domingo, 4 de março de 2012

Confira entrevista com Clicério Bezerra, juiz da 1ª Vara da Família do Recife

Confira entrevista com Clicério Bezerra, juiz da 1ª Vara da Família do Recife
Redação do DIARIODEPERNAMBUCO.COM.BR
02/03/2012 | 12h22 | Família




“Não podemos nos esquivar de decidir”
Diante da delicadez de certos temas, magistrados têm lançado mão de princípios constituicionais básicos para assegurar alguns direitos dos cidadãos, mesmo que ainda não estejam explicitamente previstos em lei. É assim que atua o juiz da 1ª Vara da Família da Comarca do Recife, Clicério Bezerra, autor da sentença que concedeu a dupla paternidade a Wilson e Maílton, além de ter reconhecido a união estável do casal como casamento civil, em agosto de 2011.

Como você chegou à conclusão de que o casal tinha direito ao registro?
Os fundamentos foram basicamente os mesmos que usei para autorizar o casamento deles. Recentemente, uma decisão do STF reconheceu a união estável entre pessoas do mesmo sexo. Se foi permitido que eles constituíssem família através do casamento, por que não permitir que essa família se completasse através de uma criança?

Quantos casos como esse o senhor já viu no Judiciário?
Entre homens é o primeiro. Existem casos de registro de dupla paternidade na adoção. Pernambuco foi um dos pioneiros na concessão de adoção a casais homoafetivos. Este caso (de Wilson e Maílton) é o único em que dois homens registraram uma criança como filho legítimo. Que eu tenha conhecimento, porque às vezes não há divulgação, existiu um caso de entre mulheres, no Rio Grande do Sul.

Qual o conceito de família atualmente?
Já existem varias modalidades de família. Desde que exista afeto, tende a dar certo, independentemente do sexo. O direito de familia moderno é sintonizado com a dinâmica social e não pressupõe mais a oposição de sexo para a constituição de uma entidade familiar. A família atual não é mais regida por aquele arcaico patriarcalismo, em que o homem é o provedor e a mulher é dona de casa. Hoje a família, em suas várias modalidades, se sedimenta no afeto. Existindo afeto, para mim, existe família.

Como o senhor vê o caso de Wilson e Maílton?
A demonstração deles em vencer a discriminação é uma prova irrefutável de um afeto que eles nutrem por essa criança. A gente sabe que não é fácil mostrar a cara assim diante de uma sociedade conservadora.

Como o senhor acha que o Judiciário pode contribuir para o avanço na questão?
O tema é bastante controverso dentro do Judiciário. O Congresso Nacional, por sua vez, tem projetos que nunca foram votados porque a matéria que diz respeito às minorias e pode trazer desgaste eleitoral a quem vai se posicionar favoravelmente. Essa construção jurisprudencial é para um dia normatizar essas situações. Vai assegurando o direito dessas pessoas. Como não podemos nos esquivar de decidir, fazemos isso através dos princípios constitucionais da igualdade, da não discriminação de sexo, cor raça, e vamos dando uma moldura jurídica a essas situações.

Por Joana Perrusi, do Diario de Pernambuco

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