Ele dormia na cama da mãe adotiva, a aposentada Edna Passos de Oliveira, de 49 anos.
Mas na noite daquela quarta-feira, com o garoto prestes a completar cinco anos de idade, uma viatura policial, um carro do Conselho Tutelar e um oficial de Justiça, chegaram e, afirmando cumprirem decisão da Justiça, pegaram o garoto e o levaram para morar com a mãe biológica, que, por ser usuária e dependente de crack, entregou o bebê, logo que nasceu para essa família.
Edna Passos recebeu o Plox em sua casa. Emocionada, mostrou a cama, os brinquedos e o quarto do garoto. “A cama é dele, mas ele dormia mesmo era na minha, do meu lado”, explicou.
Ela contou ainda que quando pegou o bebê, agora com quatro anos de idade, ela já tomava conta dos dois irmãos dele. Um deles completou oito anos e o outro, sete. Eles perambulavam sozinhos pelas ruas de Coronel Fabriciano.
A filha de Dona Edna confirma a versão. “Minha mãe já havia adotado os dois irmãozinhos dele e quando a mulher ficou grávida de novo disse que não queria a criança. Na época, o promotor e o Conselho Tutelar combinaram com minha mãe para ela pegar o bebê também para que os irmãos vivessem juntos. Agora levaram ele. Minha mãe está muito deprimida e todos nós estamos sofrendo muito com tudo isso”, afirmou Aline Passos de Oliveira, irmã adotiva do garoto.
A família ainda conta que a mãe biológica fez o parto no Hospital Vital Brazil e afirmou que era melhor que Edna o adotasse, pois ela estava disposta a deixar o bebê no Hospital ou jogá-lo no rio. Segundo relatos obtidos pelo Plox, a mulher usava muita droga e estava em estágio crítico de seu vício em crack. Edna aceitou a criança e teve permissão concedida pela promotora Deise Poubel Lopes, que acompanhou o caso até que ela obtivesse a “guarda definitiva” do garoto.
Ele foi levado logo que nasceu para a casa da Dona Edna. Hoje está com outra aparência e prestes a completar cinco anos
A mãe adotiva, desesperada, mostra o documento expedido pela Justiça, que, segundo ela, a fez acreditar que o menino estaria seguro sob seus cuidados.
A reportagem do Plox fez um longo percurso para entender este caso. Estivemos no Fórum de Coronel Fabriciano, de onde partiu a ordem judicial para que o menino fosse retirado do convívio de seus dois irmãos e também daquela que cuidou dele desde o nascimento e de demais pessoas que, mesmo sem terem laços de sangue, criaram profundos laços emocionais. No Forúm ninguém quis falar sobre caso, alegando que o processo corre em segredo de Justiça. Também não conseguimos falar com a mãe biológica do garoto.
Por telefone conversamos com a presidente do Conselho Tutelar de Coronel Fabriciano, Kátia Regina Mantovani. Ela explicou que uma conselheira tutelar acompanhou o oficial de Justiça e a Polícia Militar em cumprimento a uma ordem judicial. Curiosamente a conselheira que estava no plantão daquela noite tem o mesmo nome da mãe adotiva, Edna.
A família adotiva do garoto conta que conseguiu ajuda para que a mãe biológica fosse internada em um Centro de Reabilitação e foram várias as tentativas de recuperação, mas ela sempre acabava fugindo ou deixando voluntariamente as clínicas por onde passou e retornava ao vício de entorpecentes.
A família conta que a genitora, por algumas vezes, chegou a ir até a residência deles, pedindo comida e roupas. Segundo eles, a mulher nunca manifestou desejo de reaver nenhum dos três filhos deixados com a família Passos.
Família filma desespero da criança ao ser retirada da casa
A família conta os momentos passados na noite de 9 de abril. O menino estava dentro de sua residência quando as viaturas chegaram. Em nome do Conselho Tutelar, estavam, de acordo com as testemunhas, as conselheiras Edna e Kátia, acompanhadas de um oficial de Justiça que trazia um mandado do busca e apreensão para o menor.
Apavorados e sem maiores explicações, receberam ordens para que fossem abertos os portões sob a alegação de que estavam ali por força de uma ordem emitida pela juíza Lúcia Regina que teria decidido devolver a criança de imediato para a mãe biológica.
Ainda segundo a família de Dona Edna, a mãe biológica alega que não é mais usuária de drogas e que está prestes a dar a luz novamente e já tendo sob seus cuidados mais uma filha, de dois anos de idade, deu entrada no processo para pegar o filho de volta há cerca de dois anos e meio.
Recebimento de pensão pode ser o motivo da retirada do garoto
A mãe adotiva se mostra abatida com a retirada do menino de seu convívio. Segundo ela, o interesse em receber uma pensão e um erro no processo causaram essa polêmica. Segundo a mãe adotiva, os três filhos da usuária que ela adotou tem pais diferentes. Um deles recebe mensalmente uma pensão, pois o pai faleceu. “Ela entrou na Justiça pedindo a guarda do menino que tem direito a pensão do pai, que morreu. Mas aí houve uma confusão e a Justiça acabou levando o menorzinho, que nem ela sabe quem é o pai. Se ela quiser a gente dá o dinheiro da pensão para ela. O que queremos é cuidar dos meninos, pois ela nunca conseguiu cuidar nem dela mesma”, afirmou.
Uma das irmãs adotivas do menino conseguiu gravar pelo celular algumas cenas dos momentos de aflição e desespero que viveram. Em certo momento, o vídeo mostra a criança que, receosa, se escondeu debaixo da cama da mãe (adotiva). Uma das irmãs (adotiva) tenta convencê-lo a sair debaixo da cama. Ele só aceita sair debaixo da cama, quando lhe é dito que se não sair sua mãe (adotiva) seria presa pela Polícia.
Ele sai de debaixo cama e se abraça a sua mãe (adotiva). Em seguida, em meio ao choro dele e da família que fica, é levado pelas mãos, por uma representante do Conselho Tutelar, para fora da casa e colocado na viatura da instituição.
Dona Edna conta que foi este o momento de maior tensão. O momento de retirá-lo. Ela diz que foi levada para outro cômodo da casa e que sequer teve oportunidade de se despedir do “filho” que criava já há quase cinco anos.
“Ele foi levado chorando muito. Tentou se agarrar no beiral da porta da sala, chamando por mim, pedindo para que a gente o ajudasse, mas sua força foi contida pelo policial que cumpriu a missão”. É com estas palavras que a irmã (adotiva) do garoto descreve a última imagem que viu, antes dele ser colocado, aos gritos, com a roupa do corpo, dentro da viatura.
“Uma prova de que ele está vivendo uma situação traumática é que logo após minha mãe passar mal e eu estava com ela no posto de saúde, o celular dela tocou e eu atendi. Era a conselheira tutelar ligando e pedindo que minha mãe atendesse ao telefone e falasse com meu irmãozinho, pois ele ficou desesperado quando foi entregue para a outra mãe dele”, disse Aline.
Durante nossa estada na residência da família eram muitas as pessoas que se manifestavam em favor de Dona Edna e contra a decisão da Justiça. O que eles mais reclamaram foi da forma como foi feita a retirada da criança. Segundo contam, nem a família e muito menos a criança tiveram preparo psicológico ou qualquer assistência ou prévio aviso de que o corte familiar aconteceria desta forma e naquele dia.
Uma pessoa ligada à família procurou por nossa reportagem alegando que no dia 11 de abril, ou seja, dois dias após o menino ter sido devolvido para a mãe biológica, ele teria sido visto sozinho, sentado próximo a um campo de futebol, calado e abatido. Ele ainda vestia a mesma bermuda que usava no dia em que foi levado.
O menino foi levado com a roupa do corpo. A mãe adotiva mostrou para a reportagem uma das gavetas de roupas dele e alguns brinquedos que também ficaram para trás
Ainda foi dito para a nossa reportagem que a mãe biológica seria uma pessoa estranha para ele. Eles estariam morando em um bairro na periferia de Coronel Fabriciano. “E agora ele está num local que todo mundo sabe que é cercado de traficantes. Que tipo de vida ele está tendo lá?”, indagou a testemunha.
A reportagem tentou agendar uma entrevista com a presidente do Conselho Tutelar para saber se a criança está sendo amparada. Após algumas tentativas, fomos informados por outra atendente que Kátia Regina Mantovani estaria em um atendimento externo e que ela havia deixado o recado de que se manifestaria posteriormente e que ainda decidirá se marcará uma entrevista coletiva de imprensa para se pronunciar sobre o caso.
A conselheira Simone, que recebeu nossa reportagem, não soube dizer se a criança está sendo assistida por alguma instituição de amparo. Também não soube dizer se há pedido da Justiça nesse sentido. Ela disse que geralmente, em casos assim, o juiz determina o acompanhamento dos envolvidos, mas neste caso ela não tem informações precisas, se limitando apenas em dizer que a única pessoa que poderia ter tais informações seria a presidente do Conselho.
Estivemos no Fórum Orlando Milanez, no centro da cidade, onde, em conversa com a promotora de Justiça da Infância e Juventude da Comarca de Fabriciano, Deise Poubel Lopes, ouvimos que o processo corre em segredo de Justiça e que nada teria a declarar. Fomos orientados a procurar pela juíza que deferiu a decisão, Lucia Regina Vertuan Freschi Landgraf.
Ainda no Fórum fomos informados que juíza estaria de férias e que seu substituto seria o juíz Vitor Luíz, que prontamente nos atendeu. Ele nos disse que está a par da situação, mas foi uma decisão tomada pela colega e que o processo corre em segredo de Justiça, resguardando assim a integridade da criança e que nada teria a declarar sobre o fato.
A família Passos diz que já contratou um advogado para recorrer da decisão.
http://www.plox.com.br/caderno/aconteceu/mulher-adota-bebe-e-justica-retira-dela-cinco-anos-depois
Nenhum comentário:
Postar um comentário