quarta-feira, 9 de abril de 2014

O PASSO A PASSO DO PROCESSO DE ADOÇÃO - Bloco 5


07.04.2014
Pensar em adoção é mais do que planejar a construção de uma família. Infelizmente, para muitos, trata-se também de um processo burocrático, que demanda tempo e paciência. O capítulo de hoje mostra o passo a passo de todo processo. São três fases que incluem: documentação, curso de preparação e entrevistas com psicólogo e assistente social. Este é o tema da Reportagem Especial desta semana. Confira agora o último capítulo, com Ginny Morais.
Diana Kinch é uma inglesa que viveu muitos anos no Brasil. E aqui construiu uma família.
“Adotei oito filhos. Quatro totalmente recém-nascidos, dois bem nenéns e dois um pouquinhos maiores.”
A primeira adoção foi em 1989 e daquele jeito que naquela época era bem normal: pegou o bebê diretamente de alguém que queria doar. Mas depois regularizou a situação. E daí em diante, fez tudo conforme a lei. Em suas adoções, Diana pegou regras velhas e novas, a partir de 2009. E avalia:
“As coisas demoram mesmo, mas dá para entender. Tenho bastante respeito pelo sistema. É chato, mas funciona muito bem, não deixa nada descoberto.”
É... Falar de adoção é falar da construção de uma família. ... Mas também é falar de um processo burocrático. A burocracia é necessária para garantir que a criança, já rejeitada, vá realmente para uma nova família que lhe tenha condições emocionais e econômicas de criá-la...
Se você tem intenção de adotar, preste atenção: a gente vai mostrar o passo-a-passo:
Primeiro, você precisa ter mais de 18 anos. Para dar entrada no processo, vá até um fórum de sua cidade, levando identidade e comprovante de residência. Outros documentos vão ser pedidos depois, como CPF, comprovante de renda, declaração médica de sanidade física e mental e certidões de antecedentes criminais. Você também vai precisar fazer um curso preparatório para adoção, que varia de estado para estado. Pode demorar um pouco para ser realizado, mas é fundamental, segundo o juiz responsável pelo Cadastro Nacional de Adoção, Gabriel Matos.
“Esse curso é para você se habilitar, é uma coisa muito importante para evitar o fracasso na adoção.”
Keka Werneck, candidata à adoção, já cumpriu essa obrigação.
“O curso busca desmistificar preconceitos, como, por exemplo, que filho adotivo pode ser diferente do seu filho biológico quanto a sentimentos, de que filho adotado dá mais problema... Eu tenho uma filha biológica e sei que filhos dão trabalho. Tem que ter escola, casa organizada, isso independente de o filho ser adotante. Você vai ter que ter trabalho, né? Não é fácil educar.”
ENTREVISTA
Depois do curso e dos documentos, é hora de uma das etapas mais importantes do processo de adoção: a entrevista. Psicólogo e assistente social da Vara da Infância vão conversar com o pretendente, para saber sobre a motivação para adotar, as expectativas...
Se passar pelas três fases, o candidato vai para cadastros de pessoas autorizadas a adotar. Existem listas locais, estaduais e, enfim, o Cadastro Nacional. A espera pelo filho varia, mas é menor quanto menos exigência o pretendente fizer quanto ao perfil da criança: menino ou menina, idade, raça, irmãos, doenças...
Ao achar uma criança no perfil que o pretendente procura, a Vara da Infância entra em contato e pergunta se o candidato concorda ou não com a indicação. Se sim, o juiz autoriza um primeiro encontro. Se tudo correr bem, os encontros, sempre monitorados, vão se tornando mais frequentes até que a criança vai de vez para o novo lar. Se for bebê com menos de um ano, esse período de convivência é dispensado.
Já na família nova, começa a fase chamada de guarda provisória da criança. É a fase final, o período que dura até sair a sentença sobre a adoção. Só que até ela sair, nada é definitivo, como explica Soraya Pereira, do Grupo Aconchego de apoio à adoção.
“É demorado. Enquanto não se bate o martelo, essa criança não é considerada filho.”
CASO DRAMÁTICO
E por causa da demora, chovem críticas a essa fase do processo. Principalmente porque permite que aconteçam casos dramáticos, como o de Válbio da Silva. Ele e a esposa ficaram cinco anos e meio na fila de adoção. Até que veio a Duda, que tinha quase dois anos de vida.
“Em 29 de março de 2011, ligaram dizendo que tinha uma criança. Trouxemos para casa, imediatamente começamos o processo de adoção, colocamos ela na mesma escola que estuda nossa outra filha, colocamos nosso plano de saúde, e fomos viver nossa vida. Para mim, nossa família estava completa.”
Até que, dois anos depois, os pais biológicos da Duda reverteram o processo: ganharam na Justiça a retomada da guarda. O juiz já estava até pedindo que Duda fosse devolvida à família original. Valbio e a mulher começaram uma campanha nacional para manter a adoção.
“Ficamos desesperados, totalmente inseguros. Pensa bem: até então, agimos estritamente dentro da lei. Fizemos a inscrição, os cursos, assistimos a todas as palestras, aguardamos nossa vez. A justiça nos entregou uma criança, nos deu um documento de guarda, nos autorizando a iniciar o processo de adoção, e, de repente, a mesma justiça vira e fala agora não, devolve porque agora os pais se recuperaram e a criança vai voltar para eles, depois de quase três anos. É ilógico uma coisa dessa!”
Valbio e a esposa ainda estão com Duda. Por ordem da Justiça, fazem a aproximação gradativa dela com a família biológica. Mas os pais adotivos ainda têm esperança de ficar com ela porque esperam outro julgamento, o de um pedido de guarda com base nos laços afetivos criados entre Duda e os pais adotivos.
“Ela ficou 60 dias na casa dos genitores, um ano e meio no abrigo e está com a gente há quase três anos. No total, ela tem quase cinco anos, faz em maio. Ou seja, 70% da vida dela estão com a gente. A referência de pai, mãe, irmã, casa, quarto, brinquedos, escola, tio, é aqui.”
FAMÍLIA BIOLÓGICA
Toda essa confusão foi possível porque, além de estar na fase de guarda provisória, desde 2009 a lei manda que se busque a família biológica à exaustão antes de a criança ser adotada.
A ideia era que, seria menos traumático. A criança ficaria mais acolhida, manteria sua identidade se a guarda fosse oferecida antes para primos, tios, alguém com laço sanguíneo. Só que a boa intenção acabou travando o processo, segundo o deputado Eleuses Paiva, do PSD de São Paulo.
“Entendemos que é extremamente salutar darmos preferência à recuperação da família de origem dessa criança, mas surge uma pergunta: por quanto tempo o estado deve esperar a recuperação da família ou a recolocação dessa criança no convívio dos parentes mais próximos? Não temos dúvida que não é uma resposta simples.”
A situação é realmente complicada, como exemplifica Liliane Simões, assistente social de um abrigo no estado de São Paulo.
“99% das crianças que eu tenho são filhos de usuários de droga. Quando a gente consegue contatar essa família, percebe que a mãe usa crack há seis anos. Até eu conseguir sensibilizar essa genitora, achar um local de tratamento, demora muito. E ela não resolve fazer a destituição. Então a criança acaba crescendo na instituição.”
O juiz responsável pelo Cadastro Nacional de Adoção, Gabriel Matos, defende que o prazo de dois anos para a criança ficar no abrigo, que já existe na lei, deveria ser cumprido. E ir além.
“Talvez a lei pudesse ser alterada para limitar o tempo de tentativa e o limite de busca da família biológica. Por que até quando você vai tentar inserir a criança na família biológica? A família biológica é gigante.”
A deputada Flavia Morais, do PDT goiano, diz que vai formalizar uma proposta de lei nesse sentido.
“Criar uma forma de agilizar essa guarda provisória, que ela tenha um limite de tempo, e nesse tempo, se não conseguir retornar para a família, essa família da guarda provisória pega a guarda definitiva e a criança, se ela futuramente voltar a conviver coma família biológica, seria como filho de pais separados, teria uma convivência compartilhada com as duas famílias.”
Sim, existem problemas burocráticos. Apesar disso, casos dramáticos como o de Duda são poucos. As famílias que cumpriram todos os passos do processo - cadastro, documentação, curso, entrevista e espera pela criança, dizem que vale muito a pena.
É o caso da Wanda de Lourdes, de 49 anos, moradora de Brasília. Ela e o marido começaram o processo em 2009. Depois de quatro anos e meio de espera, de muita, muita ansiedade, em novembro passado veio a tão esperada chamada da Vara de Infância. Era um bebê com um ano de vida.
“Na hora em que colocamos os olhos nesses olhinhos, com esses cílios lindos... É alucinante, é um negócio que não dá para traduzir a emoção, a energia, a vibração... É muito louca. Já no terceiro dia, João Felipe só ia com a gente, não ia com mais ninguém, está achando ruim você ir embora. Para a gente tem sido uma experiência muito... não dá para traduzir em palavras.”
Valeu tanto a pena que Wanda e o marido já pensam na próxima adoção...
“Vamos esperar sair a certidão definitiva do João Felipe com o nosso nome, como filho legítimo, e aí a gente vai voltar à via crucis de novo, por uma menina de quatro, cinco anos.”
Se você também quer adotar, entre no site www.cnj.jus.br ou vá até um Fórum ou Vara da Infância da sua cidade. Ainda tem muita criança esperando ser filho do coração de alguém.
Da Rádio Câmara, de Brasília, Ginny Morais
Conselho Nacional de Justiça - CNJ
Processo de adoção evolve preparação dos pais e adaptação da criança
Arquivo pessoal
Diana Kinch e os oito filhos: adoções nas regras antigas e nas atuais
http://www2.camara.leg.br/camaranoticias/radio/materias/REPORTAGEM-ESPECIAL/465427-O-PASSO-A-PASSO-DO-PROCESSO-DE-ADOCAO-BLOCO-5.html

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