A ADOÇÃO INTER-RACIAL
17/11/2013
NO DIVÃ
Quando o tema é adoção frequentemente escutamos falar sobre as
dificuldades encontradas pelas instituições que cuidam do assunto em
relação às adoções inter-raciais. Fala-se em adoção inter-racial quando
ela une pais e crianças que pertencem a raças diferentes entre si.
Em países da Europa e América do Norte é muito comum encontrarmos
famílias onde os membros são de raças distintas, e não raro, que
pertencem a duas ou mais raças. Assistimos pais brancos com filhos
negros, mulatos, indígenas ou de origem asiática com muito maior
frequência lá fora, do que aqui em nosso país. Apesar da mídia
recentemente estar ampliando esta discussão, os serviços que lidam com
adoção ainda registram a preferência dos pais candidatos à adoção por
crianças de mesma raça.
Pesquisas já foram realizadas em vários
países, porém não se chegou à conclusão de que seja a diferença racial
entre pais e filhos adotivos a causa das dificuldades que possam ser
encontradas neste processo. Afinal, a adoção é uma filiação a ser
construída, trata-se de uma gestação que ocorre ao revés, ou seja, uma
gestação que se inicia após a chegada da criança. Assim, o encontro
entre pais e filhos adotivos sempre traz desafios para ambos os lados.
Sabemos que muitas podem ser as causas que levam um casal a optar pela
adoção: infertilidade de um ou ambos os pais, medo da gestação, morte de
um filho biológico, porém se a referida causa não foi suficientemente
falada, pensada e entendida por estes pais, qualquer manifestação do
filho adotivo que os "frustre" poderá trazer à tona fantasias de que tal
situação tem a ver com a origem biológica da criança.
Segundo a
psicanalista Gina Levinzon: "quando o filho adotivo os frustra, ou
apresenta comportamentos mais impulsivos ou agressivos, surgem as
'fantasias do mau sangue': o pensamento de que se a criança tivesse
nascido deles não se comportaria dessa forma".
Neste caso, as
diferenças físicas como cor da pele, tipo de cabelo e raça podem servir
para intensificar estas fantasias e dificultar o estabelecimento de um
vínculo saudável entre eles.
Estas fantasias são mais frequentemente
observadas em casos onde apesar de os pais conseguirem falar sobre a
adoção, não se sentem autorizados para falarem sobre a origem da
criança: de onde veio, onde ficou até a chegada deles, a região onde
nasceu, as características físicas deste lugar etc.
Esta dificuldade
dos pais pode ocorrer em decorrência de uma necessidade inconsciente
destes em negar que o filho tenha outra origem e é biologicamente
diferente deles. O tabu criado em relação à sua origem pode trazer à
criança a dificuldade em aceitar suas próprias características físicas, o
que interfere na formação de sua própria identidade.
As diferenças
físicas passam a ser associadas pela criança como se ela fosse inferior e
não pertencente àquela família. Pode surgir o medo por um novo
abandono, pois o fantasma da rejeição passa a imperar. O sentimento de
menos valia, as dificuldades escolares e uma visível tristeza podem ser
observadas e é na maioria das vezes, somente neste momento, que o
tratamento psicanalítico é procurado pelos pais.
É certo que a
adoção por si só denota situações intensas para todos os envolvidos,
porém o trabalho psicanalítico mostra que, quanto mais cedo tratamos os
medos e os fantasmas que habitam o psiquismo de todos os envolvidos,
mais preservada estará a saúde física e psíquica, possibilitando a
construção de laços estáveis, onde todos se sintam incluídos e
pertencentes, no qual as diferenças sejam respeitadas e vividas como
possibilidade de enriquecimento pessoal.
EDILAINE BRONZERI PUGLIESE é
psicanalista, psicóloga com especialização em Psicologia Clínica (CRP
06-36525). Membro fundador do TRIEP - Trabalhos de Investigação e
Estudos em Psicanálise (www.triep.com.br
). Contato: secretaria@triep.com.br
http://portaljj.com.br/interna.asp?Int_IDSecao=15&Int_ID=215114
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