quinta-feira, 1 de dezembro de 2016

Especial apresenta histórias de pesssoas que venceram o abandono familiar (Reprodução)

27 de novembro de 2016

SILVIA CHIMELLO Mogi das Cruzes oferece 160 vagas para crianças e adolescentes em situação de vulnerabilidade social que são retirados do convívio familiar por determinação judicial. A Cidade consegue atender a demanda, mas as seis entidades que atuam na área trabalham sempre no limite.

O Estatuto da Criança e do Adolescente (Eca) determina um prazo de dois anos para que a Justiça decida a vida dos menores encaminhados para os acolhimentos. Nesse período é realizado um trabalho com as famílias para tentar a reintegração com os filhos, antes de fazer o encaminhamento deles para a adoção.

A secretária municipal de Assistência Social, Eliana Mangini afirma que Mogi é a cidade com melhor estrutura no Alto Tietê e oferece mais opções do muitas que cidades maiores, como Guarulhos que dispõe de apenas 120 vagas. No entanto, afirma que a questão do menor não é simples de resolver. “Precisa de politicas públicas mais eficientes de prevenção para tentar buscar uma solução e evitar problemas com as famílias”, afirma.

Sobre o tempo de permanência, ela alega a situação é flutuante. Mas um levantamento feito pela pasta em 2014 mostrou que 38% dos abrigados ficam bem mais de dois anos nas instituições, principalmente aqueles com mais de 6 anos de idade, que não se encaixam no perfil exigido pelas famílias interessadas em adoção. Apenas 11% dos maiores de seis anos permanecem menos de 24 meses nas entidades.

Números divulgados pelo Conselho Tutelar em 2015 davam conta que a média de permanência das crianças e adolescentes em abrigos de acolhimento institucional no Município é de cinco anos.
A conselheira tutelar Rita Sesmilo disse que o ideal seria um número menor de crianças abrigadas e que os casos de conflitos se resolvessem com mais rapidez, “o que não acontece”.

“O certo seria instalar mais equipamentos públicos para intensificar o trabalho para reestruturar as famílias, em vez de criar mais casas de acolhimento. Os pais sãos os responsáveis pelo bem estar e segurança dos filhos, mas cabe ao Estado dar o suporte para que as famílias possam cumprir essa missão”.

De acordo com a conselheira tutelar, na maioria dos casos os pais perdem a guarda dos filhos por negligência, sendo que hoje os principais motivos dos conflitos estão relacionados ao uso de drogas. As crianças são retiradas dos pais dependentes químicos, por exemplo, porque eles não oferecem o mínimo de suporte de sobrevivência para criança.


Quando a Justiça entende que os pais não conseguem assumir essa responsabilidade, procura-se, então, a “família extensa”, algum parente que possa assumir a guarda dessa criança. Eliminada essa possibilidade, eles são levados para abrigos.
A Abrac, instituição que cuida de menores de zero a 17 anos, mantém atualmente quatro bebês com menos de seis meses. Na última semana, foram encaminhadas quatro crianças de uma só família para o local.
A presidente da instituição, Marli Ribeiro, explica que existe um grande número de famílias interessadas em adoção, mas maioria quer crianças de 0 a 2 anos, da cor branca, o que reduz as chances dos maiores. “O trabalho tem que ser rápido, porque quanto mais tempo a criança fica no abrigo, mais difícil deixar o local, e muitos deles acabam crescendo nas instituições”.
O atual dirigente da Associação São Lourenço, padre Eugênio Luciano Libier explica que existe hoje uma grande preocupação por parte das entidades em preparar os adolescentes para seguir uma carreira profissional e ter uma estrutura para sobreviver sozinho quando deixam os abrigos ao completar 18 anos.

MarcosMarcos Antônio de Souza, 27 anos, acordou numa manhã e a mãe não estava mais ao lado dele. Tinha apenas 9 anos. A vizinha comunicou o Conselho Tutelar, que o encaminhou para a Casa São Lourenço, em Taiaçupeba.

“Fiquei maravilhado quando cheguei naquele espaço maravilhoso, achei que estivesse chegando ao paraíso, ainda mais porque fui recebido por todos com abraço. Sensação diferente, porque nunca tinha sido abraçado antes”, lembra.

Aos 18 anos saiu de lá se sentido preparado para novos desafios. Trabalhou em restaurantes por um tempo, até que 2014 foi contratado pela fábrica da Femsa (fabricante da água Crystal), em Jundiapeba, para trabalhar na área de operação.

Divide o aluguel de uma república com outros amigos que também saíram da instituição. Ele tem planos de fazer faculdade de Administração de Empresas e se casar no futuro. “A comunidade prepara os jovens para a vida, ensina que há vários caminhos, mas depende de cada um fazer a melhor escolha. Aprendi a valorizar a vida e lutar para alcançar os meus objetivos”, filosofa.

O jovem continua frequentando o espaço aos finais de semana para dedicar um tempo às crianças.

Renato
Depois da separação, o pai foi embora deixando a mãe sozinha com três 3 filhos, infectada com vírus HIV. Isso aconteceu há 16 anos, quando Renato Mendonça tinha 10 anos. Por conta dos problemas de saúde da mãe, que permanecia longos períodos internada, foram encaminhados para a Casa São Lourenço. Depois de três anos ela morreu e os meninos ficaram lá.

Renato conta que aprendeu com a mãe a valorizar os estudos e sabia que esse era o caminho para uma vida melhor. Não perdeu o foco, conseguiu bolsas de estudos e cursou escolas particulares na Cidade.
Quando fez 18 anos, deixou a instituição na mesma época que teve que se alistar e fazer o Tiro de Guerra, mas conseguiu abrigo na casa de uma antiga amiga da mãe. Trabalhou em fábrica e supermercado em Mogi e depois de alguns anos foi contratado pela Infra Engenharia, no Bom Retiro, em São Paulo onde está há mais de 4 anos.

Casou-se com Ana Ligia que teve uma filha Sofia de três anos. No ano passado fez o Enem, foi aprovado e conseguiu bolsa de 100% no ProUni, prestou vestibular para Engenharia na Uninove, na Vila Maria e está concluindo o primeiro ano. Comprou uma motocicleta e um terreno para construir a casa própria.

MônicaMônica Ernani Gomes da Silva, 22 anos, chegou ao abrigo aos 7 anos, porque os pais não tinham condições de ficar com a menina. A jovem morou por 10 anos no local.

Conta que foi recebida “com todo amor e carinho” pela presidente da Abrac, Marli, com quem tem uma relação muito próxima até hoje de mãe, amiga e companheira. “Ela é uma benção em minha vida, sempre me deu muito amor e me ensinou a viver com dignidade”, disse.

Durante o tempo em que permaneceu na Abrac completou o ensino médio e quando chegou aos 18 anos foi convidada para ir à Noruega por parceiros que ajudam a instituição. Passou um ano fora e retornou ao Brasil em 2013 e ficou um tempo trabalhando na própria entidade

Em 2014, arrumou um emprego no Hotel Marbor, onde trabalha até hoje. Mora sozinha e está se preparando para fazer faculdade na área de Recursos Humanos. Começou no hotel como garçonete e agora é recepcionista, quer crescer profissionalmente e vê muita chance para o futuro.

“A Abrac foi a melhor coisa que me aconteceu. Se não tivesse tido essa chance tudo poderia ter sido diferente”, avalia. “Todos têm oportunidade na vida, basta agarrar as oportunidades e seguir em frente”.

VirginiaA história de Virginia Rodrigues Craig, de 27 anos, na Abrac começou em 15 de dezembro de 1997, quando tinha 7 anos de idade. A mãe morreu e o pai não tinha condições de criar os três filhos crianças e foi procurar ajuda da instituição. Permaneceu no local até os 19 anos.

Depois dos 18 anos foi estudar e trabalhar na Noruega, morando em casa de uma família. Ficou fora do País por três anos, juntou dinheiro para faculdade e decidiu voltar em 2005, quando começou o curso de Psicologia. Falta apenas uma disciplina para concluir.

Trabalha na área administrativa da Abrac. “Ajudo a receber as crianças que chegam ao abrigo, tenho muita facilidade para relacionar com elas, porque passei por isso e sei como se sentem quando chegam”, destaca.

Em 2009 se casou com Adam Brian Craig, que veio da Irlanda para trabalhar e conhecer a instituição, e tem um filho de 2 anos, chamado Benjamin. A família agora se prepara para viajar para a Irlanda onde deve permanecer por um ano.

O irmão, Diego, mora na Noruega, onde se casou e se tornou pai. O outro irmão, Alex, preferiu ficar no Brasil e trabalhar também na Abrac.

ProjetoMogi das Cruzes pode sair na frente com um novo projeto pioneiro chamado “República”, idealizado para oferecer um aparato aos jovens que são obrigados a deixar as instituições de acolhimento institucional quando completam 18 anos. A legislação já prevê esse tipo de equipamento desde 2009 para adolescentes entre 18 e 21 anos.

A Secretaria Municipal de Assistência Social conseguiu incluir a instalação desse novo equipamento na dotação orçamentária da Prefeitura para 2017. O projeto prevê o aluguel duas casas, uma para homens e outra para mulheres, com seis vagas em cada uma, custeada pelo poder público. Nesse período os jovens também continuariam recebendo assistência e acompanhamento.
“Apesar do esforço das instituições em preparar os adolescentes para uma vida independente a partir dos 18 anos, eles precisam de uma retaguarda até os 21 anos, para que possam se estruturar suas vidas”, argumenta a secretária de Assistência Social, Eliana Mangini. A proposta tem o aval do Conselho Municipal da Criança e do Adolescente.


Reproduzido por: Lucas H.

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