Quarta-feira, 27 de agosto de 2014
Por: Luiz Redação
Tentativa de compra de um bebê no último sábado levanta debate. Para quem lida com tema, bem-estar do adotado é prioridade
Marcelo Tavares e Anderson Costa
A tentativa de venda de um bebê recém-nascido no último domingo (24), em Aparecida de Goiânia, fez ressurgir a discussão sobre o processo para adoção no Brasil, onde essa prática é considerada burocrática e morosa, devido aos tramites exigidos na legislação.
Para a juíza da Infância e Juventude de Goiânia, Maria Lúcia Socorro Afonso da Silva, o tempo de conclusão desse processo não é uma prioridade da Justiça, mas sim o bem-estar da criança, que deve se sentir acolhida a sua nova família e essa, adaptada a esse filho. “É necessário todo esse tempo, mas talvez nem leve um ano, desde que o perfil seja de uma criança que já conste no cadastro nacional”, afirma.
A magistrada explica que a demora no processo de adoção está na dificuldade de encontrar o perfil de criança definido pelos casais, que, na maioria das vezes, querem recém-nascidos. “A demora, de fato, é no processo de destituição do poder familiar”, diz ela.
Sobre o fato de um empresário tentar comprar um bebê no último sábado (23), a juíza apontou a situação como um “ato de desespero”. “Geralmente o casal que chega à conclusão de que quer adotar fica muito ansioso e acaba investindo emocionalmente na expectativa de ter um filho. E, às vezes, surgem oportunidades de terem conhecimento de uma mãe que não quer o filho devido a uma compensação para pagar uma ligadura ou até um tratamento médico”, relata a juíza.
ADOÇÃO DIRIGIDA
O conselheiro tutelar da região Leste, Omar Borges, diz que realmente todos os tramites da lei 12.010/09, que alterou a lei 8.069/90, são necessários para evitar fatos como ocorreu no caso Silvia Calabresse. A ex-empresária foi presa e condenada por torturar a filha adotiva Lucélia Rodrigues da Silva, menina que ela pegou para criar aos 10 anos.
O caso envolve a adoção dirigida, que é quando a mãe biológica doa a criança para uma terceira pessoa cuidar, o que atualmente é ilegal, já que somente o juiz pode determinar qual a destinação de uma criança que é rejeitada pela mãe. “O processo é demorado, mas tem que ocorrer dentro da legalidade. Todos os procedimentos são necessários para a segurança da criança. É preciso uma avaliação psicológica e social para saber se realmente quem vai adotar tem condições psicológicas e financeiras para cuidar de uma criança”, ressalta Omar.
A coordenadora do Condomínio Sol Nascente, Maria Eunice Dias, diz que até o dia 20 de agosto deste ano, 29 crianças foram destinadas a famílias substitutas.Para o local vão a maioria das crianças que é abandonada ou vítima de alguma situação de risco grave e eminente. A coordenadora é defensora de que o processo para adoção atenda realmente todos os requisitos exigidos na legislação. “Ao se tratar de vidas, é preciso ser rigoroso mesmo. Mesmo com toda essa análise que a Justiça faz, ainda acontecem casos de devolução de crianças e até mesmo fatos de violência. Não é porque a criança está em um abrigo que tem que sair rápido. É preciso que tudo seja verificado”, destaca ela.
VAZIO PREENCHIDO
A artesã Alda Assis Lima, de 53 anos, depois de ter três filhas e a mais velha completar dez anos, começou a sentir um vazio que não sabia explicar. A resposta veio quando ela soube que uma mulher teve uma criança e que o bebê não era muito desejado pela mãe biológica. Na época, em 1995, ela não chegou a entrar na fila de adoção porque já tinha mais de 250 pessoas na espera.
Com o auxílio de uma advogada e o desejo da mãe biológica em doar a criança, ela entrou com um pedido de guarda e adoção da criança. Alda adotou uma criança fora dos padrões, já que o bebê nasceu cego. “Queria ser mãe novamente. Não importava a cor ou se criança era cega. Na época chegaram a me criticar, mas não me importei, já que contava com o apoio de toda minha família”, diz Alda.
Hoje, a criança que ela começou a cuidar com 24 dias de nascido, tem 19 anos, se chama Rafael de Lima e é músico. Ele recebeu todo o carinho de uma família e os cuidados necessários para sua saúde. Inclusive, chegou a passar por um transplante de córnea que lhe devolveu parte da visão do olho direito. “O Rafael veio para mudar as nossas vidas. Hoje, falamos que não dá para imaginar nossas vidas sem que ele não estivesse presente. É um filhão muito amoroso, carinhoso”, diz orgulhosa a artesã.
LEI DE 2009 ALTEROU LEGISLAÇÃO SOBRE O TEMA
A juíza da Infância e Juventude de Goiânia, Maria Lúcia Socorro Afonso da Silva, explica que com a edição da lei 2.010/09, que entrou em vigor em novembro de 2009, houve alterações substanciais no Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), a respeito da adoção.
Segundo ela, uma das principais mudanças é a que proíbe aos pais biológicos entregarem os filhos, para adoção, a uma pessoa de sua preferência. “Quem quiser entregar o filho para adoção deve entregar ao juizado”, esclarece a magistrada.
A Juíza explica que para adotar uma criança de forma legal é preciso primeiro que a pessoa adquirira uma certidão de habilitação. O candidato a ser uma mãe ou um pai adotivo deve apresentar documentos e fazer um curso preparatório. “A partir dessa habilitação, a pessoa vai para o cadastro nacional de adoção. A pessoa estabelece o perfil da criança que deseja adotar, como a idade e cor, e quando surgir, o pretendente é acionado”, relata Maria Lúcia Socorro.
A magistrada explica porém que existe outro processo quando a criança é levada a uma entidade de acolhimento. “Na maioria das vezes, quando a mãe é usuária de drogas, ou o pai é desconhecido, a mãe desaparecida ou abandonou a criança. Nesse caso, enquanto o processo está tramitando de destituição do poder da família biológica, o casal ou a pessoa já pode pegar a guarda da criança e quando houver a destituição definitiva eles requerem a adoção”, explica a juíza.
A magistrada explica também que esse processo de destituição da família também foi alterado recentemente. “A lei 2.010 que alterou o ECA, estabele que no máximo o juízo deve providenciar para que a criança fique na família, seja a natural (pai, mãe ou irmão) ou extenso (avós, tios e parentes).
Mesmo que os pais entreguem o filho, é dever verificar se não tem algum membro da família extenso que tenha interesse de ficar com a criança”, esclarece a magistrada.
Rafael, que hoje tem 19 anos, foi adotado pela artesã Alda Assis (André Costa)
http://www.portalohoje.com.br/homologacao_20052013/cidades/morosidade-nao-e-problema-para-adocao/
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