segunda-feira, 28 de maio de 2012

Aumenta o número de adoções tardias no Brasil

Cerca de mil crianças foram adotadas nos últimos 3 anos e cresceu a procura por crianças com mais de 2 anos Fernanda Carpegiani Quem pensa em adoção logo imagina levar um bebê bem pequeno para casa. Mas para muitas famílias a realidade é bem diferente. Uma pesquisa feita pela psicóloga Lídia Weber mostrou que o número de adoções de crianças maiores de 2 anos está aumentando. Em um estudo feito no ano passado com 736 famílias por adoção, a especialista concluiu que 30% de todos os processos são de adoções tardias. Veja também: Iguais na diferença Há 30 anos, elas representavam apenas 8%. “Houve uma mudança clara na mentalidade dos adotantes e agora estamos seguindo o exemplo dos países desenvolvidos, em que adotar crianças maiores é mais comum”, afirma Lídia, pesquisadora do tema há 20 anos e autora de Pais e Filhos por Adoção no Brasil (Ed. Juruá). Os números do Cadastro Nacional de Adoção – criado em 2008 para reunir os dados de interessados em adotar e crianças disponíveis – mostram que nos últimos 3 anos, cerca de 1 mil crianças foram adotadas no Brasil, mas não há dados oficiais que contabilizem a adoção tardia. Mesmo assim, o Conselho Nacional de Justiça confirma que essa procura realmente aumentou. “Hoje existem mais interessados em adoção tardia, o que é um fator muito positivo. As pessoas têm uma consciência maior de que a idade não é tão importante para o sucesso da adoção. Em muitos casos, as crianças de 6 a 8 anos aproveitam muito bem essa oportunidade, porque já compreendem melhor o rompimento dos vínculos”, afirma Nicolau Lupianhes, juiz auxiliar do Conselho Nacional de Justiça. Veja também: A devolução de crianças adotadas Uma medida que vai favorecer essa situação é a Lei de Adoção Tardia, que prevê licença-maternidade de quatro meses para quem adotar crianças maiores de 1 ano e está em tramitação na Câmara dos Deputados. Por enquanto, a maioria dos interessados quer adotar crianças de 1 a 3 anos e o perfil mais procurado são meninas brancas com menos de 4 anos, não portadoras de nenhuma doença e não integrante de grupo de irmãos. É por isso que, apesar de existirem mais de 28 mil pretendentes e pouco mais de 5 mil crianças disponíveis, muitas continuam sem um lar. Entenda o processo de adoção Se você está pensando em adotar, existem algumas etapas a serem seguidas. Primeiro, é preciso ir até a Vara da Infância e Juventude mais próxima à sua casa e dar entrada ao procedimento de habilitação para a adoção. O interessado deve levar seus documentos pessoais, comprovante de endereço, atestado de sanidade física e mental, e então dizer o perfil da criança que deseja adotar. Depois, ele será entrevistado por psicólogos e assistentes sociais, que vão declarar se ele está apto ou não para iniciar o processo de adoção. Também será necessário passar por um curso preparatório, cujo tempo de duração varia de acordo com cada Vara da Infância. Por fim, o pretendente entra no Cadastro Nacional de Adoção e aguarda pela criança. O tempo de espera varia muito, mas quanto menor o nível de exigência, mais rápido é o processo. O caminho não é simples e exige dedicação e preparo. “A adoção é tão importante quanto a filiação genética, mas existem diferenças. A principal delas é a espera, que pode ser grande ou pequena, e sempre causa angústia”, diz a psicóloga Lídia Weber). Uma boa forma de diminuir a ansiedade durante esse período é fazer um diário. O registro também poderá servir de recordação e até ajudar a criança quando ela crescer e quiser saber mais sobre o seu passado. Conversar com outras pessoas que estão passando pelo mesmo e frequentar grupos de apoio à adoção também são formas de lidar com a angústia e as dúvidas que com certeza vão surgir. Veja depoimentos de quem adotou, de quem está na fila de espera e de quem está pensando em adotar: Valter Ricardo Afonso, 45 anos, empresário. É pai adotivo solteiro da menina S., 7 anos, e do menino K., 10. “Aos 30 anos, não tendo constituído uma família e já com a vida profissional equacionada, eu comecei a sentir aquele vazio. Em 2006, fiz uma viagem a Portugal e conheci um primo de 15 anos que tinha uma história de vida complicada e cresceu institucionalizado. Esse contato me fez refletir sobre a paternidade. Quando voltei ao Brasil estava decidido a adotar e entrei com toda a documentação. Durante 2 ou 3 anos, a vara infantil me apresentou algumas crianças, mas nenhuma deu certo. Tentei um processo de adoção na Bahia, com uma mulher que estava grávida, mas no fundo ela queria dinheiro, então nada feito. Então eu conheci dois irmãos, que eram de um abrigo e frequentavam a aula de natação dos meus sobrinhos. Minha cunhada os conheceu e insistiu que eu fosse encontrá-los. Eu fui e acabei me apaixonando por eles. Saí de lá direto para a vara da infância, mas descobri que eles não estavam disponíveis para adoção. Foi aquele balde de água fria. Eu disse então para eles deixarem meu cadastro congelado, porque eu ia repensar isso tudo. Quase 2 anos depois, em 2010, o juiz permitiu que essas crianças fossem adotadas e a vara da infância entrou em contato para saber se eu ainda tinha interesse. E claro que eu tinha! Passei por todo o processo e começamos a aproximação no mesmo ano. K., o menino, tinha 7 anos, e S., a menina, tinha 5. No início eu imaginava adotar um bebê, mas depois pensei que seria uma responsabilidade muito grande cuidar sozinho dele. Mas o que foi decisivo para mim foi o que senti quando conheci K. e S.. Eu estava tão consciente do que queria que fui atrás. E foi a melhor coisa que eu fiz. É claro que o caminho não é fácil. Surgem questões como ‘eu não vou ter um filho parecido comigo’, angústias e dúvidas, mas tudo faz parte do processo. Algo que me ajudou muito foi frequentar um grupo de apoio à adoção, onde ouvi muitas histórias que foram trazendo elementos novos para as minhas questões e me dando a segurança necessária para efetivar a adoção. Hoje K. tem 10 anos e S. 8 e são crianças ótimas. Nós tivemos algumas crises, especialmente com o mais velho, que ficou agressivo em alguns momentos, mas eu conversei com uma psicóloga e até hoje ele faz terapia com ela. O fato de ser sozinho dificulta um pouco mais, porque é bastante coisa para fazer. Se eles ficam doentes eu tenho que largar tudo e sair correndo, mas eu me preparei para isso e já tinha uma condição profissional que me permitia flexibilidade. Hoje eu posso dizer que tenho uma família linda. Minha vida mudou totalmente, mas é exatamente o que eu queria. Me emociono com cada conquista deles, com o boletim, com os comentários positivos da professora, com as medalhas da natação. Somos uma família como qualquer outra.” Edileusa Eugênio Barbieri, 45 anos, psicóloga. Está na fila de adoção há 2 anos com o marido. “Faz 3 anos que eu e meu marido, Marcos, começamos o processo de adoção. Nossa história começou tarde, porque nos conhecemos e nos casamos depois dos 30. Quando pensamos em ter filhos eu já estava com 36. Fizemos várias tentativas até que, quando eu tinha 39 anos, partimos para os tratamentos de fertilização. Tentamos tudo, desde os mais simples até a fertilização in vitro, mas não conseguimos engravidar. Não foi nada fácil. Primeiro foi preciso passar por todo esse processo de aceitar que não teríamos filhos biológicos, para depois pensar em adoção. Se dependesse do meu marido, nós já estaríamos na fila há mais tempo, porque eu que tive mais dificuldade de aceitar. Era o tempo que eu precisava para amadurecer que não iria gerar o meu filho. Fui amadurecendo a ideia até aceitar que pela via natural não seria possível, mas que ainda assim nós teríamos a nossa filha, e poderíamos criá-la com muito amor acima de qualquer coisa. Na primeira vez que fizemos as entrevistas fomos reprovados. Um ano depois, tentamos mais uma vez e aí sim deu certo. Agora estamos na fila aguardando a nossa menina há 1 ano e meio. É um teste de paciência, porque a fila é grande, a espera é grande, e eu e meu marido temos um fator cronológico que me preocupa. Vamos curtir a maternidade e a paternidade com uma idade mais avançada, mas o desejo de poder fazer isso é maior do que qualquer fator numérico. O que favorece essa espera é a minha relação com o meu marido. Ele é uma pessoa muito especial e sempre me dá apoio. Quando estou triste ele me dá forças e diz que vai dar certo. Mas eu penso nisso todos os dias. Fico esperando a hora que o telefone vai tocar.” Nany Netz, 44 anos, consultora de viagens. Está começando o processo de adoção. “Eu sempre quis ser mãe. É uma vontade que me acompanha desde a adolescência. Mas agora estou com 44 anos e ainda não consegui engravidar. Não por problemas de saúde, mas o fato é que não encontrei um parceiro. Já cheguei a terminar um relacionamento porque a pessoa não queria ter filhos, porque eu não abro mão de querer ter a minha família. Há algum tempo penso em adotar uma criança, mas do ano passado para cá essa possibilidade se tornou mais forte para mim. A hora chegou, então estou correndo atrás do meu sonho. Já entrei em contato com o fórum para saber quais são os documentos necessários e verificar como é o processo, agora estou esperando ter uma folga no trabalho para ir até lá e preencher o formulário. O fato de eu estar mais madura e preparada ajudou bastante na minha decisão. Dúvidas eu não tenho e a vontade só cresce. Muitas pessoas querem adotar um bebê, mas eu penso em adotar uma criança mais velha, com 5 ou 6 anos. Sei que a espera para esse tipo de adoção é menor, então estou confiante de que o processo não vai demorar e logo terei meu filho ou filha.”

Nenhum comentário: