danos a
todos os envolvidos”.
O bebê voltou para a casa da mãe, que mora
em um bairro humilde de Barbacena. Passados mais de quatro anos,
tornou-se um garoto bonito e saudável, do tipo que dá trabalho dobrado
para G. “Se já criei cinco filhos, por que não iria criar seis? Não
tenho luxo, mas nunca deixei faltar nada para eles. Meu filho é falador,
bagunceiro e muito carinhoso, principalmente comigo. Ele fica repetindo
toda hora para mim: ‘Mãe, eu te amo!’”, conta a mãe, orgulhosa.
O
procedimento irregular provocou um trauma também para a família
candidata a adotar o bebê. Depois de cuidar do bebê por cinco meses, o
pai adotivo entrou em desespero quando a criança teve de ser devolvida à
família biológica, por ordem do T J. “No nosso caso, a Justiça errou
desde o início ao não avisar sobre a situação real do bebê”, critica o
rapaz. Ele e a esposa receberam depois outro bebê.
Família ainda espera justiça Outro
caso denunciado é o do menino A. L., que deve estar agora com 4 anos e
foi encaminhado para adoção a terceiros, apesar de ser alvo de disputa
na família extensa para decidir quem iria ficar com ele. Moradores de
Barbacena, os tios Olímpio Coelho dos Santos, de 57 anos, e Sebastiana
Isabel de Oliveira, além de uma prima (que prefere o anonimato) tentaram
obter na Justiça a guarda do menino.
Apesar da insistência,
ninguém da família de origem – que deveria ter prioridade na adoção,
segundo o Estatuto da Criança e do Adolescente - conseguiu ficar com o
bebê. “Já vai inteirar dois anos (o processo) e o juiz não dá nenhuma
satisfação. O termo dele é que está em segredo de Justiça, fechado a
sete chaves e só ele tem o segredo”, denuncia Olímpio, que é funcionário
público aposentado e tem condições financeiras para assumir a guarda do
garotinho. A mulher dele, que não quer ser identificada, chegou a
conduzir por conta própria, uma investigação na cidade, para tentar
descobrir o paradeiro da criança. “Combinei com meu marido que iria
colocar o menino como dependente no plano de saúde e também conversei na
escola onde meus filhos estudaram para fazer a matrícula”, diz.
“Imagino
que o neném já deve ter criado laços com a nova família adotiva e, se
for para ele sofrer, não o quero de volta. Só quero Justiça”, afirma a
tia. “Tentei falar com o juiz Gamonal, mas ele disse que tia não é
parente e que não conseguiria o menino nem que entrasse na fila da
adoção”, completa Sebastiana.
Perguntado sobre o caso, Gamonal se
defende, dizendo que os pais de A.L estiveram no Juizado da Infância e
da Juventude para entregar a criança e ainda pediram que o bebê fosse
entregue a uma família de fora de Barbacena: “Estou há 20 anos em
Barbacena e, se eu ficar mais 200, nunca vai ter nenhum problema de
desonestidade, de abuso. Todos esses casos eu sei de cabeça nome de pai,
de mãe, de criança. Não vou falar porque é segredo de Justiça. Se
estiver sendo acusado formalmente pela comissão, pelo CNJ, pela
corregedoria, esses casos serão abertos e eles vão verificar o que
aconteceu”.
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