quinta-feira, 26 de janeiro de 2012

Atitude adotiva - Simples assim

Atitude adotiva
Simples assim
Publicado em 26.01.2012, às 16h28



Por Guilherme Lima Moura
Dia desses Marília, minha filha mais velha, perguntou-me: “pai, e se você só tivesse um filho? O que você faria?”. De imediato respondi: “Arrumava mais três”. Rimos os dois ante a simplicidade da resposta. Não poderia ser diferente. Quando conversamos com crianças é assim. Elas são simples e verdadeiras. Muitas vezes perguntam muito mais do que a interrogação que lançam. Querem saber do que passa na nossa alma. Então, quando conversamos com elas só produzimos diálogo verdadeiro se agimos do mesmo modo: com simplicidade e verdade.

Mas quando a conversa é com nossos filhos essa verdade simples flui a partir do cotidiano que partilhamos. Ela é parte de uma grande teia de convívio que confirma ou desconfirma o que dizemos ser. Por isso, com nossos filhos somos o tanto de verdade que fazemos quando agimos de tantas formas, inclusive no dizer.

Essa simplicidade verdadeira tem a ver com o ser pai e mãe, com o ser filho. Por isso que este breve diálogo produziu, entre minha filha e eu, um tanto (ainda) a mais de amor. A cumplicidade dos nossos olhares, o sorriso de felicidade, o entendimento, o abraço. Tudo isso é parte da imensa afetividade que temos construído nestes oito anos. Tudo isso se chama ADOÇÃO.

Aqui e ali ouvimos tantos e tantas arrastarem dores ansiosas na busca do ser mãe/pai. Não poupam esforços; nem gastos. E nem sempre alcançam o objetivo que almejam. Em meio a abençoadas experiências no campo da fertilização assistida, pelas quais outros tantos chegam à existência terrestre, não são poucos os que se frustram nas estatísticas dos insucessos biológicos. E como sofrem! Conversam confidentes com os pares, na solidão do leito vazio, sobre a falta daquele ou daquela que preencheria de alegria o ambiente doméstico. Lamentam-se.

Mas eis que na raiz de tantas dores um outro olhar sobre a questão poderia descortinar certo engano. Em verdade, o comum e milenar engano de associar a paternidade/ maternidade à gestação. Sim, porque enquanto esta propicia o espaço de elaboração fisiológica do ser individual, a partir dos genitores e sua prole, é só na adoção que surge o espaço relacional no qual se constroem pais e filhos. A adoção é o incomparável encontro de amorosidade entre duas pessoas, pouco importando se entre elas existem traços biológicos comuns. Adotar é acolher, proteger, acarinhar. Adotar é amar e amar sem condições.

Sem a adoção, a descendência biológica faz par com o abandono afetivo, e produz as multidões de “órfãos de pais vivos” que habitam silenciosos tantos lares por aí. A gestação não garante a maternidade. Nem a maternidade depende da gestação. Esta é apenas um ponto de partida. Nem imprescindível, nem suficiente.

É... Às vezes complicamos o que é simples. Não posso sequer cogitar, imaginar o que seria de mim sem meus quatro filhos, que me chegaram aos braços pela abençoada via da adoção. O que, em algum momento da minha vida, poderia ter se tornado dor e sofrimento encontrou na simplicidade da adoção o entendimento profundo e simples do que é ser pai. Simples e verdadeiro como a conversa com minha filha. Simples assim.

*As colunas assinadas não refletem, necessariamente, a opinião do NE10

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