domingo, 11 de novembro de 2012

COM A GUARDA PROVISÓRIA DE MENINO, FAMÍLIA VIVE DILEMA APÓS AGRESSÕES



1.11.2012
Paula Maciulevicius

O carinho perdeu espaço para o medo e o receio de que algo muito ruim aconteça e agora uma família pensa na ideia de entregar o filho adotivo à Justiça, depois de oito anos de criação. A decisão ainda não é a final, mas está entre as possibilidades de quem diz ter dado muito amor e recebido, de volta, agressões à mãe, uma senhora de 73 anos. Foram três episódios até o último sábado.
“Ela vai ficando mais fraca e ele mais forte. A gente fica preocupado e quer devolver antes que o pior aconteça”. O desabafo é da filha da senhora que tem há quatro anos a guarda do menino que cria desde 1 ano. Hoje a criança está com 10 anos e os pais adotivos, 73 e 77 anos.
O menino vive com a família na região de Sidrolândia. Em três anos foram três agressões, ocorridas, segundo relatos da família, quando o filho ouve um ‘não’.
A primeira agressão, diz a família, foi há três anos, quando no momento em que a mãe pedia que o menino desligasse a televisão e fosse tomar banho, ele chutou o pé, acertando e lesionando o dedo mindinho.
Em seguida, num intervalo de três meses, ele mordeu o braço da mãe, também depois de desobedecer a ordens do cotidiano de uma família com filhos pequenos. A terceira foi mais grave. No último sábado, ele derrubou a mãe já idosa no chão e ainda chutou. O resultado foi o raio-x apontando uma luxação no braço. No coração, ficou a dor maior de se ver apanhando do próprio filho.
À primeira vista o caso parece de desprezo. De quem quer dar o filho como troca uma mercadoria. Mas quem vê de perto, enxerga uma família desesperada por ajuda, por qualquer ajuda. A filha reconhece “ele é muito carismático, muito querido, mas não pode contrariar. Com os dois é mais complicado, ele não respeita meu pai e nem a minha mãe”, descreve.
Depois das agressões, a sequência a seguir é de desculpas. “Ele pede perdão diz que está arrependido e depois fica amuado”. No segundo episódio, há três anos, o menino chegou a fazer acompanhamento psicológico.
A criança veio parar na família depois que um dos sete filhos biológicos do casal, todos já adultos, pegou o menino que vivia sem o mínimo cuidado e entregou aos pais. O menino é o terceiro que o casal cria. Em nenhum dos casos, o processo de adoção chegou a ser feito. Os dois primeiros filhos criados ficaram com o casal por 10 anos e três anos. Até que as respectivas famílias biológicas voltassem a ter condições de criá-los.
“Era só ela e o meu pai e eles sempre tiveram vontade de criar”, completa a filha.
Os filhos do casal procuraram o Conselho Tutelar na segunda-feira desta semana. “A gente quer ver o que pode ser feito. Nem eu sei. Vamos nos reunir entre os filhos e ver. Nós queremos um parecer do Conselho, da Justiça, de como eles podem interferir e ajudar no que tiver de ser feito”, explica.
A família sustenta que se tentar conversar, o repertório de pedir desculpas pode acontecer outras vezes.
A interrogação que fica na cabeça de quem tenta assimilar a história toda é: e se fosse um filho biológico? Não que seja aceitável a possibilidade de devolver um filho adotivo, tanto pelo lado humano quanto judicialmente falando, mas o equívoco de acreditar que a adoção é reversível leva a família a não ver outra possibilidade?
Ela responde: “A gente não sabe o que se passa na cabeça dele, dentro dele, o que ele carrega de DNA. Não sei... A gente vê tanta fatalidade, você vê filho biológico e filho adotivo matando. É um ponto de interrogação que fica na cabeça”.
A filha diz que o assunto para a mãe ainda não está definido. “Uma hora ela quer entregar, mas depois ela quer dar mais uma chance. Pegar um psicólogo, mas eu acho que vai se repetir”.
No Conselho Tutelar, a confirmação é de que eles foram acionados nesta semana e que o caso foi encaminhado ao Creas (Centro de Referência Especializado de Assistência Social), órgão do Governo Federal que atende famílias em situação de ameaça, violação de direitos, violência física e psicológica.
Conselheiros conversaram com a senhora que tem a guarda do menino e uma das filhas. Conforme o conselheiro tutelar Adenilson Assunção, esta foi a primeira vez que o Conselho foi acionado. “Nós fizemos o primeiro atendimento e repassamos ao Creas, para um parecer psicosocial, para então tomar outras medidas”, explica.
Ao Conselho cabe o encaminhamento para análise aos órgãos específicos.
Na Justiça, a lei é clara e diz que a adoção é irreversível e irrevogável. No entanto, como se trata de um caso de guarda provisória, que a família tem há quatro anos, pode ser modificada a qualquer momento.
“Quando um filho chega nessa situação é porque foi criado sem limites e vai sofrer as consequências disso. Mas assim como a Justiça não aceita que os pais venham devolver os filhos biológicos, a gente também não aceita que pais devolvam crianças que foram adotadas. Ninguém devolve filho”, diz a juíza da Vara da Infância e Juventude Katy Braun.
Num caso como este, de guarda provisória, a juíza fala que o casal tem a responsabilidade de criar e educar a criança, mas não a assumiram como filho. “É uma modalidade diferente em colocação à família substituta. A adoção rompe veículos com família biológica, mas na guarda, se mantém o poder familiar dos pais biológicos”.
Pela legislação, segundo explicou a magistrada, a Justiça delega uma terceira pessoa que não são os pais, o direito de educar e criar a criança. No caso de reverter a guarda, é preciso que a família entregue para a mesma pessoa que concedeu.
“Eles tem que ver de quem receberam a criança. Eles vão procurar por quem deu a guarda”.
Do outro lado, o desabafo familiar. “Eu tenho medo quando vejo casos... Eu fico preocupada. Não sei o que se passa na cabeça da criança adotada. Talvez um vazio que eu não posso preencher, o meu pai e minha mãe também não”.
Mãe adotiva da criança não aguenta mais as agressões.
http://www.campograndenews.com.br/cidades/capital/com-a-guarda-provisoria-de-menino-familia-vive-dilema-apos-agressoes

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