quarta-feira, 31 de maio de 2017

Após pensar em adoção na África, casal homoafetivo adota menino brasileiro em 9 meses (Reprodução)

30/05/2017

Na semana passada, em razão do Dia Nacional da Adoção (25/5), o Família Plural trouxe o tema para discussão e contou a história de duas diferentes famílias. Hoje, no dia em que o blog comemora um ano de vida, damos sequência à série com um terceiro relato acerca do assunto.

Quando se conheceram, em um feriado no verão de 2004, em Florianópolis (SC), Andre Pralon, 49 anos, e Gustavo Silva, 40, não imaginavam que 11 anos depois em suas vidas haveria um terceiro elemento que passaria a dar um novo sentido aos seus dias: Jeová.

Ao longo dos anos, já são 13 de relacionamento, sendo que a união civil foi estabelecida em junho de 2014, o casal homoafetivo foi amadurecendo a ideia de ter um filho. “Queríamos acolher alguém para participar da nossa vida”, comenta Andre. Ele, que é ex-piloto aposentado da Força Aérea Brasileira (FAB), contou ao blog que quando decidiram ser pais por adoção até pensaram em adotar uma criança na África. “Estive em uma missão na Costa do Marfim e lá conheci um padre. Ele perguntou: ‘você acha que no Brasil não tem criança para ser adotada?’. Quando voltei da missão, após um ano, começamos a correr atrás das coisas e a fazer o curso na Vara da Infância”, explica.

A história de Jeová, 9 anos, não é muito diferente da de outras crianças que estão em abrigos à espera de uma família. Porém, a trajetória que o levou até os novos pais começou em uma fila no aeroporto, quando Andre se preparava para embarcar para a cidade de Natal (RN). “Havia uma mulher à minha frente, ela consolava e orientava alguém ao telefone que havia adotado três crianças. Quando ela desligou, eu disse que não era por acaso que estava atrás dela na fila. Contei minha história e do Gustavo, que queríamos adotar uma criança, e descobri que ela era a vice-presidente do Aconchego (Grupo de Apoio à Convivência Familiar e Comunitária)”. Nesta época, o casal morava em Brasília, passou a fazer parte do Aconchego e contratou uma advogada para auxiliá-los no processo de habilitação na vara da infância e da juventude.

Após nove meses de o processo ter iniciado, Andre sugeriu a Gustavo que entrassem no sistema de busca ativa, aquela que auxilia na busca por adotantes habilitados para crianças e adolescentes denominados “de difícil colocação” (grupos de irmãos que não devem ser separados, crianças acima de 5 anos, com deficiências físicas e/ou mentais). “No dia seguinte a psicóloga da Vara da Infância ligou para o meu telefone. Ela disse que tinha um menino que fugia um pouco do perfil que buscávamos, que era entre 3 e 6 anos”, e continua, “eu disse a ela que precisava conversar com o André. Fiquei bem desestruturado com a ligação. Primeiro fui colocar minhas ideias em ordem e depois falei com ele. Não sabíamos o nome da criança, nada, apenas que era um menino de 8 anos. Precisávamos dar um sim ou não para ter mais informações”, explica Gustavo. E, claro, a resposta foi sim.

A chegada de Jeová

Em 2015, quando receberam a ligação da Vara da Infância e da Juventude de Brasília sobre Jeová, o casal estava morando em São José dos Campos (SP), onde vive atualmente. Os dois seguiram para a capital do país para conhecer o menino que eles sequer sabiam o nome. “Chegamos lá no dia 1º de outubro, descobrimos que seu nome era Jeová e o conhecemos por fotos. Em contrapartida, ele já estava sendo trabalhado no abrigo para o fato de que teria dois pais. No dia seguinte, fomos conhecê-lo pessoalmente e a emoção tomou conta. Ele logo me deu um abraço e chamou a gente de pai desde o primeiro momento”, relembra Gustavo.

Andre conta que antes de receberem a ligação, a Vara entrou em contato com outra família, que acabou declinando. “Depois de conhecermos toda a história dele, a psicóloga nos mostrou uma foto, aí eu desabei, comecei a chorar, o olhar dele na foto me emocionou muito, a similaridade física que ele tinha comigo”.

O ex-piloto conta que ficaram dez dias convivendo com o filho no abrigo. “Íamos todos os dias. Fomos a Brasília só para isso”. Como o abrigo ficava em um local distante, o casal andava praticamente uma hora para ir e uma hora para voltar. Além disso, começaram a mostrar fotos e vídeos dos tios, dos avós, de pessoas da família para que ele já pudesse conhecer todos. “Desde o momento em que recebemos a ligação soubemos que o Jeová deveria estar com a gente. Fomos tirando ele devagar do abrigo, um dia fomos soltar pipa, depois ao shopping, zoológico. No aniversário do Gustavo fomos para um hotel e ele dormiu com a gente. Até que, sob a ótica dos profissionais que nos acompanhavam, não tinha mais o que fazer. Assim, o juiz nos deu a guarda provisória”, conta Andre.

Foram 23 dias para que Jeová saísse do abrigo e uma nova família se formasse. “A questão de vínculo e afetividade entre nós três foi estabelecida muito rápido”, fala Andre.

Preconceito e nova rotina

O casal conta que desde que o filho chegou à vida deles não passou por nenhuma situação de preconceito. “O Jeová é sempre muito bem acolhido como parte de uma família homoafetiva”, comenta Andre.

Eles comentam que a rotina mudou, mas que tentam seguir uma regra que deveria ser aplicada por todos os que têm filhos: “tentamos não mudar a nossa vida 100% em função do Jeová. Ele chegou para complementar a nossa vida, nós o inserimos na nossa rotina. O incluímos em tudo o que podemos fazer juntos, mas ele tem as atividades que faz sozinho como escola, aula de inglês, futebol, sessões com a psicóloga. Da mesma forma, mantemos as nossas”, completa Andre.

Dentre as coisas que mais gosta de fazer, o menino, que nasceu em Brasília, diz que soltar pipa é uma das brincadeiras favoritas. Em comparação à vida que levava com a atual, diz que gosta muito do condomínio onde vive, de assistir TV, de mexer no tablet e dos novos pais. “O pai Andre cozinha uma farofa muito boa. O pai Gustavo faz arroz carreteiro e salada muito gostosos. Não dá pra decidir o que é melhor”, diz Jeová.

Andre comenta que o abrigo em que o filho viveu antes de chegar à casa era muito organizado. “As crianças aprendiam a organizar as coisas, até por ser um ambiente comunitário. Quisemos manter e estimular isso. Vias de regra, ele é uma criança bem organizada”. O casal estimula o filho a continuar assim e a compreender que todos têm suas responsabilidades dentro do lar. “As atividades domésticas temperamos com a idade. Achamos importante ele entender que somos uma família e que é importante a gente se ajudar”, finaliza.

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Reproduzido por: Lucas H.

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