IX CONGRESSO BRASILEIRO DE DIREITO DE FAMÍLIA VAI DISCUTIR, DENTRE OUTROS TEMAS, A CONVENÇÃO DE HAIA E O SEQUESTRO INTERNACIONAL DE CRIANÇAS.
05/06/2013
Fonte: Assessoria de Comunicação do IBDFAM
Os maiores juristas do Brasil estarão reunidos entre os dias 20 e 22 de
novembro deste ano em Araxá, MInas Gerais, no IX Congresso Brasileiro
de Direito de Família.
O tema central, “FAMÍLIAS: PLURALIDADE E
FELICIDADE”, é instigante e suscita reflexões sobre a constante mutação
no conceito de família, cada vez mais amplo.
Cada palestra do
evento vai apresentar o olhar peculiar de quem vivencia a justiça no
cotidiano .Nesta entrevista, Guilherme Calmon Nogueira da Gama, membro
do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e do IBDFAM, comenta um dos temas
em pauta no Congresso, “A Convenção de Haia e sequestro internacional de
crianças”.
Confira:
QUAIS AS MAIORES DIFICULDADES ENCONTRADAS PELO JUDICIÁRIO AO ANALISAR OS CASOS DE SEQUESTRO INTERNACIONAL DE CRIANÇAS?
Há algumas dificuldades que são próprias do sistema judicial brasileiro
e outras, da nossa cultura. As da primeira parte são decorrentes da
divisão da competência jurisdicional que existe no Brasil entre a
justiça federal e a justiça estadual. Nos casos de transferência ou
retenção ilícita da criança relativamente ao território brasileiro,
normalmente o genitor que trouxe a criança propõe ação de guarda na
justiça estadual, ao passo que o outro genitor - que normalmente está no
outro país - ingressa com a ação de busca e apreensão da criança na
justiça federal. Apesar da diferença entre as competências, há em regra
prejudicialidade na questão referente ao retorno da criança ao país de
sua residência habitual, o que exige a suspensão do processo de guarda
na justiça estadual. Mas nem sempre isso ocorre, o que justificou a
solução encontrada pelo Superior Tribunal de Justiça no sentido de
determinar a remessa dos autos da ação de guarda para a justiça federal.
Outra dificuldade consiste em cumprir o prazo de seis semanas para a
solução do litígio na justiça federal. A Convenção da Haia estabelece
tal prazo para que a criança tenha sua situação definida, de modo que as
questões referentes à sua guarda, aos alimentos, à visitação, entre
outras, possam ser resolvidas rapidamente pelo juiz natural do Estado da
sua residência habitual ou pelo juiz de direito do Estado brasileiro se
ela ficar no Brasil. O problema é que muito dificilmente se verifica o
cumprimento do referido prazo, devido à cultura e legislação brasileiras
que permitem o alargamento do termo final de solução do litígio para
períodos bem superiores. Há a cultura de proteção da mãe e da criança
brasileiras no sentido de, intuitivamente, o juiz brasileiro solucionar a
lide na perspectiva da nacionalidade dos envolvidos, o que é um grande
equívoco à luz da Convenção. Ainda há muito desconhecimento a respeito
dos objetivos e da essência da Convenção, que envolvem o compromisso da
República brasileira de cooperar com outros países em relação a temas
tão importantes, tais como a situação jurídica da criança.
O CNJ TEM DESENVOLVIDO AÇÕES EFETIVAS NESSE SENTIDO?
O CNJ ainda tem desenvolvido atualmente poucas medidas relacionadas ao
aperfeiçoamento do Poder Judiciário brasileiro quanto à aplicação da
Convenção de Haia. Há aproximadamente seis anos, a Presidência do CNJ
constituiu um Grupo de Trabalho que apresentou um estudo a respeito da
Convenção, disponibilizado no sítio eletrônico do STF, além de elaborar
um esboço de anteprojeto de lei para regular aspectos processuais
referentes às ações fundadas na Convenção. Mas ainda há muito a ser
feito, principalmente no campo da cooperação jurídica internacional.
Pretendo aprofundar o debate e as discussões a respeito da temática da
cooperação jurídica internacional, inclusive quanto ao tema da adoção
internacional. Há dois Tribunais Regionais Federais que concentraram a
competência para conhecimento e julgamento das ações fundadas na
Convenção da Haia em alguns juízos, o que permitiu maior agilidade e
qualidade nas decisões e sentenças.
NA SUA OPINIÃO, O QUE AINDA É PRECISO PARA PREVENIR ESSA PRÁTICA E GARANTIR A PROTEÇÃO NECESSÁRIA ÀS VÍTIMAS?
Há necessidade do emprego de medidas que podem minimizar as
possibilidades de ocorrência da transferência ou retenção ilícita de
crianças. O maior controle da emigração de crianças em alguns países é
medida importante, pois nem todos os Estados-Parte da Convenção da Haia
têm uma política mais restritiva e controladora da saída de crianças,
diversamente do que ocorre no Brasil. É preciso haver mais agilidade na
solução das demandas judiciais fundadas na Convenção, buscando cumprir o
prazo de seis semanas. É importante que haja maior divulgação a
respeito da Convenção, com capacitação de juízes, funcionários e outros
profissionais envolvidos com o tema, inclusive para fins de prevenção.
MESMO ASSIM, CONVENÇÃO DE HAIA CUMPRE EFETIVAMENTE O SEU PROPÓSITO, OU HÁ MAIS ENTRAVES NA APLICAÇÃO DA CONVENÇÃO?
A Convenção da Haia representa importante tratado de cooperação
jurídica internacional no tema que enfrenta, sendo resultado do fenômeno
da internacionalização das famílias e, obviamente, dos conflitos que
surgem entre os pais de uma criança. É fundamental o registro de que,
por ser instrumento de cooperação, a Convenção apresenta conceitos
próprios que não se confundem com aqueles que nós adotamos no Direito
interno, tais como residência habitual, autoridade central, guarda e
visitação. Contudo, ainda há entraves para sua aplicação e, por isso, a
Conferência de Haia vem desenvolvendo esforços para superá-los e, assim,
periodicamente, realiza reuniões e congressos, apresentando boas
práticas, de modo a colaborar para a solução dos problemas.
NA SUA OPINIÃO, QUAIS OS PONTOS MAIS VULNERÁVEIS DA CONVENÇÃO QUANTO AO SEQUESTRO INTERNACIONAL DE CRIANÇAS?
Na realidade, após a Convenção da Haia de 1980, houve a edição de
textos de Convenções que visaram complementar e atualizar alguns
dispositivos anteriores, tal como ocorreu com a Convenção de Haia de
1996. Sucede que o Brasil ainda não internalizou os textos posteriores a
1980 e, por isso, não é possível sua aplicação pela justiça federal
brasileira. Há necessidade de urgente incorporação de tais Convenções,
tal como já aconteceu com a maior parte dos países europeus que
praticamente não mais se utilizam da Convenção de 1980. É preciso,
ainda, maior estímulo à solução consensual dos conflitos que envolvam
pais de uma criança que tem vínculos culturais com dois países, o que
foi objeto de preocupação da última reunião da Conferência da Haia.
Tenho a certeza de que as soluções para os problemas atuais sejam
possíveis com a incorporação das novas técnicas de mediação e
conciliação e, também nesta questão, o Conselho Nacional de Justiça tem
importante papel.
http://www.ibdfam.org.br/imprensa/noticias-do-ibdfam/detalhe/5049
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