quinta-feira, 19 de junho de 2014

ADOÇÃO – UMA HISTÓRIA DE AMOR


jun19
“Depois de quase catorze anos juntos, vindos de casamentos anteriores, eu viúva, ele divorciado, nossos quatro filhos, dois meus e dois dele, já criados, achamos que já era hora de ter um filho nosso. Eu já estava com quase cinqüenta anos, por isso e para realizar meu sonho de menina – sim, desde menina eu sonhava em ser mãe do coração – decidimos adotar uma criança.
Não sabíamos nada sobre adoção nem conhecíamos ninguém que já tivesse adotado. Morando no Rio, nossa primeira frustração foi descobrir que o processo de habilitação aqui poderia demorar até três anos. Saímos em busca de ajuda. E encontramos um casal, Márcia e Sakae, que foram nossos anjos da guarda. Pais adotivos de um lindo menino, eles nos guiaram durante todo o processo. Como tínhamos casa em Búzios, resolvemos pedir permissão ao juiz para que o processo corresse lá. E conseguimos! Em Búzios, conhecemos outro anjo, a assistente social do fórum, que nos recebeu com a maior atenção e carinho. O processo de habilitação demorou um ano, incluindo a entrega de toda documentação e entrevistas com a assistente social e psicólogas. Enfim habilitados, saímos em busca de nosso filho que, com base no perfil que havíamos definido durante o processo, seria uma menina, de até 5 anos, saudável, sem preferência de cor ou etnia. Na época ainda não existia o Cadastro Único. Sendo assim, começamos a preparar envelopes com a documentação completa de habilitação para enviá-los a todas as potenciais comarcas onde teríamos chance de encontrar uma criança com o perfil por nós indicado.
Foi aí que recebi o telefonema de minha amiga Márcia, falando de um menino de dois anos, disponível para adoção do interior de Minas Gerais. Queríamos uma menina, mas como nessa época meu marido estava trabalhando em Belo Horizonte, decidimos ir até lá conhecer o menino.
Uma semana – dois aviões e duzentos quilômetros de carro – depois, chegamos ao abrigo com instalações muito simples e cento e oitenta crianças. A assistente social nos recebeu e foi buscar o menino. Eu estava tão nervosa que mal conseguia respirar. Dez minutos depois ela reapareceu, com um menino no colo, negro, miúdo, vestindo short azul e camisa surrada com desenhos de bichinhos e calçando uma sandália de dedo. Sentei e coloquei o menino em meu colo. Podia sentir sua respiração ofegante, compassada, junto com a minha. Coloquei a mão em seu peito e ficamos assim, mudos, respirando juntos durante sei lá quanto tempo, talvez uns cinco minutos, se tanto, que me pareceram uma eternidade. Ele era tão pequeno, tão maltratado – machucados nas pernas, pele ressecada, um ferimento mal cuidado na orelha – e tão lindo!
Depois de passar um dia com ele, nossa decisão já estava tomada. Tínhamos certeza de que não conseguiríamos mais voltar para casa e esquecê-lo. Ele já fazia parte de nossas vidas. Ele já era nosso, mas antes disso, ele já nos tinha escolhido. Sabíamos que nossos destinos estavam ligados para sempre.
Uma semana depois fomos buscá-lo. Trancado em um abrigo desde os seis meses, ele viajou quase dois mil quilômetros rumo a uma vida nova no Rio de Janeiro. Sem nunca ter recebido carinho, sem nunca ter tido alguém, de repente, ganhou pai, mãe, quatro irmãos, avós, tios, e muitos amigos. Não seria fácil ainda que ele fosse um adulto, mas ele era apenas um bebê. Meu filho não sabia o que era um carinho, uma música de ninar, uma maçã, um sapato. E eu, que me achava uma mãe experiente, tive que reaprender a ser mãe. Ele tinha pesadelos até eu descobrir que precisava ter todos os brinquedos e roupas à sua volta na cama porque tinha medo de dormir e perdê-los. Comia compulsivamente até eu entender que tinha a marca da fome e precisava reaprender a comer. Não aceitava beijos e abraços até eu entender que tudo tinha seu tempo e que o tempo dele não seria necessariamente o meu. Mas o amor muda tudo. E o amor por ele não mudou só a vida dele, mas as nossas vidas, nos transformando em pessoas melhores, nos ensinando a amar de outro jeito, respeitando a história e o tempo do outro.
Hoje ele tem quase nove anos. É um menino saudável e extrovertido. Ama e é muito amado. É intenso, barulhento, levado. Adora jogar futebol e viajar, gosta de ir para o sítio, tem um cachorro, adora dançar. Explora a vida com curiosidade, sensibilidade e inteligência. Esbanja alegria. E nós pedimos a Deus que nos dê saúde e sabedoria para continuar a seu lado, vivendo a felicidade de vê-lo crescer.”
http://maternidadenodiva.com/adotar-historia-amor/

Nenhum comentário: