25/09/2017
Adotar é, sem dúvidas, um ato de amor, que transforma não só a vida do adotado, mas também de quem adota. Porém, naturalmente, é um ato que carrega suas responsabilidades – e, entre as principais delas, está a necessidade de “abrir o jogo” e falar sobre a adoção com a criança ou adolescente adotado.
Este é um tema que causa muitas dúvidas e até medos em pessoas que já adotaram ou pensam em adotar. “Como e quando dizer ao filho que ele é adotado?” é a grande questão.
Certamente não existe uma resposta padrão, já que cada caso é único, mas é fato que contar sobre a adoção é uma necessidade. Assim, ter isso em mente é o primeiro passo para agir e fazer tudo da forma mais natural possível, exatamente como deve ser.
Contar sobre a adoção é, sobretudo, permitir que a criança ou o adolescente conheça sua própria história e, assim, possa conviver com ela, sem traumas ou tabus. Por mais que, dependendo do caso, num primeiro momento, a informação possa chocar e até gerar certas chateações, vale lembrar que a verdade é sempre o melhor caminho.
Quando contar à criança que ela é adotada?
É difícil falar em uma idade ou momento adequado, já que cada caso tem suas particularidades. Mas, é fato que, o quanto antes a criança adotada souber da verdade, melhor!
Para Lizandra Arita, psicóloga especialista em clínica e institucional, este deve ser um processo normal, natural, que faça parte da vida da criança, desde pequena, de uma forma metafórica. “Não se deve esperar um momento específico, como um ritual ou uma celebração especial para ser contado. Deve ser um assunto conversado com seriedade, mas não como um tabu”, diz.
“O ideal é que seja falado naturalmente para a criança que ela não é filha biológica, que nasceu da barriga de outra mulher, mas que veio para essa família e é considerada como filha/o, apenas não nasceu pelas vias biológicas”, acrescenta a psicóloga.
Neste sentido, é interessante “encaixar este assunto quando ele couber”. Quando a família estiver assistindo a algum filme que fale sobre o assunto, por exemplo, comenta Lizandra. “Quando forem rezar, se fazem este ritual, os pais podem aproveitar para ‘agradecer pela pessoa que trouxe a criança ao mundo’, etc. Ou seja, podem arrumar formas de dar exemplos, falando sobre a adoção de forma verdadeira, leve e transparente, sem que isso seja pesado”, orienta.
“Eu sempre ensino as mães também a fazerem isso, primeiramente, pela parte inconsciente, ou seja, na hora que a criança dorme, na conversa noturna. Assim que a criança dorme, logo nos primeiros minutos, a mãe se aproxima do ouvido da criança e explica a situação. Pede perdão por algo de ruim que tenha acontecido, diz que ama muito a criança, que a aceita como filha, diz que a criança pode aceitar naturalmente essa condição, com amor, com gratidão, com aceitação plena, sem rancores, perdoando”, acrescenta a psicóloga.
Vale destacar que, dependendo da idade da criança, ela pode ainda não entender com clareza o assunto. Mas, ainda assim, ele deve ser introduzido no dia a dia da família, pois, com o passar dos anos e amadurecimento da criança, isso provavelmente terá feito toda a diferença, e ela começará a entender melhor todo o contexto e lidar com naturalidade com o fato.
A partir dos dois anos, por exemplo, as crianças já começam a ouvir com mais interesse as histórias que são contadas, ótima oportunidade para a família continuar utilizando-se de casos da ficção como exemplo, como personagens infantis de desenhos ou filmes que foram adotados e são muito amados e felizes em suas famílias.
E quando o filho já está mais velho?
Ainda é “possível” contar? Com certeza! “Eu acho que a verdade cabe sempre e em todos os lugares. Sobretudo, porque é a história da pessoa. Acredito que ela tenha o direito de saber pelos pais como foi a sua própria história. Acho que o diálogo funciona em todas as situações”, destaca Lizandra.
“No entanto, se deixar para contar sobre a adoção na adolescência ou, então, se na adolescência o filho começa a questionar, a ligar os ponto e descobrir sozinho, pode ser muito complexo, pois a adolescência é uma época de muita instabilidade emocional e revolta”, comenta a psicóloga.
Por isso, reforça-se a necessidade de falar o quanto antes sobre o assunto. Mas, se, por qualquer que seja o motivo, isso ainda não tenha sido feito, é momento de refletir e fazê-lo. Se os pais estiverem muito inseguros neste processo, uma boa dica pode ser procurar um psicólogo ou outro profissional que possa ajudá-los nesta importante e necessária tarefa de se abrirem e contarem a verdade para o filho ou filha (que já não é mais uma criança pequena).
As possíveis reações do filho adotado diante da verdade
É impossível prever como será a reação da pessoa adotada, até mesmo porque tudo depende da idade em que a criança foi adotada, da idade atual e das circunstâncias em que a verdade foi revelada. Mas, de forma geral, ela pode reagir da seguinte maneira:
Assustar-se, sentir-se rejeitada: “Pode ser que a reação não seja tão boa, claro. Principalmente, se ela nunca ouviu falar nada sobre isso antes, pode se assustar, pode se sentir rejeitada, pode sentir medo e insegurança”, diz Lizandra. “No entanto, vale a pena falar francamente e acolher o filho adotado, mostrando que ele é filho, que o amor é o mesmo, que essa é a sua família e que tudo continuará da mesma forma que antes”, acrescenta.
Sentir raiva: “Se a situação da adoção não foi falada desde o começo, de forma natural, e respeitando a história da criança, pode ser que ela sinta raiva. E quanto mais raiva ela sentir, sobretudo, na época da adolescência, pode ser que queira buscar os pais biológicos para agredir, ofender e machucar os pais adotivos, pois ela sabe que esse é o grande ponto de confronto. Ela sabe que é isso que os pais adotivos podem temer”, comenta a psicóloga. “Então, o ideal é não deixar chegar essa época tão delicada para abrir a situação, pois as reações dos filhos adotivos podem ser agressivas e machucar bastante”, acrescenta.
Sentir-se confusa, mas acolhida: Especialmente se a verdade foi falada naturalmente para a criança desde pequena, a tendência é que ela tenha uma boa aceitação… Ainda que se sinta um pouco triste ao pensar que “foi rejeitada” pelos seus pais biológicos, provavelmente sentirá gratidão e felicidade por estar onde está hoje.
Questionar: A criança ou adolescente pode querer saber mais e mais sobre sua história; sobre quem são seus pais biológicos, tentar entender por que a colocaram para adoção… Nesta hora, o melhor caminho é o diálogo, falar abertamente sobre o assunto e evidenciar o amor que ela recebe desde o momento que foi adotada.
Essas são apenas algumas das possibilidades, lembrando que cada caso e a personalidade da criança ou adolescente são únicos.
Para Lizandra, paciência e amor são palavras-chave para a família lidar com as mais variadas reações que podem surgir por parte do filho adotado. “Devem assim mostrar ao filho que eles continuam ali, dando tudo o que sempre deram, apoiando e acolhendo”, diz.
A psicóloga destaca ainda que os pais adotivos também devem deixar a situação aberta para caso a criança adotada queira conhecer seus pais biológicos, afinal isso faz parte da história dela. “Algumas perguntas ficam latentes na cabeça das pessoas adotadas e são muito recorrentes: ‘por que me rejeitou, por que não quis ficar comigo, o que eu fiz de mal para me abandonar?’… Essas são perguntas muito doloridas e a criança precisa elaborar algo internamente para conseguir viver bem consigo mesma e também com sua família adotiva”, explica Lizandra.
Após contar a verdade, independentemente da idade do filho, os pais devem se mostrar abertos para voltar a falar sobre o assunto caso ele queira. Afinal, mais uma vez, lidar com a informação da maneira mais natural possível, sem torná-la um tabu, é o melhor caminho para o entendimento e convivência de toda a família.
Fonte: Portal Dicas de Mulher
Reproduzido por: Lucas H.