24.07.2014
MARIA CRISTINA CASTILHO DE ANDRADE é professora e cronista
Impregnou-me a leitura do livro “Philomena – Uma mãe, seu filho e uma busca que durou cinquenta anos”. História real, contada pelo jornalista britânico Martin Sixmith, que inspirou o filme de Stephen Frears.
Philomena, como muitas mães solteiras que viviam na Irlanda dos anos de 1950, foi obrigada a assinar um documento em que prometia nunca mais ver o filho. Adotado por uma família dos Estados Unidos, Michael se tornou um advogado de sucesso e um dos nomes mais proeminentes do Partido Republicano nas administrações de Regan e Bush.
A obra retrata de maneira fiel as entranhas do ser humano e pode ser analisada por vários enfoques: a dor das mãezinhas ao ver os filhos arrancados de seu convívio, o preconceito que destrói, a postura dos pais adotivos... Detenho-me em Michael.
A adoção se deu aos três anos e ele carregou a saudade da mãe e o desejo de esclarecer as razões que a impediram de criá-lo. Saudade do “paraíso perdido”, no qual seu coração batia em sintonia com o coração materno e os braços que o carregavam continham um calor diferente. Ao adentrar um mundo novo, do início de seus dias ficou somente uma silhueta, a qual ele buscou, sem sucesso, com o propósito de decifrar os enigmas que o torturavam.
Diante da alternativa de ser abandonado pela mãe, por iniciativa dela, concluiu, embora buscasse outras razões, que a atitude fora motivada por ele ser mau. Isso calou tão fortemente que se considerava indigno da felicidade. Quando algo lhe dava paz, destruía “em nome de sua maldade”, que fizera com que a família biológica o rejeitasse. O sucesso profissional, com possibilidades, compensações, relacionamentos, não conseguiu diluir os coágulos que brotavam de seus vazios. Viu-se, sempre, como um intruso no mundo, bem no estilo da poetisa portuguesa Florbela Espanca em seu poema “Eu”: “Eu sou a que no mundo anda perdida, / Eu sou a que na vida não tem norte. (...) Sou a crucificada... a dolorida”.
Quantas pessoas, com quem convivemos, autodestrutivas, com raiva autoimposta, com comportamentos ilógicos, que questionamos e crucificamos em nossos julgamentos, agem dessa ou daquela forma pela falta de fé em si mesmas.
A compreensão do Salmo 138, 13: “Fostes Vós que plasmastes as entranhas de meu corpo, Vós me tecestes no seio de minha mãe”, com certeza as preencheria na certeza da origem em um Amor maior.
http://www.jj.com.br/colunistas-239-vazios-que-escorrem
-
Nenhum comentário:
Postar um comentário