quarta-feira, 24 de maio de 2017

Pais adotivos têm dificuldades para lidar com questões da criação dos filhos e da própria adoção (Reprodução)

22/05/2017

Por Claudia Pereira
Maria José Correa, mãe por adoção de duas meninas e coordenadora do projeto Conta de Novo, acredita que as pessoas, em sua maioria, não estão preparadas para serem pais; blog fará uma série de matérias sobre o tema durante a semana do Dia Nacional da Adoção.

Maria José Correa, 59 anos, sempre quis ter filhos, mas em seus planos nunca esteve a ideia de ter uma produção independente. Ela queria se casar e constituir uma família. Porém, o casamento demorou a acontecer, ela estava com 41 anos quando se uniu ao marido Paulo, que hoje tem 62 anos. Eles tentaram uma gravidez natural e, na época, a médica que a acompanhava pediu uma avaliação pessoal para ambos e disse que seria difícil ela engravidar por conta da idade. “Fiquei grávida, mas abortei voluntariamente logo no comecinho. Decidimos seguir para a reprodução assistida, mas o tratamento era muito desagradável e desistimos”.

Maria José e Paulo decidiram, então, seguir para a adoção. “Não tínhamos ideia de quantos filhos queríamos. Fizemos a habilitação para a adoção e ficamos na fila. Depois de dois anos esperando, encontramos a nossa filha”. A., hoje com 15 anos, chegou à casa deles com 1 ano e 1 mês. “Na época em que adotamos, podia-se definir se queria adotar uma criança ou mais. Hoje, é diferente, cada processo é individual. Dissemos que, sim, que queríamos adotar mais uma e voltamos para o final da fila”.

A mãe por adoção diz que na primeira vez eles tinham um perfil restrito, mas nem tanto: sexo indiferente, cor indiferente, mas a idade tinha de ser de 0 a 2 anos. Já na segunda adoção, pediram uma menina de 2 a 4 anos. N., que hoje tem 12 anos, chegou ao novo lar quando tinha 1 ano e 11 meses. Ambas as meninas estavam em abrigos.

No que diz respeito às dificuldades que têm na criação das filhas, Maria José diz que é como a vida de qualquer pai e mãe que possui filhos adolescentes. Sobre os questionamentos das meninas no que se refere à família biológica, ela diz que desde muito cedo introduziu o assunto com elas. “Em determinadas fases perguntam mais, outras menos”, comenta. As meninas perguntavam, por exemplo, ‘como era quando estavam dentro de sua barriga’. “Eu dizia para elas que nunca estiveram na minha barriga, mas de uma outra mãe que não pôde cuidar delas, mas que Deus as trouxe para nós. São perguntas curtas, nada aprofundadas, e aparecem quando temos pessoas grávidas na família, por exemplo, aí a pergunta acompanha”.

A experiência de ser mãe por adoção, segundo Maria José, é algo que muda não apenas a vida de quem está adotando, mas da criança e das próximas gerações. “Se esse encontro não tivesse ocorrido, a vida teria acabado ali, não teríamos próximas gerações. Vale esse investimento”.

Maria José diz que quando olha para as filhas se sente muito mais responsável, positivamente,  pois passou por um processo de busca por elas. “Fui, literalmente, buscar minhas filhas. Olho para elas e me sinto plenamente realizada como mãe. Tanto, que queremos compartilhar nossa experiência com outras pessoas”.

Projeto de Apoio à Adoção
O tema adoção já fazia parte da vida de Maria José muito antes da chegada das filhas. Ela trabalhou por anos no Tribunal de Justiça (TJ) como assistente social judiciária perita da vara da infância e juventude e da vara de família.

Hoje, aposentada do tribunal, coordena um Projeto de Apoio à Adoção, chamado Conta de Novo, que faz parte da Associação Beneficente e Comunitária do Povo (ABCP). O nome foi dado pela filha mais velha de Maria José, inspirado em um livro que a mãe sempre lia para ela na infância: “Conta de Novo a Historia da Noite em que Eu Nasci”.

O objetivo do grupo, que atua há 4 anos, é preparar pessoas que desejam ser pais e mães por adoção por meio de palestras com profissionais na área de saúde e serviço social, orientando-os sobre diferentes aspectos que envolvem os interesses da criança e do adolescente em situação de privação de convivência familiar. O próprio Tribunal de Justiça sugere às pessoas que pretendem adotar que participem de grupos de apoio. Existem muitos outros como o Conta de Novo e todos podem ser pesquisados na página do TJ. A lista do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo pode ser vista aqui.

Para Maria José, as pessoas não são preparadas para ser pais, “os relacionamentos são muito fluidos. No projeto, temos uma preocupação em trabalhar os valores familiares, exercício da paternagem, da maternagem”.

A coordenadora do Conta de Novo diz que, depois da adoção, os pais, muitas vezes, não sabem lidar com a questão da criação dos filhos e da própria adoção. Ela diz que, normalmente, os pais transferem a revelação sobre a adoção para fases como a dos 6/7 anos, quando a criança inicia o período de racionalização, ou para a adolescência. Segundo Maria José esses são períodos muito difíceis. “Muitos pais acreditam que enquanto a criança não questiona é porque ela não está pensando em sua origem, mas se enganam, elas estão pensando, mas muitas vezes não falam. As famílias têm muitas dificuldades quando as crianças começam a perguntar sobre a família biológica e entram em pânico”.

O projeto ajuda não apenas pais que estão na fila da adoção, mas também aqueles que estão em vias de receber suas crianças em definitivo, além dos pais que estão com dificuldades para lidar com qualquer tipo de questão que se refere ao diálogo com os filhos adotivos.

“Oferecemos palestras e preparação para pessoas que estão no processo adotivo. Trazemos temas como motivação para adoção, mitos, questão da revelação, desenvolvimento infantil, assuntos relativos à educação dos filhos, entre outros. Tentamos combinar a experiência profissional com a adoção e alternar com a apresentação de pais que já adotaram e que querem compartilhar suas histórias”.

O grupo é aberto a qualquer pessoa que tenha intenção em adotar, desde casais tradicionais, até pessoas solteiras e casais homoafetivos. Para quem tiver interesse em conhecer o projeto, o próximo encontro será no dia 10/6, às 9h, na Igreja Batista do Povo (Rua Domingos de Morais, 1.100). O tema discutido será “Mitos e Verdades sobre patologia com crianças adotadas”. É  preciso fazer inscrição prévia.

Dia Nacional da Adoção
Na semana que marca o Dia Nacional da Adoção, o Família Plural trará matérias relacionadas ao tema.

No dia 25 de maio se comemora o Dia da Adoção, a data foi criada em 1996 no I Encontro Nacional de Associações e Grupos de Apoio à Adoção.

Este é um assunto em constante debate entre grupos de apoio e pessoas que estão há anos na fila para adotar. Dados do Cadastro Nacional de Crianças Acolhidas (CNCA) do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), mostram que há no Brasil, atualmente, mais de 46 mil crianças e adolescentes em situação de acolhimento, ou seja, vivendo em abrigos. Mas apenas sete mil estão aptas para a adoção.

No início de outubro de 2016, o Governo lançou uma consulta pública com o objetivo de debater e mobilizar a sociedade a respeito do tema. O PL a ser criado traz questões como o prazo para a realização da entrega voluntária de crianças para a adoção, apadrinhamento afetivo, acolhimento familiar, adoção internacional e prazos para a realização do processo de adoção. O blog tratou do assunto, confira aqui a matéria.

Original disponível em: http://emais.estadao.com.br/blogs/familia-plural/pais-adotivos-tem-dificuldades-para-lidar-com-questoes-da-criacao-dos-filhos-e-da-propria-adocao/

Reproduzido por: Lucas H.

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