(...) "O direito de visitação não pode ser abrigado só em razão do 
acordo judicial, pois decorre, em verdade, não de vínculo parental 
biológico, mas do (inequívoco) vínculo parental socioafetivo entre a 
autora e a criança, já reconhecido, aliás, no agravo de instrumento que 
fixou as visitas, antes do pacto judicial." (...)
 PODER JUDICIÁRIO 
 ---------- RS ----------
 ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL
 PODER JUDICIÁRIO
 TRIBUNAL DE JUSTIÇA
 LSRR
 Nº 70057350092 (Nº CNJ: 0459636-65.2013.8.21.7000)
 2013/Cível
 APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE CUMPRIMENTO DE ACORDO. OBRIGAÇÃO DE FAZER. MÃE 
SOCIOAFETIVA. CUMPRIMENTO DAS VISITAS. MENOR. MANUTENÇÃO.
 O direito de visitação não pode ser abrigado só em razão do acordo 
judicial, pois decorre, em verdade, não de vínculo parental biológico, 
mas do (inequívoco) vínculo parental socioafetivo entre a autora e a 
criança, já reconhecido, aliás, no agravo de instrumento que fixou as 
visitas, antes do pacto judicial.
 Ademais, não há, nos autos, comprovação de que o convívio entre o 
infante e a autora possa trazer prejuízo ao menor, pois, embora 
determinada avaliação psicológica, e nomeada profissional, a demandada 
deixou de efetuar o pagamento.
 Nesse contexto, não havendo, no feito, comprovação de resistência do 
menor quanto ao convívio com a autora, e nem mesmo que este convívio 
possa trazer prejuízo ao infante, e apenas resistência da mãe biológica,
 após a separação da companheira, em manter a visitação ao infante, não 
há como ser obstaculizada a visitação avençada.
 RECURSO DESPROVIDO. 
 Apelação Cível Sétima Câmara Cível
 Nº 70057350092 (Nº CNJ: 0459636-65.2013.8.21.7000) Comarca de Porto Alegre
 B.M.F.
 .
 APELANTE;
 I.M.F. . APELADA.
 ACÓRDÃO
 Vistos, relatados e discutidos os autos.
 Acordam os Desembargadores integrantes da Sétima Câmara Cível do 
Tribunal de Justiça do Estado, à unanimidade, em negar provimento ao 
recurso.
 Custas, na forma da lei.
 Participaram do julgamento, além da signatária, os eminentes Senhores 
Des. Jorge Luís Dall'Agnol (Presidente) e Des.ª Sandra Brisolara 
Medeiros.
 Porto Alegre, 11 de junho de 2014. 
 DES.ª LISELENA SCHIFINO ROBLES RIBEIRO,
 Relatora.
 RELATÓRIO
 Des.ª Liselena Schifino Robles Ribeiro (RELATORA)
 Trata-se de apelação de BEATRIZ MARIA F., pretendendo a reforma da 
sentença das fls. 190/1, que julgou procedente a ação de obrigação de 
fazer, ajuizada por IVELISE MARIA F., determinando à primeira cumprir 
acordo pertinente ao direito de visitação da segunda, ex-companheira, ao
 filho biológico/socioafetivo de ambas, Artur.
 Alega que o menor, seu filho biológico, não pode ser obrigado a aceitar
 a visitação da apelada, ex-companheira, na medida em que esta última 
não tem qualquer vínculo de parentesco com o infante, não contemplando, 
com isso, o direito à visitação previsto no artigo 1.589 do Código 
Civil.
 Pede, por isso, o provimento do recurso (fls. 194/7).
 Apresentadas contrarrazões (fls. 205/13), o Ministério Público manifesta-se pelo desprovimento do apelo (fls. 217/9).
 Registre-se, por fim, que foi cumprido o comando estabelecido pelos arts. 549, 551 e 552 do CPC.
 É o relatório.
 VOTOS
 Des.ª Liselena Schifino Robles Ribeiro (RELATORA)
 Saliento, a princípio, cuidar-se de ação de cumprimento de acordo, 
questionando a autora o descumprimento das visitações acordadas, 
esclarecendo que a revisão de visitas está sendo discutida em ação 
própria (proc. 001/1130279858-9).
 Como se vê, do constante nos autos, após intenso conflito, desde o 
ingresso da ação declaratória de reconhecimento e dissolução de união 
homoafetiva, cumulada com reconhecimento de filiação socioafetiva e 
regulamentação de visitas, em 2006 (fls. 19/33), as partes firmaram 
acordo, em 08/10/2008, sendo regulamentadas as visitas de Artur à 
Ivelise, da seguinte forma: “nos finais de semana alternados, de sábado 
às 10h aos domingos, às 19h, e também nas quartas-feiras, das 18h às 
20h30min, afora as datas festivas, que serão alternadas, e férias” (fls.
 86 e 91).
 E, mesmo antes do pacto firmado, no agravo de instrumento nº 
70018249631, entendendo que houve a união homoafetiva e a vontade de 
ambas em ter um filho, estando Ivelise constantemente presente na vida 
do menor, convivendo diariamente, até o rompimento do vínculo 
homoafetivo, foram fixadas as visitas de Ivelise ao menor, que, à época,
 contava com 4 anos de idade (fls. 36/41).
 No entanto, diante do alegado descumprimento do acordo e da resistência
 da mãe biológica à visitação de Artur, a autora, em 21/03/2013, 
ingressou com a presente demanda, propondo, antes, em 03/10/2012, a ação
 de guarda, sob pretexto de alienação parental (proc. nº 
001/1120236161/8), extinta (fls. 198/200).
 O laudo social, datado de 2010, atesta que Artur tem sentimentos 
positivos em relação à Ivelise, e que está em sofrimento diante do 
conflito existente entre as partes (fls. 123/30).
 A par disso, no agravo de instrumento nº 70057123200, julgado dia 
25/10/2013, foi determinada a realização de estudo social e avaliação 
psicológica.
 E, em 22/11/2013, neste feito, os autos baixaram, em diligência, para 
que fosse procedida a avaliação psicológica, a fim de verificar a 
conveniência da manutenção do regime de visitas (fl. 220).
 No entanto, nomeada profissional para fazer a avaliação psicológica do 
menor (Dra. Marina K. Boscardin – fl. 225), e acolhida a pretensão 
honorária, em 07/02/2014, a demandada Beatriz, embora intimada 
pessoalmente para efetivar o recolhimento de 50% do valor, na data de 
22/04/2014 (fl. 238v.), não efetuou o pagamento até 20/05/2014, conforme
 informa o Ofício nº 382/2014 do juízo de primeiro grau (fl. 243).
 Nesse contexto, não havendo, no feito, comprovação de resistência do 
menor quanto ao convívio com a autora, e nem mesmo que este convívio 
possa trazer prejuízo ao infante; apenas resistência da mãe biológica, 
após a separação da companheira, em manter a visitação ao menor, não há 
como ser obstaculizada a visitação avençada.
 Ora, é inconteste que a demandada tenta, de qualquer forma, impedir a 
visitação de Artur à autora, a ponto de obstaculizar a avaliação 
psicológica do menor, diante do não pagamento da expert.
 Contudo, o direito à visitação não pode ser abrigado somente em razão 
do acordo judicial, pois decorre, em verdade, não de vínculo parental 
biológico, mas do (inequívoco) vínculo parental socioafetivo entre a 
autora e a criança, já retratado, repiso, no agravo de instrumento 
citado (70018249631), segundo o qual:
 ...O menino Artur conta, atualmente, quatro anos de idade (fls. 60). 
Embora seu registro de nascimento conste apenas o nome da mãe biológica,
 patente que no seu histórico de vida e na sua formação psicológica 
encontram-se manifestados o afeto sentido pelos carinhos por Ivelise, a 
quem o infante chama carinhosamente de “Ive”.
 Na própria capa da filmagem do nascimento do infante encontram-se a genitora e a recorrida (fl. 105) 
 No filme do nascimento de Artur, juntado nas fls. 107, é que a filiação
 homoparental mais se evidencia. A agravada ficou ao lado da recorrente 
durante todo o parto. Logo após o nascimento, enquanto o menino ainda 
chorava, Ivelise começa a contar-lhe uma história (que, segundo ela, 
contava junto à barriga da agravante durante a gestação – fl. 106) e 
este imediatamente pára de chorar. Em seguida, quem mostra Artur aos 
familiares é Ivelise. Correspondência eletrônica enviada pela recorrente
 a uma amiga, comunicando o nascimento do menino, está assinado: 
Beatriz, Ive e Artur (fl. 114).
 Assistir a fita não permite que se tenha qualquer dúvida da função 
materna exercida pela agravada, desde antes do nascimento de Artur. 
Segundo os atuais estudos médicos, ainda no ventre, o filho ouve a voz 
dos pais, daí a recomendação para que eles conversem com seus filhos, 
mesmo antes do nascimento. Esta verdade resta evidenciada na filmagem, 
pois se acalmou o bebê ao ouvir a história que lhe contava a agrava 
antes de ter nascido.
 A recorrida participou de todos os momentos da vida do infante, desde 
as consultas da recorrente ao obstetra até as consultas pediátricas, 
conforme atestados juntados nas fls. 109-110. A prova é farta a 
evidenciar o diaadia da família, passeando com o menino (fl. 98), em 
momentos de afetividade familiar (fl. 99), em viagens (fl. 101), 
comemoração de Natal (fl. 103) e nos aniversários (fl. 97, 100, 102). Em
 todos esses momentos lá estava a recorrida dedicando ao filho atenção, 
cuidado e afeto, participando ativamente na sua formação e 
desenvolvimento. Ivelise ficava em companhia do infante inclusive quando
 a recorrente viajava a trabalho, conforme trechos de correspondências 
eletrônicas trocadas à época (fl. 128):
 (...) Sabe que te amo. Estou sentindo muito a tua falta. Conta p o Artur q perdi o vôo. Te amo.
 Ao contrário do alegado pela recorrente, comprovada está a contribuição
 de Ivelise, não apenas afetivamente, mas também, de forma financeira, 
como por exemplo, com o pagamento do teste do pezinho (fl. 144), das 
vacinas (fls. 145-148) e inclusive do quarto do menino (fl. 149)
 Certo é que ambas abriram mão de projetos e horas de trabalho para 
constituírem uma família e passaram a conviver de forma mais próxima com
 o infante. Evidenciada está também a colaboração da recorrida, na 
formação psíquica do menino e, embora não sendo a mãe biológica, é sua 
mãe afetiva, estado de filiação que vem sendo prestigiada cada vez mais 
pela Justiça.
 Ao depois, consabido que o rompimento do vínculo de convívio, com quem a
 criança entretém estrito vínculo afetivo, pode gerar seqüelas de ordem 
psicológica. O sentimento de perda e abandono ao certo irá comprometer 
seu desenvolvimento saudável. O direito de visita é muito mais um 
direito do filho do que de qualquer de seus genitores. Assim, nada 
justifica a resistência da recorrente em afastar o filho de conviver com
 aquela que ele também considera sua mãe. Aliás, as visitas foram 
fixadas de forma muito acanhada, e a negativa da mantença do vínculo 
afetivo sugere simples sentimento de vingança.
 Ora, em tempos que a afetividade tornou-se uma realidade digna de 
tutela, não pode o Poder Judiciário afastar-se da realidade dos fatos.
 Esta Câmara, que foi a pioneira no Brasil a admitir a adoção 
homoafetiva, não pode deixar de reconhecer que o vínculo de filiação, 
independente do sexo dos genitores, gera todos os deveres, mas também 
assegura todos os direitos decorrentes do poder familiar. Certamente o 
direito/dever de maior significado é o de convivência, que não pode ser 
excluído pela separação dos genitores.
 Assim já me manifestei no meu artigo Paternidade homoparental 
(disponível em www.mariaberenice.com.br – sem destaque no original):
 A paternidade é reconhecida pelo vínculo de afetividade, fazendo nascer
 a filiação socioafetiva. Ainda segundo Fachin, a verdadeira paternidade
 não é um fato da Biologia, mas um fato da cultura, está antes no 
devotamento e no serviço do que na procedência do sêmen.
 Não se pode fechar os olhos e tentar acreditar que as famílias 
homoparentais, por não disporem de capacidade reprodutiva, simplesmente 
não possuem filhos. Se está à frente de uma realidade cada vez mais 
presente: crianças e adolescentes vivem em lares homossexuais. Gays e 
lésbicas buscam a realização do sonho de estruturarem uma família com a 
presença de filhos. Não ver essa verdade é usar o mecanismo da 
invisibilidade para negar direitos, postura discriminatória com nítido 
caráter punitivo, que só gera injustiças.
 Sendo notório o estado de filiação existente entre a recorrida e o 
infante, imperioso ser assegurado o direito de visitação, sendo este um 
direito do filho. Assim, deve ser mantida a decisão que fixou 
liminarmente visitas ao infante Artur nos sábados das 14h às 18h, em 
finais-de-semana alternados, de modo muito restrito, e que só não vai 
majorado por ausência de recurso da mão Ivelise.
 Por tais fundamentos, o desprovimento do agravo se impõe, desconstituindo-se a decisão liminar proferida nesta sede [...]. 
 Portanto, em que pesem as alegações da representante de Artur (mãe 
biológica), não há como afastar o direito às visitas, porquanto 
inexiste, aqui, qualquer elemento contundente capaz de demonstrar que a 
autora deva permanecer afastada do relacionamento com o menor, razão 
pela qual é cabível a procedência da ação.
 Neste sentido:
 CUMPRIMENTO DE ACORDO. VISITAS À FILHA. PEDIDO FORMULADO PELO GENITOR. 
CABIMENTO DA PRETENSÃO. ACOMPANHAMENTO PSICOTERÁPICO DA CRIANÇA. 
NECESSIDADE. 1. O pai tem o direito de exercer a visitação em relação à 
filha e esta tem o direito de receber o afeto paterno, estreitar laços 
de convivência familiar e ampliar a convivência social, não sendo 
propriedade dos pais, mas pessoa titular de direitos, que merece ser 
respeitada, bem como de ter uma vida saudável e feliz. 2. O claro 
litígio entre os pais da criança não justifica a proibição do direito de
 visitas, não podendo a criança ser instrumento de vinganças. 3. Não 
havendo nada que impeça a convivência do genitor com sua filha, é 
cabível desenvolver arranjo tendente a reaproximação entre pai e filha 
e, progressivamente restabelecer as visitas na forma já regulamentada e 
que deverá ser cumprida pela recorrida, pois deve ser resguardado sempre
 o melhor interesse da criança, que está acima da conveniência dos pais.
 4. Considerando que a filha não é propriedade do pai, nem da mãe, bem 
como que deve com ambos conviver e que nada desaconselha essa 
convivência mais próxima, estou desconstituindo a sentença extintiva 
para o fim de determinar tenha curso o processo tendente a restabelecer o
 vínculo paterno filiar e tornar efetivo direito de visitas do pai à 
filha já regulamentado, determinando-se o necessário acompanhamento 
psicoterápico da menor. Recurso provido, em parte. (Apelação Cível Nº 
70053061602, Sétima Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: 
Sérgio Fernando de Vasconcellos Chaves, Julgado em 27/03/2013) 
 APELAÇÃO CÍVEL. REGULAMENTAÇÃO DE VISITAS. VISITAS COM PERNOITE. 
SUCUMBÊNCIA MÍNIMA PELO AUTOR. Como se verifica pela longa instrução, 
restou amplamente comprovada pelo estudo social e laudos psicológico e 
psiquiátrico, a recomendação de visitas paternas com pernoites. O menor,
 atualmente, com 8 anos de idade, sempre teve estreito vínculo afetivo 
com o genitor que lhe dispensou cuidados desde o nascimento, não havendo
 nada que desabone a conduta do pai. A ampliação de visitas vem em 
atendimento aos interesses do menor, cuja proximidade com o pai deve ser
 preservada e estimulada. A sucumbência foi mínima, pois a guarda e as 
visitas foram acordadas já na primeira audiência, remanescendo apenas a 
controvérsia quanto ao pernoite, ou seja, uma ampliação do período de 
visitas. NEGARAM PROVIMENTO. UNÂNIME. (Apelação Cível Nº 70047796966, 
Oitava Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Luiz Felipe 
Brasil Santos, Julgado em 29/11/2012) 
 Do exposto, nego provimento ao recurso. 
 Des.ª Sandra Brisolara Medeiros (REVISORA) - De acordo com o (a) Relator (a).
 Des. Jorge Luís Dall'Agnol (PRESIDENTE) - De acordo com o (a) Relator (a).
 DES. JORGE LUÍS DALL'AGNOL - Presidente - Apelação Cível nº 
70057350092, Comarca de Porto Alegre:"RECURSO DESPROVIDO. UNÂNIME." 
 Julgador (a) de 1º Grau: LUIZ MELLO GUIMARAES
http://ibdfam.org.br/jurisprudencia/2678/Cumprimento%20de%20acordo.%20Obriga%C3%A7%C3%A3o%20de%20fazer.%20M%C3%A3e%20socioafetiva.%20Menor.%20Manuten%C3%A7%C3%A3o 
 
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