Justiça não se entende sobre prazo para entrega do adotado
Quinta-feira, 20 de setembro de 2012.
Jornal de Brasília
Kamila Farias
kamila.farias @jornaldebrasilia.com.br
O sonho de muitas mulheres é ser mãe, mas algumas vezes, esse desejo só pode ser realizado adotando uma criança ou adolescente. Agora, os já difíceis processos de adoção ganharam ainda mais obstáculos.
Desde a mudança legal do procedimento, adotado em 2009, começou um cabo de guerra entre o Ministério Público do Distrito Federal e a Defensoria Pública. Até agora, não há um entendimento sobre o prazo em que a criança estaria apta a ser legalmente adotada.
O Ministério Público do Distrito Federal (MPDFT) defende que a criança só vá para o convívio dos pais adotivos após o completo encerramento do processo de perda de guarda dos pais biológicos. A Defensoria Pública alega que o intervalo de tempo necessário para o desenrolar da ação, acaba obrigando a criança a passar muito tempo em abrigos.
A promotora da 4ª Promotoria de Justiça Cível e Defesa dos Direitos Individuais Difusos e Coletivos da Infância e Juventude Luisa de Marillac explica que para haver o processo de adoção, a criança deve ser incluída em um cadastro de adoção. E, para que isso ocorra, ela precisa ser desvinculada dos pais biológicos e estar finalizado o poder familiar.
“A criança não é uma coisa que se possa dispor. Não temos como apresentar uma criança para um novo casal se ela não estiver desvinculada da família biológica, explica. Segundo ela, durante o período de desimpedimento, há o risco real de que o pai ou mãe biológica desista e queira o filho de volta”, diz.
Luisa de Marillac informa que o tema vem levantando muita polêmica, pois alguns juízes têm tido um entendimento diferente do adotado pelo MPDFT: “Estão apressando o processo, passando por cima do rito legal.” Ela argumenta que o processo deveria ser finalizado em até 120 dias. “Mas as varas não agilizam e não adianta passar por cima da lei para acelerar o processo” completa.
PARA SEMPRE MINHA FILHA
A dona de casa Helen Vieira é casada e há cinco anos estava na fila de adoção. Há pouco mais de um mês, recebeu uma ligação da Vara da Infância e do Adolescente, dizendo que havia um bebê cadastrado para adoção. O casal conheceu a criança e passou a conviver com ela, mas o dia tão esperado de levá-la para casa não chegou. Uma outra ligação interrompeu o sonho. O casal foi informado que a criança tinha sido retirada do cadastro e que eles teriam que esperar mais algum tempo para chamar a menina, definitivamente, de filha.
“Já a temos como nossa filha. Já convivíamos com ela há um mês, mas o grande dia nunca chegava, era adiado toda a semana. É difícil, pois fomos apresentados a ela e, agora, a retiraram de nós. O casal ficou magoado, pois estava apegado à criança. “Ela não é um objeto, que se a gente não gosta, devolve. Independentemente do processo, ela será nossa filha e a queremos por perto”, revela a dona de casa.
A Vara da Infância e da Juventude informou não poder se manifestar sobre casos específicos.
MPDFT x Defensoria
O defensor público e coordenador do Núcleo da Infância e Juventude Sérgio Domingos ensina que existe um passo a passo para quem quer participar do processo de adoção. Primeiro, é necessário se apresentar à Vara da Infância e da Juventude, se habilitar, se cadastrar e depois encontrar a criança. Para quem quer doar, o procedimento é o mesmo. Deve-se procurar a Vara e fazer um acompanhamento para que se tenha certeza da decisão.
“Em seguida, a criança é levada para um abrigo, o juiz determina que se faça o cadastro e, só então, a criança é apresentada a alguém da fila. O problema é que o Ministério Público do Distrito Federal e Territórios entende que o primeiro passo é destituir família. “Nós entendemos que isso não pode acontecer, pois a mãe não cometeu nenhum crime. É diferente abandonar e entregar. Ao entregar, ela não cometeu crime, pelo contrário, cumpriu a lei, que pede que ela entregue a criança à Vara.”
Sérgio Domingos defende que haja a extinção de família em vez de destituição. “A destituição é perene, o vínculo futuro nunca poderá acontecer caso queiram. A extinção seria o processo ideal, pois é a decorrência natural da sentença e não uma penalidade. Destituir é a penalidade para quem abandona e entregar não é crime. É amparado por lei”, afirma.
O defensor acredita que a destituição não preserva os direitos da criança e ainda deixa a mãe que entregou a criança com o nome sujo até o arquivamento do processo.
“Até que o processo termine, vai constar ação contra ela. Isso é um dado negativo. Imagina essa mulher procurando emprego, vai constar que ela está respondendo a processo. Mas essa mãe apenas cumpriu o que a lei” diz.
Fonte: Jornal de Brasília, Caderno Cidades
Nenhum comentário:
Postar um comentário