"São viciados em drogas." Assim o juiz Vítor Manoel Sabino Xavier Bizerra se refere ao casal de lavradores Gerôncio Brito de Souza e a dona de casa Silvânia Mota da Silva, pais de cinco crianças retiradas de casa há um ano e quatro meses do convívio da família na cidade baiana de Monte Santo (352 km de Salvador) e encaminhadas para adoção em São Paulo.
Responsável por assinar o documento que retirou os cinco irmãos --todos menores-- da casa dos pais e por deferir os pedidos de guarda provisória a famílias paulistas, Bizerra afirma que os pais das crianças são usuários de entorpecentes. "Isto está expresso nos depoimentos deles nos autos, que, por determinação legal, correm em sigilo de Justiça por ter interesse de menores impúberes."
Há 16 meses, os pais das crianças, que não têm condições de pagar advogados, tentam reaver os filhos com o apoio do Centro de Defesa da Criança e do Adolescente Yves de Roussan (Cedeca-BA) e o Fórum de Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente (Fórum DCA/Bahia).
De acordo com esses órgãos, os pais estão tentando reaver os filhos, e a decisão do juiz foi "equivocada". Alegam que Bizerra fez uma interpretação de relatórios do Conselho Tutelar da cidade que não indicariam pela adoção e suspeitam ainda da atuação de pessoas na cidade para "aliciar" pais que querem dar suas crianças para adoção. Os advogados do Cedeca entraram com uma representação contra o juiz.
Segundo Bizerra, em março de 2011, o Ministério Público da Bahia (MP-BA) recebeu uma comunicação de que havia chegado ao Conselho Tutelar uma denúncia sobre "maus tratos e abandono de cinco irmãos".
O setor jurídico do Cedeca, no entanto, nega que os pais das crianças são usuários de drogas e afirma que a alegação não consta em qualquer documento nos autos como justificativa da entrega das crianças em guarda provisória. "Não há Defensoria Pública no município e o juiz que deferiu a guarda provisória nunca nomeou um advogado dativo. Os pais jamais foram citados, logo não poderiam recorrer. Na verdade não sabiam que havia um processo e como reverter a situação”, destaca a advogada do Cedeca, Isabella da Costa Pinto Oliveira.
“Todos na família sofrem muito. Eles moram na roça, onde o celular não pega. Os pais querem os filhos de volta”, complementa a advogada. “O processo está todo errado, contrário ao Estatuto da Criança e do Adolescente. Os irmãos não poderiam ser separados. A não ser que uma criança oferecesse risco a outra. Mas a prioridade é manter o vínculo familiar”, contesta Oliveira.
Informações imprecisas
O MP-BA pediu realização de "estudo social", mas o resultado, ainda segundo o juiz, "não apresentava informações precisas sobre as condições em que se encontravam as crianças". Em abril de 2011, o MP-BA pediu novo estudo que também não foi suficiente.
Insatisfeito, o MP-BA solicitou um terceiro relatório desta vez ao Centro de Referência Especializado em Assistência Social de Monte Santo (Creas), pedindo detalhamento das condições das crianças e "de que forma estava sendo feito o acompanhamento e zelo pelos pais e avós".
No relatório foi descrito, ainda segundo Bizerra, que no dia da visita a assistente social encontrou as crianças brincando "com lama" e que não tinham ido à creche municipal, onde estavam matriculadas, porque a mãe teria dito que estava lavando roupa e que identificou precariedade nas condições de higiene e saúde.
Duas crianças estariam com cartões de vacina incompletos, e uma terceira estaria sem o cartão e sem registro de nascimento. Já uma quarta, com dois meses de vida, estaria sendo alimentada com leite de vaca, o que, segundo o juiz, é impróprio para sua pouca idade.
O três relatórios foram o suficiente para Bizerra poder "evidenciar situação de risco vivenciada pelas crianças". A promotoria de Justiça requereu a aplicação de medida de Proteção para colocação em abrigo provisório. No entanto, segundo o juiz, não há abrigo na cidade.
Infecção
"Nem em Monte Santo nem na região existe abrigo adequado para o encaminhamento de crianças em tal situação de abandono e com a saúde fragilizada", disse. Questionado se foram feitos exames médicos nas crianças para constatar o estado de saúde, o juiz alega que era "visível".
"Uma criança que está com diarréia, tossindo, coriza, abatida, catarro esverdeado e amarelado - que apontam infecção - com tamanho inferior à idade precisa de diagnóstico médico? Todos os que viram as crianças fizeram a mesma constatação."
Segundo os órgãos de defesa da criança e do adolescente, as crianças poderiam ter sido encaminhadas para os avós que ajudam na criação, mas o juiz diz que conseguiu avaliar que eles eram "omissos". "Não havia informações de que os avós ou parentes próximos tinham a intenção de ficar com a guarda dos menores."
Bizerra disse admitir que sabia que os avós ajudavam no pagamento de aluguel, alimentação e gás da casa onde a mãe morava com as crianças, o que foi relatado pelo avô paterno à assistente social. Os avós não foram ouvidos pelo juiz.
"Se os avós acompanhavam os netos, tinham conhecimento da situação, mas não procuraram as autoridades a fim de noticiar as irregularidades, revelando, com seus comportamentos omissivos, ausência de condições para o exercício da guarda dos netos."
http://noticias.uol.com.br/cotidiano/ultimas-noticias/2012/10/15/os-pais-sao-usuarios-de-drogas-diz-juiz-que-autorizou-adocao-de-cinco-irmaos-na-bahia.htm
Um comentário:
Aparentemente tudo que o Juiz informou tende a parecer uma forma de desabonar a família bio e justificar as falhas do judiciário. Mesmo que as colocações do juiz sejam a verdade dos fatos, na minha opnião estas informações por si só não justificam a ação tomada. Acredito que sendo as informações prestadas pelo juiz as que constam nos autos, o que se deveria ser feito seria o abrigamento temporário. Justificar o não abrigamento por falta de abrigo local ou regional é para mim uma confissão de que a culpa é de fato da máquina administrativa (sei de casos de abrigamento de crianças a mais de 300km de distância da sua cidade por não existir abrigo local ou ser melhor o afastamento da família bio). Justificar que não citaram os parentes por um aparente descaso destes, enquanto os avôs ajudavam no aluguel e sustento das crianças, é no mínimo brincar com a inteligência jurídica. Justificar que os pais foram desleixados, por num dia específico a equipe técnica encontrar as crianças fora da creche e com supostos problemas de saúde é deixar qualquer família a merce de perder os filhos se por algum motivo os filhos se encontrem doentes e por isso não foram a aula. Não se pode jamais suspender o poder familiar sem as devidas constatações e direito ao contraditório (nem os pais e nem o MP foi ouvido), quanto mais retirar este poder familiar e por em famílias substitutas em outra cidade/estado. Para mim, perante o que li e se for de fato o que li a realidade dos fatos, nada justifica a injustificável sucessão de erros e infelizmente ainda tenho que torcer para que tenha sido realmente uma sucessão de erros e não algo pior. Este é o meu pensamento.
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