Tribunal TJRS
Data: 24/10/2014
PODER JUDICIÁRIO
---------- RS ----------
ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL
PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA
JLD
Nº 70061178067 (Nº CNJ: 0310369-82.2014.8.21.7000)
2014/Cível
APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE DESTITUIÇÃO DO PODER FAMILIAR. ABANDONO
FAMILIAR. MENINA QUE SE ENCONTRA NA COMPANHIA DOS REQUERENTES DESDE OS
DOIS ANOS DE IDADE. Não merece reparo a decisão que destituiu o poder
familiar, já que o apelante não exerceu as atividades inerentes a
paternidade, enquanto que os apelados possuem a guarda fática da criança
desde 2007, com liame afetivo evidente.
Apelação cível desprovida.
Apelação Cível Sétima Câmara Cível
Nº 70061178067 (Nº CNJ: 0310369-82.2014.8.21.7000) Comarca de Cruz Alta
R.J.G.
..
APELANTE
L.B.M.L.
..
APELADO
O.S.M.
..
APELADO
L.C.S.
..
INTERESSADO
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos os autos.
Acordam os Desembargadores integrantes da Sétima Câmara Cível do
Tribunal de Justiça do Estado, à unanimidade, em negar provimento ao
apelo.
Custas na forma da lei.
Participaram do julgamento, além do signatário (Presidente), os
eminentes Senhores Des. Sérgio Fernando de Vasconcellos Chaves e Des.ª
Liselena Schifino Robles Ribeiro.
Porto Alegre, 24 de setembro de 2014.
DES. JORGE LUÍS DALL'AGNOL,
Relator.
RELATÓRIO
Des. Jorge Luís Dall'Agnol (RELATOR)
Trata-se de recurso de apelação interposto por R.J.G. da sentença que,
nos autos da ação de tutela e suspensão do poder familiar que lhe move
L.B.M.L. em favor de R.F.S.G. julgou procedente o pedido para o fim de
destituir do requerido o poder familiar em relação à sua filha e deferir
a tutela aos autores (fls. 191/196).
Em suas razões recursais, o apelante afirma que a medida tomada é
excessiva, não havendo, nos autos, um conjunto probatório suficiente
para tal. Aduz que essa medida só deve ser tomada em casos em que a
criança tenha sido lesado os direitos fundamentais do menor, o que não
acontece no caso em tela. Refere que no ano de 2010 o apelante afirmou
que não se opunha a perda da guarda, por dificuldades financeiras que
vinha passando, entretanto, atualmente, não foi mais ouvido, de modo que
não se tem conhecido da sua situação. Declara que o apelante passa por
dificuldades financeiras, sendo uma pessoa humilde e sem instrução, no
entanto isso não serve de prerrogativa para destituição. Pugna, por fim,
pelo provimento do recurso para o fim de reformar a sentença e julgar
improcedente o pedido (fls. 197/206).
Recebido o recurso (fl. 208).
Intimados, os agravados não se manifestaram (fl. 211).
Sobem os autos a esta Corte.
O Ministério Público opina pelo conhecimento e desprovimento do recurso (fls. 217/220).
Vêm-me conclusos para julgamento.
Registro, por fim, que foi cumprido o disposto nos artigos 549, 551 e 552, todos do CPC.
É o relatório.
VOTOS
Des. Jorge Luís Dall'Agnol (RELATOR)
Trata-se de irresignação da apelante quanto à destituição do poder familiar em face da menor R.F.S.G.
Sem razão ao recorrente, adianto.
Em que pese os argumentos expostos nas razões recursais, os elementos
colhidos ao longo da instrução deste feito não autorizam a reforma da
sentença, devendo ser mantida a destituição do poder familiar do
apelante em relação à filha.
De acordo com o art. 24 do Estatuto da Criança e do Adolescente, ocorre
a perda do poder familiar “na hipótese de descumprimento injustificado
dos deveres e obrigações a que alude o art. 22”. O Código Civil, por sua
vez, no inciso II do artigo 1.638 estabelece que “perderá por ato
judicial o poder familiar o pai ou a mãe que: II - deixar o filho em
abandono”.
Na doutrina, a lição de Paulo Nader (Curso de Direito Civil – Família;
vol. 5º; Ed. Forense): “Há formas diversas de abandono: o físico, em que
o genitor se desfaz do filho; o assistencial, quando deixa de prover as
necessidades de sustento e saúde; o intelectual, ao não encaminhá-lo à
escola; o moral, quando não proporciona atenção, carinho ao filho,
desconsiderando o vínculo no plano da afetividade”... (sublinhei).
A esse respeito, já se manifestou esta Corte:
ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE. DESTITUIÇÃO DO PODER FAMILIAR.
ADOÇÃO. ABANDONO DE FILHO PELOS PAIS. INEXISTÊNCIA DE INDICATIVOS
FAVORÁVEIS À MANUTENÇÃO DO VÍNCULO E/OU EXERCÍCIO DE MATERNAGEM.
ABANDONO E DESINTERESSE PELA CRIANÇA. IMPOSSIBILIDADE DE CUMPRIR COM O
DISPOSTO NO ART. 22 DO ECA, INCUMBINDO AOS PAIS O DEVER DE SUSTENTO,
GUARDA E EDUCAÇÃO DOS FILHOS MENORES. AÇÃO PROCEDENTE, SENTENÇA
CONFIRMADA. APELAÇÃO DESPROVIDA. (Apelação Cível Nº 70038720355, Oitava
Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Luiz Ari Azambuja
Ramos, Julgado em 18/11/2010)
Os elementos probatórios carreados no feito dão conta de que a menor
está sob a guarda fática dos recorridos desde 2007, a qual lhes teria
sido alcançada pelos genitores da menina, pelo fato de que viviam em
condições precárias, não tendo condições de cria-lá. O casal possui oito
filhos, sendo que o Conselho Tutelar tirou a guarda de quase todos,
devido às condições ínfimas em que eram criados, pois os pais tinham
problemas com álcool e estavam residindo em condições precárias. A
menina R. não foi levada, de modo que os apelados pediram para ficar com
ela e os pais concordaram. Desde então, não mostraram nenhum interesse
em retomar a guarda fática, a genitora nunca a visitou, e o pai, com
pouca freqüência, faz visitas rápidas. Mostram-se totalmente ausentes na
vida da filha, não possuindo nenhum vinculo – seja afetivo, moral,
intelectual, financeiro- com a menor.
Ademais disso, o laudo social constante dos autos (fls. 26/28), opinou
pelo deferimento da adoção em prol dos recorridos, que consideram a
menina como filha e vem dando-lhe atendimento necessário para a
satisfação de suas necessidades de afeto e segurança.
Ainda, conforme consignou a magistrada sentenciante:
Os estudos sociais afirmaram que os requerentes são afetivamente
responsáveis pelas necessidades cotidianas da criança (Raíssa) e de que
existe efetivos vínculos afetivos entre eles e que Raíssa considera os
guardiões como seus pais.
Da prova oral produzida merecem especial destaque os depoimentos das
testemunhas Maria Margarete Santos Jesus, Iolanda Fagundes da Silva e
Elen Carolina de Lima.
Maria Margarete afirmou que Raíssa passou a morar com os autores quando
tinha 3 ou 4 anos de idade, tendo sido criada com muito amor, como se
fosse filha dos autores, que os trata como pais e que não tem
conhecimento de nenhuma visita de Oli e Lourdes à filha neste período de
tempo.
Iolanda aduziu que Raíssa mora com os autores a 6 ou 7 anos de idade,
que os pais não cuidavam dela, sendo que ficava pela rua, que existe um
tratamento de filha e pais entre os autores e Raíssa, sendo cuidada
muito bem pelos autores, que a requerida nunca visitou a filha na casa
dos autores, enquanto o requerido às vezes passa para ver a filha e que a
condição de vida dos requeridos era péssima.
Elen, por sua vez, informou que Raíssa mora com os autores desde seus
dois anos, tendo sido deixada com os autores pelos requeridos, dizendo
ainda que Raíssa trata os autores como pai e mãe.
Os autores, em seus depoimentos pessoais, acrescentaram que o Conselho
Tutelar retirou todos os filhos dos requeridos (que eram em torno de 8,
segundo a fala da autora), tendo a autora pedido para ficar com Raíssa,
estando cuidando dela durante os últimos sete anos, sendo ela tratada
como filha pelos autores e como irmã pelos 12 filhos do casal e que
Raíssa é visitada de forma muito rara apenas pelo requerido Rubens; que
os requeridos não possuem a guarda de nenhum de seus filhos (6 ou 7 de
acordo com a fala do autor), que o requerido não possui condições de
trabalhar, pois sofreu problemas em uma das mãos, mas não se encontra
aposentado.
Ambos os autores destacam em seus depoimentos a intenção de adotarem
Raíssa, apesar de terem optado, de forma expressa, em não formular tal
pedido nas petições apresentadas em juízo, nas quais afirmam pretender
postular a adoção somente após julgada a presente ação, tendo optado por
requererem a tutela da infante (veja-se a respeito argumentação
apresentada a fls. 05/06; 52/53 e na emenda de fls. 104/107, na qual
falam em “futura ação de adoção”).
Portanto, há elementos seguros para manter a sentença proferida pelo
juízo a quo, que destituiu o apelante do poder familiar sobre a menor.
Os apelados dispensam à menina afeto, proteção e todos os cuidados
necessários ao seu pleno e adequado desenvolvimento há mais de sete
anos, sendo esta, definitivamente, a família que ela encontra amparo,
conforto, educação e amor.
Ante o exposto, nego provimento ao apelo.
Des. Sérgio Fernando de Vasconcellos Chaves (REVISOR) - De acordo com o (a) Relator (a).
Des.ª Liselena Schifino Robles Ribeiro - De acordo com o (a) Relator (a).
DES. JORGE LUÍS DALL'AGNOL - Presidente - Apelação Cível nº 70061178067, Comarca de Cruz Alta:"NEGARAM PROVIMENTO. UNÂNIME."
Julgador (a) de 1º Grau: RICARDO LUIZ DA COSTA TJADER
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