Siro Darlan,
desembargador do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro e Membro da Associação
Juízes para a Democracia.
Toda
criança tem direito a uma família e a conhecer suas origens no momento de seu
nascimento. Essa é uma regra máxima escrita no artigo 7º da Convenção das
Nações Unidas sobre os Direitos da Criança. Hoje se tem oficialmente cerca de cinco
mil crianças inscritas no Cadastro Nacional do CNJ, disponíveis para adoção, e,
em contrapartida cerca de 30 mil pessoas ou casais habilitados para adota-las.
O que impede essa conta de fechar? Primeiro o preconceito dos adotantes que
elegem crianças ideais como se estivessem numa feira de bonecas. Depois pela
ineficiência e inabilidade dos juízes e promotores que trabalham nessa área
como operários que examinam a qualidade dos produtos.
A
relação interpessoal exige regras menos rígidas e maior emoção nas relações
entre pessoas. Não há nenhuma fila de noivos e de noivas, salvo nos programas
de auditório que brincam com os sentimentos das pessoas e na internet que
aposta nas aventuras entre desconhecidos. O encontro de pessoas que se amam não
se dá apenas na troca de nomes em cadastros que correm paralelos sem se
cruzarem.
É
por isso que pessoas que se encontram afetivamente não podem ser separadas por
decisões judiciais frias e sem emoção. O texto legal que impede que uma pessoa
ao encontrar uma criança abandonada, salvando-lhe a vida, se habilite para
adotá-la, por mais que tenha em conta o respeito a um critério de já
habilitados foge da regra do critério do maior afeto e melhor interesse da
criança.
A
falta de critério dos Tribunais na escolha de juízes sensíveis e vocacionados é
outro fator prejudicial ao interesse superior da criança. Uma juíza que traz no
seu DNA uma situação de abandono familiar não poderia nunca ser juíza da
infância porque seu procedimento será sempre o de retardar e prejudicar os
processos de adoção. Um juiz que coloque seu interesse de vaidade pessoal de
ocupar esse cargo será um fracasso na missão de aproximar as pessoas certas.
Talvez
essas sejam algumas das razões que permitem que crianças se eternizem nas
entidades de acolhimento, inadequadas porque causam estresse intenso as pessoas
em processo de desenvolvimento e consequências gravíssimas na saúde mental e
social desse ser em formação.
De
que adianta investir numa família biológica que não tem capacidade de amar o
ser que gerou, se há tantas capazes de dar esse amor? O afeto não se adquire de
forma consanguínea. Aliás, há muitos filhos biológicos que nunca foram amados
por seus pais e esse fato demonstra-se através dos comportamentos agressivos de
uns e de outros. Em contrapartida, quantos casos de encontros afetivos exitosos
se dão através das adoções?
Se
a família biológica mostra-se indigna de ter em sua companhia amando e
respeitando os filhos gerados, não há que se insistir em nome de critérios
econômicos ou sociais. Com tantas pessoas habilitadas, a situação jurídica
dessa criança tem que ser solucionada de forma definitiva com brevidade.
Milhares de crianças permanecem em situação de abandono por anos sem fim,
aprisionadas em razão dessa insegurança jurídica gerada pela incapacidade dos
magistrados de decidirem em favor do melhor interesse das crianças.
A
devolução das crianças quando já em processo de guarda com famílias adotivas
são capazes de gerar danos psicológicos e irreparáveis, aumentando a
intensidade da insegurança.
O
caso da menina Duda, com decisão judicial mandando devolvê-la à família
biológica após longo período de abandono e maus tratos e de um exitoso período
de guarda provisória com uma família habilitada para adoção emoldura essa falta
de sensibilidade que precisa ser corrigida urgentemente sob pena de continuar
causando sérios danos á formação de crianças abandonadas, já tão martirizadas
pela falta de afeto.
Nenhum comentário:
Postar um comentário