QUEM DISSE QUE A GRÁVIDA DO CORAÇÃO NÃO SOFRE ABORTO?
Sexta-feira, 28 de junho de 2013
Eis aí uma boa pergunta!
Levando em consideração que quase ninguém se dá conta que uma pessoa
que espera um filho por adoção está grávida na alma, pouca gente pensa
(ou acredita) que esta gestação possa ter abortos!
Antes de continuar, vamos às definições de aborto no dicionário! Esta é do Dicionário Online de Língua Portuguesa
Significado de Aborto
s.m. Expulsão espontânea ou provocada do produto da concepção antes do momento em que ele se torna viável.
Fig. Insucesso: o aborto de uma empresa.
Trocando em miúdos, o aborto não é apenas a morte de um feto. É a
interrupção de um projeto, qualquer que seja, que não tenha chegado a
termo. O aborto se dá, justamente, na necessidade que existe de se
desconstruir um projeto, um plano, um sonho que por algum motivo foi
interrompido. Esta desconstrução causa sofrimento, causa dor, causa a
sensação de perda.
O aborto propriamente dito é a interrupção de um
projeto (o da maternidade). É muito sofrido para uma mãe que sonhava com
o filho, que estava fazendo planos de vida com este filho ter que
desconstruir esse projeto pelo 'não' que a vida deu. Isso, logicamente,
falando de abortos espontâneos, ok?
Na adoção, na gravidez do
coração, não é diferente. A gente passa a construir um mundo em torno da
maternidade, passa a sonhar, a planejar, a desejar ver o filho logo.
Passa a pensar na casa, na segurança, no espaço, no quarto, no enxoval,
nos brinquedos. Enfim, passa a construir um mundo incluindo um filho que
não tem data para chegar, mas que está sendo gestado na alma tão
intensamente como quem gesta no corpo o seu rebento.
Pois bem, nem
sempre acontece de a grávida do coração ser chamada e de dar tudo certo.
Podem acontecer inúmeros fatores que façam com que o chamado não seja a
efetivação da maternidade! É nesse momento que se dá o aborto da
grávida do coração! Quando a expectativa é frustrada de alguma forma por
algum 'não' inesperado. A dor neste momento é imensa e intensa. O
sentimento de perda é inevitável. A desconstrução e a vivência do luto
são necessárias para que se comece a sonhar e reformular um novo
projeto, uma nova espera. E sim, nessa nova construção nasce o medo que
dê algo errado novamente, assim como acontece com a grávida biológica
que perdeu e que engravida novamente!
Eu nunca engravidei
fisicamente, mas sofri 3 abortos significativos que me marcaram muito. O
primeiro de uma menina de 7 anos que queria muito ser minha filha e a
quem eu desejei de corpo, alma e coração ser mãe. Doeu ter que me
afastar dela. Dói até hoje não saber como ela está e o que aconteceu em
sua vida. Dói, hoje, pensar que eu já poderia ser até avó, que poderia
ter uma filha formada na faculdade. Esta menina, hoje, tem em torno de
26 anos e certamente, sem sombra de dúvidas, viveu naquele abrigo até
seus 18 anos! O segundo aborto foi um trio de irmãos que eu precisei
abrir mão. Eram 3 crianças, eu já tinha duas, as condições eram difíceis
por aqui e eu não tinha como cuidar adequadamente de 5 crianças, sendo
duas bem doentes e usando fraldas. Eles foram adotados, soube que estão
muito bem, porém doeu e ainda dói. Ainda penso em como seria hoje se os 3
estivessem aqui. Quando eu tive que decidir pelo 'não' deixei com eles
um pedaço da minha alma e confesso que demorou para eu vivenciar esse
luto e poder replanejar a espera novamente. O terceiro foi uma garotinha
linda, deficiente visual, parecidíssima com a Taís que eu amei de
paixão só pela foto. Quando fui consultada para ela todo meu ser dizia
SIM, mas as possibilidades financeiras (sempre elas!) disseram não! Ela
vivia em outro estado, muito longe, nós teríamos que passar dias lá e eu
tinha um bebê com refluxo que demandava cuidados e gastos.
Estes
três foram abortos! Eu senti na alma, eu chorei, eu senti uma perda
irreparável, uma dor incomparável e eu penso neles até hoje. Como
qualquer grávida biológica que lembra do seu bebê e pensa como seria a
vida se ele tivesse nascido eu penso nos meus 3 abortos da alma e é
inevitável não pensar em como seria se eles estivessem aqui. Dos 3,
apenas a primeira eu nunca mais soube notícias. Saber que os outros
estão bem é um alento, mas não elimina a marca que ficou na minha alma.
Quando o Tales nasceu eu soube no mesmo dia. A notícia era que ele
tinha nascido, mas que tinha dado trabalho no parto por ter sido um
parto normal com 3 circulares de cordão no pescoço. Eu trabalhei em
hospital e sabia o que isso podia significar. Pensar que ele podia ter
morrido enforcado me fez chorar um dia inteiro, pensar que ele poderia
ter alguma sequela como paralisia cerebral por falta de oxigenação me
dava calafrios. Eu só pensava em ver as notas do Apgar quando chegasse
lá e quando eu contei para algumas pessoas que meu filho havia nascido e
o que havia acontecido - naturalmente pela minha natureza eu contava
chorando - algumas destas pessoas falaram: 'mas nem foi você quem
gestou! Se ele tivesse morrido ou se tiver problema você pode esperar
outro, afinal ele nem é seu ainda'.
Ouvir esse tipo de coisa era
como uma lança no meu coração! Como assim eu poderia esperar outro? Como
assim ele não era meu ainda? Ele era meu desde antes de eu saber dele.
Era meu apenas pelo telefonema falando que ele existia porque eu o
esperava fazia anos. Era dele que eu estava grávida do coração e da
alma. Se ele tivesse morrido no parto eu teria sofrido como se eu o
tivesse gestado no meu corpo! Se ele tivesse ficado com sequela eu não
teria esperado outro perfeito porque ele era meu. Ele era perfeito para
mim, fosse como fosse.
É disso que estou falando! Da falta de
sensibilidade das pessoas pelo desconhecimento do que seja uma gravidez
do coração! Da falta de humanidade, até, porque não se fala um troço
desses que falaram para mim para mãe nenhuma!
Fica aqui o alerta: a
grávida do coração sofre abortos quando algo dá errado. Ela sofre. Dói
muito ter que desconstruir a espera para reconstruir novamente e eu
creio que não difere em nada da perda fisiológica de um filho!
Por
favor, sejam humanos com as mães do coração! Se não compreenderem a
situação e a dor delas, ao menos não falem coisas que as façam sofrer
mais, afinal dói muito perder um filho, seja pela forma que for, ainda
que quem não vive este mundo adotivo não compreenda que 'aquela criança
estranha' é um filho em potencial, esperado, desejado, planejado e amado
como um biológico!
Na ausência do que dizer nestas situações, apenas abrace! Apenas abrace!
Beijos,
Cláudia
http://adocaoamorverdadeiro.blogspot.com.br/
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