quinta-feira, 6 de outubro de 2011

"Meu filho sem nome"

Entrevista: Izilda Simões, autora da peça "Meu filho sem nome"
04/10/2011 | Fonte: Assessoria de Comunicação do IBDFAM
A autora conta como foi o processo de construção da peça que se confunde, em muitos momentos, com a sua própria história, e fala sobre como a adoção é tratada no Brasil

A mãe biológica e a mãe adotiva: dois olhares diferentes sobre a adoção de uma criança. Este é o tema central da peça "Meu filho sem nome", dirigida por Marcelo Romagnoli e escrita por Izilda Simões, inspirada em sua própria história. As atrizes Aparecida Petrowky e Cristiane Brasil interpretam, respectivamente, as mães adotiva e biológica.

Além de procurar desconstruir a visão comum de que uma mãe que entrega o seu filho para adoção é uma mãe descuidada, a peça ainda aborda a busca desta criança por um lar e por uma identidade. Trazendo esta reflexão para o público, "Meu filho sem nome" mostra uma jovem mãe de 15 anos que optou por entregar o seu filho a alguém que tivesse condições e estrutura para dar uma vida melhor a ele.

A história da própria autora, Izilda Simões, se confunde à história da mãe adotiva, interpretada por Aparecida Petrowki. As duas não puderam ter filhos biológicos, e foram em busca de uma criança com quem poderiam construir seus laços de afeto, tão relevantes e expressivos quanto os laços de sangue. A partir daí, Izilda criou a história da mãe biológica que não conheceu de fato, mas sabia que era uma adolescente de 15 anos, que não teve apoio da família e que entregou a criança para que uma pessoa pudesse cuidar (e depois, essa pessoa entregou para uma instituição de adoção).

O IBDFAM conversou com Izilda Simões a respeito da criação e construção da peça que aborda uma temática tão importante em um país onde crianças são abandonadas todos os dias e milhares de crianças e pais adotivos esperam na fila de adoção a oportunidade de construir uma família.

IBDFAM: De onde partiu a ideia para a peça "Meu filho sem nome"?

Izilda Simões: Da minha própria história. Eu sou mãe adotiva e sempre tentei passar referências positivas em relação à adoção para o meu filho. Ele cresceu achando que era muito bom ser filho adotivo, pois tinha duas mães, mas à medida que ele foi crescendo o mundo foi desconstruindo essa imagem que eu e meu marido passamos para ele. A mídia sempre divulga histórias ruins em relação às mães que abandonam o seu filho, então ele passou a nos questionar sobre isso e a sentir certa rejeição por parte da mãe biológica.

Dessa forma, meu objetivo inicial ao escrever esta história era apresentar para ele a peça, com um pequeno grupo, mostrando essa mãe biológica de uma forma positiva, e não como se ela tivesse abandonado o seu filho e o rejeitado. Quis mostrar para ele que existem outras histórias e que a mãe que entrega o seu filho para adoção não é necessariamente aquela mãe má que a mídia mostra. Muitas mães entregam sim o seu filho para adoção com muita dor no coração e em um ato de amor à criança, significando que naquele momento ela está impossibilitada de dar uma vida digna a essa criança, seja por falta de recursos, por falta de apoio da família e do pai da criança ou por falta de estrutura psicológica, que é muito comum de acontecer, principalmente em meninas de 14, 15 anos, que engravidam.

IBDFAM: E como é essa história e aonde ela se encontra com a sua própria história?

Izilda Simões: Como eu disse, a peça é uma maneira de resgatar a mãe biológica de uma forma positiva. A ideia é trazer a luz esta mãe que acaba sendo estereotipada em uma posição ruim de "péssima mãe" e mostrá-la de uma maneira amorosa, expondo que apesar de não ter ficado com o filho, ela buscou o melhor caminho para ele, dentro de suas possibilidades. Esta mãe é uma menina de 15 anos que engravida e se depara com a falta de apoio da família e do pai da criança, que é o que geralmente acontece nestes casos de gravidez na adolescência. Ou seja, essa mãe também foi abandonada pela família e pelo parceiro. É um abandono que acaba se repetindo.

A história foi baseada na mãe biológica do meu filho. Eu tinha apenas algumas informações sobre ela, pois não quis desarquivar o seu processo, simplesmente por não encontrar necessidade de fazer isso. Ela teve os motivos dela e a história dela. Mas eu sabia que ela era uma adolescente de 15 anos, que entregou a criança a uma pessoa, e esta pessoa entregou para uma instituição. Então eu imaginei que essa mulher foi uma pessoa que ela deixou para cuidar do meu filho, uma pessoa especial, que era a mãe que ela queria para esta criança. Não imaginei que ela tivesse simplesmente descartado o seu filho. É uma história que envolve muitas perdas, até mesmo uma perda minha e do meu marido, pois eu sempre quis ter filhos e não pude engravidar.

IBDFAM: Se o seu filho quiser procurar a mãe biológica algum dia para conhecê-la, saber quem é, qual será a sua postura?

Izilda Simões: Eu sei que com 18 anos qualquer pessoa que foi adotado pode pedir o desarquivamento de seu processo e buscar as suas raízes, a sua família biológica. É a história do meu filho, ele tem o direito de saber se ele quiser, diferente de mim que nunca tive vontade de procurar saber mais sobre este processo e ir a fundo na história, mas com certeza eu vou apoiá-lo, e se ele quiser, eu o acompanho nesta busca.

IBDFAM: Como você vê os processos de adoção no Brasil?

Izilda Simões: Na peça eu faço uma crítica, inclusive a mim mesma, sobre isso. Quando eu descobri que não poderia gerar o meu filho, eu sonhava com uma gravidez e queria um bebê, um recém nascido, para começar do zero uma história com ele. Eu me vi recém-casada com um monte de sonhos e queria que a criança aprendesse a falar mamãe comigo, que eu fosse a primeira pessoa que ele dirigisse essa palavra. Naquele momento da minha vida, há 15 anos atrás, eu tinha esse pensamento, eu queria uma criança recém-nascida.

Hoje eu vejo isso como um grande problema no Brasil, em relação à adoção, pois o número de casais que querem adotar uma criança é muito grande, mas, muitas vezes essas crianças que estão para adoção não se encaixam nos perfis destes casais. A grande maioria procura bebês recém-nascidos, de pele clara e do sexo feminino, e o perfil das crianças em abrigos e instituições de adoção não é este. Na peça, eu até mostro um problema que tive com a adoção do meu filho, pois sua adoção ainda não era definitiva, ou seja, se a mãe biológica aparecesse e quisesse levar o seu filho com ele, eu teria que aceitar. Dessa forma eu fiquei por três anos tendo que renovar a adoção dele de seis em seis meses, e correndo este risco.

Há muitas crianças em abrigos que acabam sendo prejudicadas pela demora da lei, pois se elas teriam a chance de estar em uma família, por exemplo, em dois anos, após este período as possibilidades disso acontecer acabam sendo diminuídas, pelo fato da criança já estar um pouco mais velha. Outra coisa que dificulta a adoção dessas crianças é o preconceito que muitas pessoas têm, pois quando a criança não é exatamente um bebê, os pais em potencial têm medo de que a criança já venha com traumas, falhas na personalidade e coisas deste tipo. Eu não vou criticar a justiça em relação a esta demora, pois até mesmo fazendo a peça eu percebi o quanto é difícil estar no meio enxergando as duas realidades ali presentes e tomar uma decisão. Como a mãe biológica diz na peça "se eu tivesse o apoio da minha mãe e se o Zé [pai fictício da criança] tivesse ficado do meu lado, eu ia lá pegar meu filho". Então, como julgar esta mãe e como acabar com a possibilidade desta mãe poder ficar com o seu filho um dia? E todo este processo demora um tempo, gerando assim este problema.

Para mais informações sobre a peça, como apresentações em sua cidade, basta entrar em contato por e-mail: meufilhosemnome@gmail.com
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