29.03.2014
Rodrigo da Cunha Pereira
Fonte: Assessoria de Imprensa
A paternidade ou maternidade socioafetiva, embora seja criação recente
do Direito brasileiro, já abraçada pela jurisprudência, inclusive do
STJ, não é nova.
A organização jurídica das famílias estrutura-se em
torno da sexualidade e da economia. Sexo, casamento e reprodução foi
por muitos séculos o esteio do Direito de Família. É certo que o
casamento, já não é mais o legitimador das relações sexuais, e nem é
mais necessário sexo para haver reprodução. Mas o casamento (e a união
estável) continua sendo um contrato para regulamentar patrimônio e tudo
gira em torno do princípio da monogamia, que está cada vez mais sendo
relativizado ao ser ponderado com os princípios constitucionais da
dignidade da pessoa humana, da responsabilidade e da pluralidade das
formas de famílias.
Um dos aspectos deste ramo do Direito que mais
envolve a sexualidade é o das investigações de paternidade. A história
legislativa nos comprova o quanto a moral sexual vigente interfere aí.
Foi somente em 1949, com a lei 883, que foi possível fazer investigações
de paternidade quando o suposto pai fosse casado. E mesmo assim apenas
para se buscar pensão alimentícia. Em nome desta moral condenavam-se os
filhos à invisibilidade e à pecha de ilegítimos, bastardos, espúrios
etc. Tudo isto para garantir a aparência da família patriarcal, até que a
Constituição da República de 1988 veio acabar com estas repugnantes
designações discriminatórias.
Investigar a paternidade revela
segredos e traz à tona intimidades que a maioria das pessoas prefere
esconder. Até meados da década de oitenta as ações de busca de
paternidade eram verdadeiras investigações da vida moral da mãe. Se se
levava ao processo que ela teve relação com mais de um homem, ou seja,
se havia a alegação do exceptio plurium concubentium, era o suficiente
para "descartar" aquele suposto pai. E os filhos ficavam sem pai. Os
filhos de prostitutas então, não tinham nenhuma chance. Com os exames em
DNA, deslocou-se a discussão moral para um eixo mais científico. Esta
foi a primeira revolução nas investigações de paternidade. E quem se
recusa a submeter-se a ele, a lei considera que tem “culpa no cartório”.
Ou seja, o juiz declara a paternidade com base na presunção. Acabou-se o
tempo de procrastinação de processos de investigação de paternidade.
A segunda revolução, e que muitos ainda não se deram conta, é que mesmo
descobrindo-se o genitor, através de exame em DNA, ele pode não ser o
pai. É que paternidade e maternidade são funções exercidas. Os laços de
sangue, e uma certidão de nascimento, embora importantes, não são
suficientes para garantir uma paternidade/maternidade. E assim há hoje
uma outra categoria jurídica de paternidade, que está revolucionando os
processos de busca de um pai: paternidade socioafetiva, já ampliada para
parentalidade socioafetiva. Com isto um filho pode ter um pai
biológico, outro registral, e o seu verdadeiro pai ser aquele que o
criou, ou seja, o pai socioafetivo.
A paternidade ou maternidade
socioafetiva, embora seja criação recente do Direito brasileiro, já
abraçada pela jurisprudência, inclusive do Superior Tribunal de Justiça,
não é nova. Ela vincula-se ao milenar instituto da adoção. Em outras
palavras, se não se adotar o filho, mesmo biológico, ninguém se torna
pai. Prova isto a conhecida família de Nazaré: José não era pai
biológico de Jesus e nem por isto deixou de ser seu verdadeiro pai aqui
na terra. Eis aí o primeiro caso incontestável de paternidade
socioafetiva.
Autor: Rodrigo da Cunha Pereira é presidente do IBDFAM
- Instituto Brasileiro de Direito de Família e sócio do escritório
Advocacia e Consultoria Rodrigo da Cunha Pereira.
Fonte : Assessoria de Imprensa
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