Quinta-feira, 10 de abril de 2014
Adotar é acolher uma criança que se integra na rotina de um novo lar. Segundo o site Conteúdo Jurídico, “a adoção introduziu-se no Brasil a partir das Ordenações Filipinas e a primeira lei a tratar do assunto de forma não ordenada foi promulgada em 22 de setembro de 1828 com características do direito português, originário do direito romano. Nesse período, cabia aos juízes de primeira instância o dever de confirmar o ânimo dos interessados em audiência, onde havia a expedição da carta de perfilhamento.” Nos dias de hoje, a prática de adoção tornou-se mais comum. Em enquete feita pela reportagem com 50 pessoas em Divinópolis, 76% dos entrevistados afirmam que adotariam uma criança.
O processo atualmente no Brasil é diferente, de acordo com o CNA (Cadastro Nacional de Adoção). Para adotar uma criança o interessado deve procurar a Vara da Infância e da Juventude do seu município e saber os documentos necessários. Em seguida, inicia-se um processo de preparação do adotante. Em Divinópolis esse curso conta com psicólogas e assistente social e acontece semanalmente, às segundas-feiras, das 19 às 22h. O curso ocorre, geralmente, duas vezes ao ano.
Segundo Regiane Borba Amaral, psicóloga do Serviço Psicossocial da Vara da Infância e da Juventude do Fórum de Divinópolis, hoje existem “80 crianças abrigadas no total. Porém, só 20 dessas crianças estão disponíveis para serem adotadas”.
O processo de adoção, no entanto, não termina quando a criança vai morar em um novo lar. A assistente social Alexandra Berté Parreiras disse que não tem um tempo estabelecido, mas as visitas podem continuar. “Após a adoção não existe tempo determinado, mas por pelo menos dois anos a família é acompanhada pelo setor psicossocial do TJ (Tribunal de Justiça). Eles visitam sua casa, quando possível escutam as crianças e emitem relatórios que são anexados aos processos”, explica.
ADOÇÃO INTER-RACIAL
O que a maioria das pessoas não sabe é que a fila de espera de pessoas querendo adotar é maior do que a de crianças institucionalizadas. O trabalho da psicóloga Regiane Amaral, funcionária do Tribunal de Justiça há seis anos, é direcionar o interessado para a criança a ser adotada. Quando o adotante procura pela adoção é feito um cadastro, onde ele irá traçar um perfil da criança. “Quando chegam para adotar querem bebês, da mesma cor de pele. Sempre vêm com a fantasia que vão encontrar um filho que seja a cara dos pais adotivos. O grande problema é que as pessoas que querem adotar já têm um perfil traçado, geralmente menina, menor de cinco anos”, explica.
Antigamente tinha-se mais preconceito quando o assunto era adoção, principalmente se o adotado não fosse parecido com os pais adotivos. Hoje é mais comum a adoção inter-racial (quando a cor da criança é diferente da dos pais). Em Divinópolis, mais da metade das crianças nos abrigos são negras ou pardas. “Hoje em dia os pais aceitam mais crianças negras, no nosso cadastro eu acho que quase 70% aceitam”, destaca a psicóloga.
A realidade mudou bastante. Se antes as pessoas tinham preconceito nesse tipo de adoção, hoje isso é bem menor. Segundo a enquete realizada pela reportagem, 100% das pessoas entrevistadas são a favor da adoção inter-racial.
Isaul Rodrigo Caetano Alves, estudante, 22 anos, foi adotado com 20 dias de vida. Seus pais biológicos eram muito novos e não tinham condições financeiras para criá-lo. Segundo Isaul, ele tem ótima relação com as duas famílias e seus pais adotivos não esconderam em momento algum sobre a adoção. “Minha relação é muito boa com as minhas duas famílias e hoje posso dizer que eu tenho o mesmo sentimento por parte de ambas. Eu já cresci sabendo que eu era filho adotivo”, conta.
Questionado se sofreu algum tipo de preconceito por ser negro e seu pai adotivo branco, o estudante descartou qualquer possibilidade: “Nunca sofri nenhum tipo de preconceito por parte da família e nem de qualquer outra pessoa. Pelo contrário, sempre fui muito bem tratado por parte da minha família”.
Sobre adoção inter-racial, Isaul deixa bem clara sua opinião. “Creio que a adoção é um processo em que a cor não interfere. Isso é coisa de quem tem a mente pequena, o amor de pais adotivos ou biológicos é igual. E a cor não interfere no sentimento que os pais terão pela criança”, exclama.
Alexandra Berté Parreiras, assistente social de 36 anos, casada, há dois anos também adotou duas meninas. A decisão de adotar as duas irmãs foi conjunta com o marido. Como assistente social, ela já conhecia os procedimentos. “Seguimos os passos formais da Justiça (curso preparatório e os outros procedimentos) e quando entramos no cadastro nacional fomos chamados para ‘conhecer duas irmãs’. Após o primeiro contato num abrigo, tomamos a decisão de querer continuar com a aproximação, que durou cerca de dois meses, encontrando toda semana, levando para passear e dormir na nossa casa. Depois disso, em 27/02/12 finalmente conseguimos o documento de guarda”, conta Alexandra.
O tempo de adoção foi rápido, pois o casal não exigia um perfil específico, o que geralmente ocorre. “Nosso perfil não era o mais comum dentre os postulantes, pois a maioria quer um só filho, menina, clara e até três anos. Nós queríamos grupo de irmãos, de qualquer cor, independente de deficiência, até 5 anos de idade. Isso facilitou muito, pois após o processo de preparo pela justiça, depois que entramos efetivamente no cadastro, em menos de 15 dias já fomos chamados”, explica.
Ao contrário de Alexandra, que estava flexível para adotar uma criança independente de idade, sexo, cor ou deficiência física, a realidade na maioria dos casos é outra. A psicóloga Regiane Borba diz que hoje não há nenhum cadastro que aceite criança com deficiência em Divinópolis. Até mesmo no Cadastro Nacional o número é pequeno. “Quando a criança é portadora de necessidade especial é mais difícil de encontrar, porque ela demanda mais tempo”, esclarece.
Em contrapartida, na enquete feita com 50 pessoas para esta reportagem, 66% delas adotariam uma criança com necessidade especial. Porém, mais da metade delas disse que só adotariam se tivessem condições financeiras boas e tempo disponível.
ADOÇÃO HOMOAFETIVA
Diferentemente do que a sociedade pensa, para adotar não é preciso ser casado e/ou heterossexual. “Quando os casais são homossexuais não tem diferença nenhuma, a única diferença é na certidão; na filiação serão dois pais ou duas mães”, explica a psicóloga Regiane Borba.
De acordo com Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), no Brasil existem mais de 60 mil casais homossexuais que vivem em uma união estável. O primeiro caso de adoção por casal homossexual no Brasil foi em 2006. Vasco Pedro da Gama e Júnior de Carvalho, juntos há quase 20 anos, adotaram Theodora, que passou quatro anos num orfanato, até que a juíza de Catanduva, interior de São Paulo, autorizou a adoção.
Fernanda (nome fictício), de 33 anos, mora com Sandra (nome fictício), de 30 anos em Divinópolis. As duas vivem juntas há mais de cinco e já tentaram métodos caseiros para engravidar. “Tinha vontade de conceber, mas é muito cara a inseminação artificial ‘in vitro’”, lamenta Fernanda. Ela já teve a oportunidade de adotar uma criança pelo “método mais fácil” e confessa que “já teve mães que me procuraram para dar seus filhos. Mas eu quero fazer tudo certinho, conforme a lei, e para isso tenho que entrar na fila”.
Embora esteja segura da sua decisão, ela teme que seu filho sofra preconceito devido a sua condição sexual, afinal quando assumiu sua homossexualidade sofreu muito. “Sofri muito, muito e muito. Principalmente pela família por parte da minha mãe. Já em relação com a família do meu pai o preconceito é mais velado”, afirma.
Marcos (nome fictício), de 37 anos, companheiro há 12 anos de João (nome fictício), de 47 anos, habitantes de Divinópolis, adotaram recentemente dois meninos. O sonho de Marcos de adotar uma criança existe há mais de dez anos. Ele estava aguardando apenas um bom momento profissional.
Inicialmente, a família de Marcos resistiu um pouco. Depois eles viram a importância dos dois meninos para o casal. O tempo de aproximação pode variar de dois a cinco meses, mas para Marcos e João, esse tempo foi rápido. “Teve um período de muita expectativa até conhecê-los. Houve uma ternura e afeto mútuo instantâneos. Neste caso, o amor foi crescendo cada vez mais com o tempo, mas foi completamente diferente daquilo que pensávamos, pois sentimos que este amor já vinha acontecendo até o primeiro momento. O período de aproximação, que duraria de três a cinco meses, durou trinta dias, porque houve uma afinidade rápida”, conta.
Após o cadastro, o casal poderá escolher de qual cidade adotará uma criança. Foi o que aconteceu com Marcos e João: “Fomos apresentados pelo Juizado da Infância e Juventude através do Setor Psicossocial do Fórum de Belo Horizonte”, conta Marcos.
De acordo com Regiane, os encontros entre os casais e os profissionais do Setor têm o intuito de despertar o desejo dos postulantes serem pais de alguém que não é semelhante a eles. Foi o que aconteceu com Marcos, que antes adotaria uma menina, ainda bebê. “Após o curso de capacitação para adoção abrimos nossos horizontes, e então nos vimos cheios de ânimo para adotar até duas crianças, independente do sexo ou raça, com idade máxima de cinco anos. No mais, diante desse perfil traçado, fomos chamados pelo psicossocial de Belo Horizonte”, relata Marcos. Os pais não escondem dos dois filhos que são adotados.
SER PAI/MÃE SOZINHO É POSSÍVEL?
A maioria das pessoas pensa que, sendo solteiro, não pode adotar e que a lei é diferente, o que não é verdade. As exigências são as mesmas e não há restrição alguma. “Em Divinópolis conheço dois casos. O primeiro é de uma mulher que adotou três meninas e de um homem que também adotou três. Os casos que mais me emocionam são esses dois, em especial pela mulher que adotou três meninas. O carinho e o cuidado que ela tem com as filhas é lindo. Arrisco a dizer que foram as adoções que mais deram certo”, diz a psicóloga Regiane Borba, emocionada.
Para as pessoas que querem adotar, Alexandra, assistente social e mãe, aconselha: “comecem pelo lugar certo, pela justiça. Não tentem nada por conta própria, por vias aparentemente mais fáceis. No transcorrer do processo elas podem se tornar difíceis”.
A dica de Marcos para que aqueles que têm certeza da adoção é iniciar os processos judiciais corretos (buscando o setor Psicossocial da sua cidade e um advogado) o quanto antes. E, para os casais homoafetivos, “é a oportunidade que temos de ser pais ou ‘pães’”, brinca. Para adotar não precisa ser rico, bonito ou famoso. Basta ter um coração aberto para acolher alguém que irá te amar, independente das aparências!
Reportagem produzida pelas alunas do curso de Jornalismo da Faculdade Pitágoras Divinópolis/MG:
Brunielly Keith, Carla Barboza e Izabela Fernandes (2º período)
Gráfico: Jezriel Francis (4º período Publicidade e Propaganda)
Edição e Supervisão: Professor Ricardo Nogueira (MG 11.295 JP)
http://www.g37.com.br/index.asp?c=padrao&modulo=conteudo&url=030533&ss=5
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