sábado, 28 de junho de 2014

A LUTA DE UMA INDIA BRASILEIRA PARA PODER HASTEAR A BANDEIRA DO PAÍS.


27.06.2014
Postado por: Samukasos Kasos
Como a determinação transforma obstáculos em motivação e lutas em vitórias.
Uma poeta. Uma terapeuta. Uma oficial. Estes logros não eram sequer imaginados por Silvia Nobre Waiãpi décadas atrás quando ela quase perdeu os movimentos de uma perna, quando não tinha onde morar, ou quando suas aspirações quase foram destruídas devido a uma tentativa de estupro. No último dia 3 de fevereiro de 2011, aos 35 anos, tornou-se não apenas a primeira mulher indígena a integrar as Forças Armadas no Brasil, mas as altas notas obtidas nos exames de admissão para o exército a posicionaram entre os soldados de elite. Ela disputou uma vaga com outros 5.000 candidatos para ser aceita no Centro de Preparação de Oficiais da Reserva do Rio de Janeiro. Tendo concluído seu treinamento entre os primeiros de sua turma, a aspirante a oficial deve ser promovida a 2° tenente ainda em 2011. Este é o primeiro capítulo do resto da vida de Silvia Nobre Waiãpi e de sua difícil caminhada para chegar até aqui, o que requereu muita coragem e determinação.
Silvia nasceu na aldeia da etnia Waiãpi, no Parque indígena do tumucumaque, extremo norte do país, fronteira com o Suriname, no estado do Amapá. Ela conta que, aos 3 anos, escorregou, caiu e teve a barriga perfurada por um pedaço de madeira. Foi então levada pelos pais para “a cidade”, Macapá. Devido à gravidade da cirurgia – Silvia quase perdeu os movimentos da perna direita – seus pais decidiram abandonar a aldeia e se mudar para o lugar onde ela pôde terminar o tratamento.
“Esses eram meus pais adotivos. Meus pais verdadeiros me deram em adoção, algo que é pouquíssimo comum entre os índios Waiãpi e que até hoje é uma incógnita para mim”, conta Silvia.
Aos 5 anos e já curada, Silvia estava passando com o pai adotivo em frente a uma escola e lhe perguntou o que era aquilo pendurado. Ela se referia ao nome do colégio. Foi ali que começou sua obstinação pelas letras e artes, de um modo geral.
MAUS-TRATOS NA ESCOLA
“Eu queria aprender a ler e escrever. copiar e entender aquilo que eu achava tão lindo: as letras. insisti e meu pai me matriculou naquela mesma escola, mesmo sabendo que eu poderia sofrer preconceitos por ser índia e pobre”, relembra. “Quantas vezes fui maltratada na escola porque alguns preconceituosos professores tinham nojo da minha ‘cara de índia’, da minha roupa velha e suja, sem botão atrás; mas que eu achava linda, porque era a minha melhor roupa”.
Mas o que mais doía na pequena índia era não poder hastear a bandeira do Brasil. “Apenas as crianças brancas é que podiam hastear a bandeira, símbolo máximo do meu país que eu tanto amo”, conta com lágrimas nos olhos.
Curiosamente, foram esses maus-tratos e a vontade de hastear a bandeira brasileira que fizeram Silvia se encher de determinação e decidir sair de Macapá e ir para o rio de Janeiro, a quase 3.000 km de distância. Estava com apenas 13 anos.
DE PEDINTE A ATLETA
Sem conhecer ninguém, a índia dormiu nas ruas cariocas por vários meses. “O que me salvou é que eu tinha uma pedra, que acreditava ser sagrada, e a vendi para comer. Com aquele dinheiro, eu consegui comprar comida para umas duas semanas. Depois aluguei um quartinho, comecei a vender os livros que a dona da casa não queria mais de porta em porta”, lembra.
Antes de vender os livros, Silvia os lia e começou a se apaixonar por poesia. Seu interesse chamou a atenção da Associação Profissional de Poetas do Estado do rio, que a incentivou a escrever, além de apenas declamar poesias. Ela resolveu, então, estudar artes e até ganhou prêmios por seus poemas, como a medalha cultural Castro Alves e a medalha Monteiro lobato.
Mas outra mudança de rumo estava programada para a vida insólita da índia Waiãpi. Um dia, chegando à casa já de madrugada, depois de participar de um sarau, Silvia foi atacada por um homem que quase a estuprou. Por sorte, outro sujeito que estava passando gritou e o pedófilo saiu correndo.
“Eu tinha apenas 15 anos e aquilo me marcou muito. Decidi que teria que aprender a me defender, mas como sou baixinha, não seria páreo para nenhum marmanjo, portanto, correr seria a solução”, diz Silvia. Ela, então, deixou as artes, comprou um tênis, começou a correr todos os dias pelas ruas do rio e acabou virando atleta do clube Vasco da Gama e direcionando os estudos para a área da saúde e fisioterapia ligada ao esporte.
SONHO REALIZADO
O contato de Silvia com o mundo militar se deu muitos anos depois, quando trabalhava como fisioterapeuta e assistia um grupo de fuzileiros navais. Seguindo o conselho de um dos membros da tropa de elite da Marinha do Brasil, Silvia prestou concurso em 2009, mas foi reprovada. “No ano seguinte, fiz novamente o exame e fui aprovada na Marinha e no Exército, e escolhi o Exército”, afirma.
Só então o tão esperado sonho enfim se tornou realidade. “Pedi a meus superiores que me deixassem hastear a bandeira do Brasil numa cerimônia militar, e meu pedido foi aceito”, conta Silva chorando copiosamente. “Enfim pude chorar pela primeira vez na vida, pois havia prometido a mim mesma que só choraria no dia em que pudesse enxugar minhas lágrimas com minha bandeira. E dizer a ela: EU cumpri minha missão”!
Hoje, Silvia, que vive com seus três filhos e uma neta no rio de Janeiro, divide o seu tempo entre suas funções no hospital central do Exército, cursos de especialização em saúde pública na Universidade Federal Fluminense e em gênero e sexualidade na Universidade do Estado do rio de Janeiro, além de cursar a sua terceira graduação, em gestão hospitalar.
“Tenho muitos sonhos e aspirações, e em algum momento de minha vida pretendo fazer prova para o itamaraty e ser a primeira indígena diplomata na história do Brasil; defender o meu país e trabalhar com ações de saúde em missões de paz”, diz uma ainda sonhadora Silvia nobre Waiãpi, e dispara: “Quero abrir uma nova ponte para mulheres índias no Brasil, não só nas Forças Armadas, mas em outros segmentos”. Original da Revista Dialogos - Depto de defesa norte-americano.
Silvia Nobre Waiãpi com seus pais adotivos em Macapá quando tinha 5 anos de idade.[Cortesía de Silvia Nobre Waiãpi]
Silvia Nobre Waiãpi participa da Maratona do Rio de Janeiro. “Medalhas são só medalhas, que o tempo vai corroer, mas o que há por trás delas o vento não derrubará e as traças não destruirão”, disse.[Cortesía de Silvia Nobre Waiãpi]
Silvia Nobre Waiãpi faz continência em frente à bandeira brasileira no Hospital Central do Exército, no Rio de Janeiro. “Todos os dias, ensino aos meus filhos que a marca de honra de um homem está em uma vida inteira servindo ao seu país”, disse. [Marcos Ommati/DIÁLOGO]
Silvia Nobre Waiãpi, com membros da tribo Waiãpi, durante uma de suas viagens de retorno à região norte do Brasil.[Cortesía de Silvia Nobre Waiãpi]
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