domingo, 16 de março de 2014

TJES VAI ABRIR PROCESSO ADMINISTRATIVO CONTRA JUÍZA DA VARA DA INFÂNCIA DA SERRA


Corregedoria vai apurar a conduta da juíza Gladys Pinheiro, porém, os trabalhos de correição não vislumbraram a ocorrência de fraudes em adoções.
Nerter Samora
04/03/2014
A Corregedoria do Tribunal de Justiça do Estado (TJES) vai abrir um procedimento administrativo contra a juíza da 1ª Vara da Infância e Juventude da Serra, Gladys Henriques Pinheiro, por supostas irregularidades na condução da Vara. A decisão foi tomada após uma correição extraordinária realizada na unidade em outubro do ano passado. No relatório final, a equipe de fiscalização apontou problemas nos registros de crianças em abrigos e no cadastro de pessoas habilitadas para adoção, porém, as denúncias de eventuais fraudes nos processos e abusos sexuais não foram confirmadas.
Em decisão comunicada no último dia 18, o tribunal confirmou a aprovação do relatório de correição pelo Conselho da Magistratura do TJES, em sessão realizada no dia 13 de janeiro. O documento com 24 páginas registra problemas de infraestrutura da Vara, que funciona em uma casa residencial com dois pavimentos no bairro de Residencial Laranjeiras. A equipe da Corregedoria apontou que o prédio tem uma estrutura física inadequada para atender os trabalhos da unidade, sendo constatada a presença de roedores e de constantes “quedas” de energia no verão, conforme relatos de serventuários.
Além do exame de infraestrutura da unidade, a fiscalização também mirou as denúncias de supostas irregularidades em processos de adoção de crianças e até relatos de abusos sexuais sofridos por menores adotados por meio do programa de acolhimento afetivo. Embora os casos tenham sido expostos durante a audiência pública, que abriu os trabalhos de correição na Vara, a equipe da Corregedoria não vislumbrou a existência de maus tratos e abusos sexuais contra as crianças adotadas.
Segundo o relatório, a confirmação ou não dos crimes noticiados “carecem de aprofundamento das investigações por parte da Polícia Civil ou do próprio Ministério Público”, uma vez que o órgão de fiscalização não tem atribuição de instaurar processo penal. “A Corregedoria Geral de Justiça limita-se a apurar falhas administrativas ou desídias (desleixos) de magistrados e servidores do Poder Judiciário estadual”, afirma o então corregedor-geral, desembargador Carlos Henrique Rios do Amaral, que encaminhou uma cópia do documento para as autoridades competentes na investigação dos eventuais crimes.
Durante os trabalhos de correição, a equipe da Corregedoria visitou as casas de acolhimento de menores no município após o encaminhamento de denúncias contra as entidades. Entretanto, o relatório concluiu que algumas das denúncias se referem a decisões da juíza, que não podem ser reapreciadas pelo órgão de fiscalização. O corregedor-geral destaca que alguns processos estão em fase de recurso ou dependem ainda de julgamento de mérito. O desembargador Rios do Amaral indicou, no entanto, a existência de “indícios da prática de irregularidades administrativas noticiadas em parte das denúncias”.
Entre os casos apontados com problemas está o afastamento de familiar de duas irmãs, cuja guarda foi cedida para um tio após o cumprimento de uma medida protetiva de busca e apreensão. As crianças acabaram sendo encaminhadas para outra família, do município de Aracruz, sem o conhecimento do juízo. Na avaliação da equipe de correição, “se ocorreu erro ou irregularidade foi por parte do irmão da reclamante [mãe das crianças] que entregou as sobrinhas, sem ordem judicial, a terceiros”.
Foram citados outros dois casos semelhantes, onde a responsabilidade da adoção – fora dos padrões – não foi atribuída à magistrada, que teria agido na preservação dos interesses dos menores. Entre os casos, o relatório mencionou um episódio onde um bebê recém-nascido foi retirado da mãe logo após o parto, dentro do processo legal conhecido como destituição do poder familiar, sob alegação de que ela não teria condições de ficar com a criança por ter sido expulsa de casa. Ele acabou sendo entregue para uma família substituta. No entanto, à época da entrega da criança, o cadastro de habilitação para adoção da família substituta estava vencido, fato que impediu a conclusão do processo.
Neste item, o relatório final da correição indica sérios problemas com o controle de cadastros de habilitação de casais para adoção e também no registro de crianças acolhidas em abrigos. A equipe de fiscalização observou a falta de uniformidade na fixação dos prazos de validade, que variavam de um a três anos, o que contraria as normas da Corregedoria. “Restou evidenciado que em parte dos processos das classes guarda/adoção não se providenciava a juntada de formulários com as informações das pessoas habilitadas que se encontravam na vez (ordem), mas que supostamente, por algum motivo do contato para confirmar o interesse da criança, não apresentavam condições para adotar”, concluiu o desembargador.
O documento relata que a equipe de fiscalização encontrou “um grande número de crianças e adolescentes nas instituições (casas de acolhimento) sem a documentação de encaminhamento (guias de acolhimento)”. Dos 94 menores cadastrados no sistema (Cadastro Nacional de Crianças Acolhidas), 34 já não se encontravam nas instituições por vários motivos, como a evasão, transferência, reintegração familiar ou adoção. Também foi constatada a existência de cadastros incorretos ou desatualizados, o que levou o órgão de correição a pedir a abertura de sindicância contra duas servidoras da 1ª Vara da Infância e Juventude da Serra.
A equipe de correição também vislumbrou um grande volume de processo de guarda e adoções por meio do programa de apadrinhamento afetivo, quando se alega o vínculo de afinidade e afetividade entre a criança e a nova família como fundamento para não se observar o Cadastro Nacional de Adoção. Para o desembargador, a maioria das reclamações convergia em apontar a destinação de crianças para as denominadas adoções prontas, com a burla dos sistemas de garantia e de controle.
“A existência dessas ações (adoção pronta) em grande volume, por si só, não representa indícios de irregularidades. Porém, somadas às omissões mencionadas (ausência ou demora nas expedições das guias de acolhimento, demora em lançar os nomes dos pretendentes já habilitados à adoção nos cadastros, fixação variável do prazo de validade do certificado de adoção, inexistência de comunicação das denominadas adoções prontas à Corregedoria) geraram no seio dos jurisdicionados desconfianças em relação à Vara”, ponderou.
Rios do Amaral afirmou que os casos de três menores “colocaram em tensão a magistrada e os técnicos da Vara porque pessoas não cadastradas nos programas de apadrinhamento afetivo, aproveitando-se das falhas e omissões relatadas, tiveram contatos com as crianças, levando-as das instituições de acolhimento para as suas residências e de boa-fé ou na esperteza (má-fé) enxergaram a oportunidade de buscarem a adoção pronta, sem que tivessem a habilitação exigida e na ordem do cadastro”.
O relatório final traz ainda boas práticas na Vara, como a criação da “Campanha de Incentivo à Adoção Tardia”, que é realizada anualmente com o objetivo de incentivar a adoção de crianças acima de três anos. Segundo o texto, as estatísticas demonstram que a campanha elevou o número de adoções tardias. Outra iniciativa que foi destacada foi a implantação do projeto “Depoimento Especial” de crianças e adolescentes, com o objetivo de ouvir de forma diferenciada as vítimas de violência. O método teria reduzido o “sofrimento ao ter que relembrar o que vivenciaram”.
http://seculodiario.com.br/15674/9/tjes-vai-abrir-processo-administrativo-contra-juiza-da-vara-da-infancia-da-serra-1

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