A NOVA “LEI DE ADOÇÃO” E SUAS IMPLICAÇÕES: ALGUMAS QUESTÕES A SEREM RESPONDIDAS CONSELHO TUTELAR E CMDCA
31/08/2013
Atribuições do Conselho de Direitos
COM A NOVA “LEI DE ADOÇÃO”, COMO FICA A APLICAÇÃO DA MEDIDA DE
ACOLHIMENTO INSTITUCIONAL (ABRIGAMENTO) POR PARTE DO CONSELHO TUTELAR,
UMA VEZ QUE É ATRIBUIÇÃO DESTE APLICAR AS MEDIDAS NO ART. 101, I A VII,
DA LEI Nº 8.069/90? AGORA É APLICADA EXCLUSIVAMENTE PELA AUTORIDADE
JUDICIÁRIA?
R: O Conselho Tutelar pode aplicar a medida de
acolhimento institucional como sempre pode: em se tratando de crianças e
adolescentes perdidas e/ou que se encontram já afastadas do convívio
familiar e em situações emergenciais (e têm que ser emergenciais MESMO –
como quando houver “flagrante de vitimização”). O que o Conselho
Tutelar NÃO PODE fazer (como na verdade NUNCA PODE, embora o fizesse de
forma equivocada e contra a lei) é afastar uma criança ou adolescente do
convívio familiar em situações não emergenciais, pois neste caso,
apenas a autoridade judiciária é competente para aplicar a medida, em
sede de procedimento judicial contencioso (arts. 101, §2º c/c 153, par.
único, do ECA). Em qualquer caso, mesmo quando o acolhimento for
efetuado em caráter emergencial, o fato deverá ser imediatamente (ou em
até 24 horas) comunicado à autoridade judiciária, nos moldes do previsto
no art. 93 e par. único, do ECA, para que seja formalizado o
afastamento do convívio familiar ou promovida a reintegração. Nos demais
casos, sempre que o Conselho Tutelar entender necessário o afastamento
do convívio familiar, deverá comunicar o fato ao Ministério Público,
fornecendo todos os elementos necessários à propositura de uma ação
destinada ao decreto do afastamento, ainda que em caráter cautelar
(arts. 136, par. único c/c 201, incisos III e VIII c/c 212, todos da Lei
nº 8.069/90). O que não se quer mais é que o Conselho Tutelar funcione
como “carrocinha de criança”, assim como que o afastamento do convívio
familiar seja banalizado e/ou ocorra sem garantir aos pais (e também aos
filhos, já que é o direito à convivência familiar destes que está em
jogo) o direito a uma acusação formal acerca dos motivos do afastamento
(valendo neste sentido também observar o disposto no art. 100, par.
único, incisos IX, X, XI e XII, da Lei nº 8.069/90) e de contra ela se
insurgirem, através de defensor nomeado ou constituído, em respeito aos
princípios constitucionais do contraditório, ampla defesa e devido
processo legal. Vale também lembrar que, mesmo em casos graves, de maus
tratos ou abuso sexual contra crianças e adolescentes, deve ser
verificada, antes de mais nada, a possibilidade de afastamento DO
AGRESSOR da moradia comum (cf. art. 130, da Lei nº 8.069/90 e art. 22,
inciso II, da Lei nº 11.340/2006 – a chamada “Lei Maria da Penha”), como
forma de evitar que a vítima seja punida com a segregação de sua
família. Para que os objetivos da lei sejam alcançados, no entanto, é
preciso mudar a mentalidade e também a postura que, não raro, o Conselho
Tutelar (e outros integrantes do “Sistema de Garantias dos Direitos da
Criança e do Adolescente”) tem adotado, pois como o citado art. 100 par.
único, incisos IX e X (assim como até mesmo o art. 101, §§4º, 6º,
inciso II, 7º e 8º), da Lei nº 8.069/90 deixam claro, a intervenção
estatal necessariamente deve ser voltada não apenas ao atendimento da
criança/adolescente, mas TAMBÉM de seus pais ou responsável,
consequência, inclusive, do disposto no art. 226, capute §8º, da
Constituição Federal.
- O CONSELHO TUTELAR PODE, NOS CASOS DO
ART. 130 DA LEI Nº 8.069/90, PROCEDER AO ACOLHIMENTO INSTITUCIONAL
PROVISÓRIO DE JOVEM OU INFANTE INDEPENDENTEMENTE DE DECISÃO JUDICIAL,
COMUNICANDO IMEDIATAMENTE AO MP PARA OS FINS DO ART. 101, §§2º E 3º, DO
MESMO DIPLOMA LEGAL? CASO NEGATIVO, QUAL A INTERPRETAÇÃO QUE DEVE SER
DADA À PRIMEIRA PARTE DO NOVEL §2º DO ART. 101 DA LEI Nº 8.069/90?
R: O acolhimento institucional, em caráter emergencial e em casos
extremos e excepcionais (como diante de um “flagrante de vitimização”), é
possível não apenas mediante encaminhamento efetuado pelo Conselho
Tutelar, mas por qualquer pessoa (afinal, diz o art. 70, da Lei nº
8.069/90 que “é dever de todos prevenir a ocorrência de ameaça ou
violação de direitos da criança e do adolescente“), sendo certo que as
próprias unidades de acolhimento institucional podem receber crianças e
adolescentes diretamente, em qualquer situação, sem prejuízo da
comunicação do fato à autoridade judiciária em, no máximo, 24 horas
(sendo assim de competência do plantão judiciário, nos finais de semana e
feriados), conforme previsto no art. 93, caput, da Lei nº 8.069/90. O
que o Conselho Tutelar não pode fazer é afastar crianças e adolescentes
de suas famílias em situações não emergenciais (inteligência do art.
136, inciso IX e par. único, da Lei nº 8.069/90), e nem o afastamento
pode ocorrer (ou se manter) mediante simples procedimento administrativo
ou mesmo em sede de processo judicial não contencioso (como é o caso do
resultante da aplicação do disposto no art. 153, da Lei nº 8.069/90,
sendo o parágrafo único acrescido ao dispositivo expresso ao excluir de
sua abrangência os casos em que é necessário o afastamento da criança ou
adolescente de sua família de origem). Quis o legislador que uma medida
tão drástica e de tão graves consequências como o afastamento da
criança ou adolescente de sua família desse ensejo,necessariamente, à
instauração de um processo judicial contencioso, ainda que de cunho
cautelar, no qual fosse formalizada a imputação da prática, por parte
dos pais ou responsável, de alguma conduta que justificasse a medida,
devendo tal conduta ser devidamente comprovada pela parte autora, com a
possibilidade de exercício do contraditório e da ampla defesa pela parte
requerida. Vale lembrar, a propósito, que em jogo não está apenas o
direito dos pais ou responsável de terem os filhos ou pupilos em sua
companhia, mas especialmente (cf. art. 100, par. único, incisos I, II e
IV, da Lei nº 8.069/90), o direito destes em permanecer na companhia de
sua família. Esta é a razão, aliás, para que antes mesmo de se cogitar
no afastamento da vítima de violência física ou sexual, se verificar da
possibilidade de afastamento do agressor da moradia comum, como dispõe
de maneira expressa o art. 130, caput, da Lei nº 8.069/90. Assim sendo,
uma vez efetuado o acolhimento institucional, seja pelo Conselho Tutelar
(diante de situações emergenciais, consoante mencionado, ou em se
tratando de criança ou adolescente perdida ou sem referência familiar),
seja por qualquer pessoa, o importante é a rápida avaliação, por parte
da autoridade judiciária (com a participação do Ministério Público, do
Conselho Tutelar e dos órgãos e técnicos responsáveis pela política
municipal de garantia do direito à convivência familiar) da
possibilidade ou não de imediata reintegração à família de origem (que
se for o caso deverá ser inserida em programas de orientação, apoio e
promoção social, bem como devidamente “monitorada”) ou se o caso reclama
a “formalização” do afastamento da família de origem, mediante a
deflagração do referido procedimento contencioso, nos moldes do previsto
no art. 101, §2º, da Lei nº 8.069/90.
- O QUE FAZER COM OS
RELATÓRIOS, ENCAMINHADOS PELO CONSELHO TUTELAR, EM SE ADOTANDO O
POSICIONAMENTO SEGUNDO O QUAL NÃO DEVEM SER INSTAURADOS OS
“PROCEDIMENTOS JUDICIAIS PARA APLICAÇÃO DE MEDIDA DE PROTEÇÃO”? BASTA
ARQUIVAR NA PROMOTORIA, E EXIGIR PROVIDÊNCIAS DO CT QUANDO À SITUAÇÃO DE
RISCO?
R: Os casos que se enquadram nas atribuições do Conselho
Tutelar devem ser atendidos – e resolvidos - pelo próprio Conselho
Tutelar, que possui o status de autoridade pública e é, inclusive,
dotado da prerrogativa de requisitar serviços públicos em diversas áreas
(cf. art. 136, inciso III, alínea “a”, da Lei nº 8.069/90). Evidente
que, para que a referida soluçãodo problema (objetivo da intervenção do
Conselho Tutelar – e dos demais integrantes do “Sistema de Garantias dos
Direitos da Criança e do Adolescente”) seja alcançada, o Conselho
Tutelar deverá buscar a intervenção de outros órgãos e servidores
públicos, junto aos mais diversos setores da administração, ou melhor
dizendo: deverá buscar auxílio junto à “rede municipal de proteção à
criança e ao adolescente” acima referida, encaminhando a criança,
adolescente e sua família aos programas e serviços adequados às suas
necessidades pedagógicas específicas (cf. art. 136, incisos I e II c/c
arts. 87, 90, incisos I a IV, 100, caput, 101, incisos I a VII e 129,
incisos I a VII, todos da Lei nº 8.069/90). Cabe ao Poder Público local
adequar os serviços públicos e programas existentes (assim como criar
novas estruturas, caso necessário) ao atendimento especializado e
prioritário a crianças e adolescentes (cf. arts. 4º, caput e par. único,
alínea “b” c/c 259, par. único, da Lei nº 8.069/90) e promover a
articulação da mencionada “rede de proteção à criança e ao adolescente”
de modo que, sempre que surgir determinado caso que demande a aplicação
das medidas previstas nos arts. 101, incisos I a VII e 129, incisos I a
VII, todos da Lei nº 8.069/90 (ou seja, que possa ser resolvido sem a
necessidade de intervenção da autoridade judiciária), o atendimento
pelos órgãos, serviços e programas municipais seja efetuado
espontaneamente, não sendo necessário, a rigor, sequer a intervenção do
Conselho Tutelar, que ocorrerá apenas quando, por qualquer razão, tal
atendimento espontâneo não tiver sido realizado ou não tiver surtido o
efeito desejado. Vale repetir: a “rede municipal de proteção à criança e
ao adolescente” deve estar de tal forma articulada (e a busca de tal
articulação, junto ao Conselho Municipal dos Direitos da Criança e do
Adolescente e aos gestores das políticas públicas municipais talvez
tenha de ser a principal preocupação do Ministério Público), que o
atendimento de casos de ameaça ou violação de direitos infanto-juvenis
ocorra de forma espontânea, independentemente de intervenção até mesmo
do Conselho Tutelar, que se tiver de atuar, não deve partir desde logo
para “requisição” do serviço, mas sim o encaminhamento do caso ao órgão
ou setor da administração competente (ou a mais de um, conforme o caso).
Apenas caso não seja atendido é que o Conselho Tutelar deverá usar de
seu poder de requisição, que não pode ser banalizado e nem negligenciado
pelo destinatário da ordem correspondente, que não pode pura e
simplesmente “ignorá-la”, mas sim, caso com ela não concorde, deverá
provocar o Poder Judiciário no sentido de sua revisão, tal qual previsto
no art. 137, da Lei nº 8.069/90. Enquanto não revista pela autoridade
judiciária competente, a requisição do Conselho Tutelar tem eficácia
plena e, caso não seja cumprida por seu destinatário, restará
caracterizado, em tese, o crime de desobediência, previsto pelo art.
330, do Código Penal, sem prejuízo da caracterização da infração
administrativa tipificada no art. 249, da Lei nº 8.069/90. Assim sendo, o
Conselho Tutelar deve ter uma atuação resolutiva, e não servir de mero
“órgão de encaminhamento” de casos para o Ministério Público e Poder
Judiciário, o que apenas posterga a solução do problema e desvirtua o
objetivo da criação do órgão, que foi precisamente o de
“desjudicializar” e, por via de consequência, desburocratizar e agilizar
tanto o atendimento quanto a solução do caso. Em sendo necessária a
intervenção do Ministério Público, esta deverá ser direcionada não no
sentido do atendimento individual do caso, mas sim na perspectiva de
orientação e responsabilização dos órgãos públicos e setores da
administração competentes, que não apenas devem ser chamados a atuar no
sentido da efetiva solução do caso em particular, mas também como dito,
instados a desenvolver uma “estratégia” destinada ao atendimento
(espontâneo) de casos similares que surgirem no futuro, seja quando
encaminhados pelo Conselho Tutelar ou qualquer outro órgão ou
autoridade. A prática da instauração, quando do descumprimento de
encaminhamentos e requisições de serviços pelo Conselho Tutelar, dos
famigerados “procedimentos para aplicação de medida de proteção” ou
similares (verdadeiras aberrações jurídicas, remanescentes de uma
sistemática consagrada pelo “Código de Menores”), deve ser abolida,
dando margem à expedição de recomendações aos órgãos públicos no sentido
da adequação de seus serviços ao atendimento dos casos encaminhados
pelo Conselho Tutelar com a mais absoluta prioridade, inclusive sob pena
de responsabilidade [nota 1]. Na página do CAOPCA/PR podem ser
encontrados artigos jurídicos e modelos de peças processuais e
extraprocessuais destinadas à adequação da atuação do Conselho Tutelar e
dos serviços públicos municipais, nos moldes do acima exposto.
- E SE AINDA ASSIM FOR NECESSÁRIO “JUDICIALIZAR” O ATENDIMENTO, DIANTE
DA NECESSIDADE DE AFASTAMENTO DA CRIANÇA/ADOLESCENTE DE SUA FAMÍLIA?
R: Neste caso, como visto acima, a partir de elementos fornecidos pelo
Conselho Tutelar e/ou por qualquer dos integrantes da “rede de proteção”
à criança e ao adolescente, é possível a propositura de ação cautelar
ou outro remédio jurídico qualquer (cf. art. 212, da Lei nº 8.069/90),
de cunho necessariamente contencioso (cf. art. 101, §2º, da Lei nº
8.069/90), devendo-se antes verificar da possibilidade de afastamento do
agressor da moradia comum (cf. art. 130, da Lei nº 8.069/90) [nota 2],
se for o caso, devendo o feito ser instruído e julgado com a mais
absoluta prioridade (cf. arts. 4º,caput e par. único e 153, par. único,
da Lei nº 8.069/90). Em qualquer caso, desde o primeiro momento deve
haver a intervenção dos técnicos e integrantes da “rede de proteção” e
da política municipal destinada à garantia do direito à convivência
familiar, que deverão, a partir de uma indispensável articulação com o
Poder Judiciário (cf. arts. 87, inciso VI e 88, inciso VI, da Lei nº
8.069/90), avaliar e atender não apenas a criança/adolescente afastada
do convívio familiar, mas também seus pais ou responsável, na
perspectiva de promover a futura reintegração familiar, em observância
às normas e princípios contemplados pela Lei nº 8.069/90. É fundamental
que a Justiça da Infância e da Juventude não atue de forma “isolada”, e
que sejam oferecidas alternativas ao acolhimento institucional,
especialmente através da colocação da criança/adolescente sob a guarda
de integrantes de sua família extensa ou a pessoa cadastrada em programa
de acolhimento familiar.
- O QUE HÁ PARA DIZER SOBRE O TEMA:
CONVÊNIO/CONSÓRCIO ENTRE MUNICÍPIOS PARA CRIAÇÃO, MANUTENÇÃO E USO DE
ABRIGOS (PROGRAMAS DE ACOLHIMENTO INSTITUCIONAL) PARA CRIANÇAS E
ADOLESCENTES?
R: Mais do que “abrigos” (que a nova Lei nº
12.010/2009 passa a chamar de entidades de acolhimento institucional), é
fundamental que cada município possua uma política pública
especificamente destinada ao efetivo exercício do direito à convivência
familiar por todas as crianças e adolescentes, que seja composta de
ações preventivas, junto às famílias, e de alternativas ao acolhimento
institucional, através da oferta de programas de acolhimento familiar
(introduzidos pela nova “Lei de Adoção” – cf. art. 101, inciso VIII, da
Lei nº 8.069/90), estímulo ao acolhimento, sob forma de guarda, de
criança ou adolescente afastado do convívio familiar (cf. arts. 34 e
260, §2º, da Lei nº 8.069/90 e art. 227, §3º, inciso VI, da CF), e
outros destinados à colocação familiar (cf. art. 90, inciso III, da Lei
nº 8.069/90), em suas mais variadas formas: guarda, tutela e adoção (cf.
art. 28, caput, da Lei nº 8.069/90). As inovações trazidas pela Lei nº
12.010/2009, aliás, tornamobrigatória a elaboração e implementação de
tal política pública municipal inclusive sob pena de responsabilidade do
administrador público (e responsabilidade pessoal, nos moldes do
previsto no art. 208, inciso IX e 216, da Lei nº 8.069/90), cabendo ao
Ministério Público atuar neste sentido. O que se deseja é que cada vez
que surgir um caso que demande o encaminhamento para programas de
acolhimento institucional (nunca sendo demais lembra o
caráterexcepcional e eminentemente transitório da medida – cf. arts. 19,
§3º e 101, §1º, da Lei nº 8.069/90), já exista, por parte dos órgãos da
administração pública encarregados da execução da política de garantia
do direito à convivência familiar, uma “estratégia” definida para o
atendimento da criança/adolescente e sua respectiva família (inclusive
na perspectiva de futuro restabelecimento do convívio familiar), com
toda uma gama de opções disponíveis, incluindo as
mencionadasalternativas ao acolhimento institucional, com a aplicação da
medida mais adequada para cada caso. Nesta perspectiva, é possível que
um município de pequeno porte, por exemplo, mantenha uma “casa de
passagem” ou uma entidade de acolhimento institucional apenas para
crianças, estabeleça convênios com outro(s) município(s) próximo(s) para
o acolhimento institucional de adolescentes, tenha convênios com o
Estado do Paraná (e mesmo com entidades particulares) para casos de
maior complexidade e também desenvolva programas de acolhimento familiar
e de estímulo ao acolhimento sob forma de guarda, nos moldes do acima
referido, sem prejuízo de programas de orientação, apoio e promoção
social de famílias, que permitam a manutenção ou a rápida reintegração
da criança ou adolescente em sua família de origem, tudo custeado com
recursos provenientes do orçamento público (valendo neste sentido
observar o disposto nos arts. 90, §2º, 100, par. único, inciso III e
260, §5º, da Lei nº 8.069/90).
- HÁ VIABILIDADE DE LEI
MUNICIPAL CRIAR A “FAMÍLIA ACOLHEDORA” COMO FORMA DE SUPRIR A AUSÊNCIA
DE PROGRAMA DE ACOLHIMENTO INSTITUCIONAL NO MUNICÍPIO, COM PREVISÃO DE
REPASSE DE VERBA MUNICIPAL PARA AS FAMÍLIAS INTERESSADAS EM ACOLHER
CRIANÇAS E ADOLESCENTES EM SITUAÇÃO DE RISCO?
R: Tanto programas do
tipo “família acolhedora” quanto destinados ao estímulo ao acolhimento,
sob forma de guarda, de criança ou adolescente afastado do convívio
familiar (cf. arts. 34 e 260, §2º, da Lei nº 8.069/90 e art. 227, §3º,
inciso VI, da CF) podem ser criados por lei municipal (a criação de
incentivos fiscais, aliás, fatalmente demandará a aprovação de uma lei
específica a respeito). Pode (e deve, com base no art. 226, da CF) ser
previsto, inclusive, o repasse de verbas e incentivos fiscais para as
próprias famílias de origem, seja como forma de evitar o afastamento
familiar (nunca sendo demais lembrar que a falta de condições materiais
não é motivo para tanto – cf. arts. 19, §3º, 23, caput e par. único e
100, par. único, incisos IX e X, da Lei nº 8.069/90), seja para
facilitar a reintegração familiar. Em qualquer caso, é necessário também
desenvolver programas de orientação às famílias (cf. art. 129, inciso
IV, da Lei nº 8.069/90) e efetuar oacompanhamento dos casos atendidos
após a colocação/ reintegração familiar (cf. art. 28, §5º, da Lei nº
8.069/90).
- COMO COMPATIBILIZAR O DISPOSTO NO ART. 100, PAR.
ÚNICO, INCISO III (PRINCÍPIO DA RESPONSABILIDADE PRIMÁRIA E SOLIDÁRIA DO
PODER PÚBLICO) COM O ART. 88, INCISO I (MUNICIPALIZAÇÃO COMO “DIRETRIZ
PRIMEIRA” DA POLÍTICA DE ATENDIMENTO À CRIANÇA E AO ADOLESCENTE), AMBOS
DA LEI Nº 8.069/90, E COMO LIDAR COM A FALTA DE RECURSOS PARA
IMPLEMENTAÇÃO DOS PROGRAMAS E SERVIÇOS QUE DEVERÃO COMPOR A POLÍTICA
DESTINADA À GARANTIA DO DIREITO À CONVIVÊNCIA FAMILIAR?
R: A
municipalização do atendimento decorre não apenas da lei, mas também da
Constituição Federal (arts. 227, §7º c/c 204, inciso I, da Carta Magna),
tendo por objetivo fazer com que cada município elabore e implemente,
com a maisabsoluta prioridade, as políticas públicas que permitam a
efetivação de todos os direitos assegurados às crianças e adolescentes
pela Lei e pela Constituição Federal (tal qual evidencia o disposto no
art. 4º, caput, da Lei nº 8.069/90). Com a municipalização das políticas
de atendimento (e dos programas e serviços que a integram) a crianças,
adolescentes e suas famílias, permite-se sejam aqueles atendidos junto
às suas famílias e comunidades de origem, em cumprimento ao disposto nos
arts. 4º, caput, 19 e 100, caput, da Lei nº 8.069/90, evitando assim
que uma criança ou adolescente que esteja com seus direitos ameaçados ou
violados tenha de ser “exportada” para outro município para somente
então receber o atendimento que necessita. Isto significa que cabe aos
municípios definir as “estratégias” de atuação que serão adotadas diante
da ameaça ou violação dos direitos infanto-juvenis assegurados pela Lei
nº 8.069/90 e pela CF, através da intervenção dos mais diversos órgãos e
entidades de atendimento. Uma política de atendimento, a rigor,
representa o conjunto de ações, serviços e programas a serem acionados
em âmbito municipal para fazer frente a uma situação problemática
específica envolvendo crianças, adolescentes e suas respectivas
famílias, numa perspectiva resolutiva, capaz de proporcionar, com o
máximo de celeridade possível, a proteção integral que foi àqueles
prometida já pelo art. 1º estatutário. Quando a lei estabelece o
princípio da responsabilidade solidária entre os entes públicos, está
apenas dizendo que o dever de assegurar a plena efetivação dos direitos
infanto-juvenis não é apenas dos municípios, mas também dos Estados e da
União. Como resultado da análise conjunta dos citados dispositivos,
temos que a elaboração da política de atendimento à criança e ao
adolescente deve ficar a cargo dos municípios que, no entanto, para
implementação e manutenção dos programas e serviços a àquela
correspondentes sempre que necessário podem buscar o suporte técnico e
financeiro junto aos Estados e à União (se necessário, inclusive pela
via judicial, ex vi do disposto no art. 210, inciso II, da Lei nº
8.069/90). O que não se admite é que o município deixe de elaborar a
política (e definir as mencionadas “estratégias de atuação” a esta
correspondentes) sob a alegação da “falta de recursos”. A uma porque
muitas das ações inerentes à política de atendimento demandam pouco ou
nenhum investimento [nota 3] de recursos públicos, compreendendo o
simples remanejamento servidores e a adequação de programas e serviços
já existentes (como os CREAS/CRAS e CAPs), de modo a proporcionar um
atendimento diferenciado e prioritário à população infanto-juvenil (nos
moldes do previsto nos citados arts. 4º, par. único, alínea “b” e 259,
par. único, da Lei nº 8.069/90), a duas porque a área infanto-juvenil
está amparada pelo já referido princípio constitucional da PRIORIDADE
ABSOLUTA à criança e ao adolescente, o que importa na “preferência na
formulação e na execução das políticas sociais públicas” e na
“destinação privilegiada de recursos públicos nas áreas relacionadas com
a proteção à infância e à juventude“, demandando assim o aporte
prioritário de recursos orçamentários (como deixam também claro os arts.
90, §2º e 260, §5º, da Lei nº 8.069/90), que se necessário devem ser
remanejados das áreas que não gozam de semelhante prerrogativa
constitucional (cf. art. 227, caput, da CF) e a três, porque, como
mencionado, os municípios podem e devembuscar junto aos Estados e União o
suporte financeiro que se fizer necessário à implementação da política a
seu cargo (inclusive pela via judicial), estabelecendo ainda parcerias e
convênios intermunicipais, com entidades particulares, universidades
etc. É até possível que para determinadas demandas de elevada
complexidade (como o caso de adolescentes ameaçados de morte, por
exemplo), o município, notadamente quando de pequeno porte, não tenha o
“programa” correspondente, mas dentro da política de atendimento à
criança e ao adolescente que, como visto, tem o dever de implementar,
deverá ter já definida uma “estratégia de atuação” para quando surgir
tal demanda, com o estabelecimento de um “fluxo” ou “protocolo” de
atendimento interinstitucional, com a previsão de quais órgãos, serviços
e profissionais irão intervir junto ao adolescente e sua família, o que
será feito e para onde serão eles encaminhados, devendo para tanto
firmar convênios (inclusive com o Estado e/ou com a União) [nota 4],
qualificar profissionais etc.
- O CMDCA é também responsável
pela fiscalização das entidades de acolhimento ou isto é tarefa apenas
do Conselho Tutelar, Judiciário e Ministério Publico, referidos pelo
art. 95, do ECA?
R: O CMDCA faz uma fiscalização permanente de todas
as entidades de atendimento a crianças, adolescentes e famílias, que
integram a “rede de proteção” à criança e ao adolescente que todo
município tem o dever de instituir e manter, sendo tal incumbência
decorrência natural da atribuição de conceder o registro às entidades e
aos programas que estas desenvolvem, sem o qual, nem a entidade, nem o
programa podem atender crianças e adolescentes. De acordo com o disposto
nos arts. 90 e 92, do ECA (especialmente, seus parágrafos), com a
redação que lhes deu a Lei nº 12.010/2009, tanto o registro das
entidades quanto dos programas deve ser concedido por prazo determinado
(estabelecendo o ECA um prazo máximo, nada impedindo que o CMDCA defina
prazos mais reduzidos para renovação do registro e reavaliação dos
programas). A reavaliação dos programas de atendimento, aliás, deve
ocorrer em caráter permanente e, toda vez que toda vez que surgir alguma
denúncia de irregularidade, o próprio CMDCA deve “tomar a frente” dos
acontecimentos e investigar os fatos, independentemente da comunicação
do fato ao MP (e eventualmente, também ao CT e ao Judiciário). O
disposto no art. 95, do ECA, aliás, está diretamente relacionado ao
contido no art. 191 estatutário, relativo à instauração de um
procedimento judicial para apuração de irregularidade em entidade de
atendimento. Nada impede, no entanto, queantes mesmo da instauração de
um procedimento judicial (ou paralelamente a este), o CMDCA instaure um
procedimento administrativo, que pode inclusive resultar na cassação do
registro da entidade e/ou do programa, desde que constatada a ocorrência
de fatos que justifiquem semelhante medida, de caráter extremo. Seria
interessante, aliás, que o regimento interno do CMDCA estabelecesse um
procedimento administrativo próprio para este tipo de investigação
administrativa, que deveria contar com a colaboração dos órgãos públicos
competentes, garantindo-se à entidade o contraditório e a ampla defesa,
além da previsão de comunicação de sua instauração ao Ministério
Público. Na ausência de previsão expressa, é de se adotar o procedimento
administrativo similar àquele utilizado pela Prefeitura para cassar
“alvarás de funcionamento” de estabelecimentos comerciais em geral
(estabelecendo-se aí uma analogia entre ambos). É fundamental, em
qualquer caso, que o CMDCA atue com o máximo de celeridade, de modo a
evitar que, em havendo de fato alguma irregularidade, a mesma cause – ou
continue a causar – prejuízos às crianças e adolescentes atendidas. Não
resta dúvida que, pior que não existir determinado programa em um
município, é haver um que descumpre as normas e princípios estabelecidos
pela Lei nº 8.069/90 (ou outros regulamentos aplicáveis àquela
modalidade de atendimento, incluindo as próprias resoluções do CMDCA,
que na forma da lei devem ser cumpridas sob pena de descredenciamento da
entidade e da cassação do registro do programa - o que em ambos os
casos deve determinar a imediata suspensão do atendimento prestado).
Vale dizer, aliás, que a “qualidade e eficiência do trabalho” se
constitui num dos critérios legais para renovação do registro do
programa de atendimento fixados pelo art. 90, §3º, do ECA, assim como
também é “o efetivo respeito às regras e princípios desta Lei, bem como
às resoluções relativas à modalidade de atendimento prestado expedidas
pelos Conselhos de Direitos da Criança e do Adolescente, em todos os
níveis“. Assim sendo, sempre que o CMDCA receber qualquer notícia de
irregularidade numa entidade ou programa, não apenas tem o direito, mas
também tem o dever de investigar o fato, sem prejuízo de, como dito,
obrigatoriamente comunicar o fato ao Ministério Público(valendo neste
sentido observar o disposto no art. 220, do ECA), e mesmo articular
ações e contar com a colaboração de outros órgãos e autoridades públicas
para que o aludido procedimento administrativo instaurado chegue a um
bom termo, da forma mais rápida possível.
_______________________________
Notas do texto:
1 Com a orientação de que, caso entendam indevido o encaminhamento ou
requisição efetuadas, provoquem a autoridade judiciária nos moldes do
art. 137, da Lei nº 8.069/90, apresentando as justificativas para recusa
no atendimento respectivo.
2 Vale lembrar que, em sendo ajuizada
uma ação cautelar de afastamento da criança/adolescente da família (ou
mesmo do agressor), será necessário o ajuizamento da ação principal no
prazo de 30 (trinta) dias.
3 Em matéria de infância, nunca se fala
em “despesa”, pois todo e qualquer recurso público utilizado representa
uminvestimento que tem um retorno garantido em termos de melhoria das
condições de vida e desenvolvimento de toda sociedade brasileira.
4
Para utilizar o exemplo fornecido, a União possui um Programa Nacional
de Proteção de Crianças e Adolescentes Ameaçados de Morte – PPCAM, cujas
ações são desenvolvidas em âmbito de cada Estado, a partir de
determinadas entidades especializadas.
Fonte: A nova “Lei de Adoção”
e suas implicações: algumas questões a serem respondidas. Perguntas
& Respostas. Centro de Apoio Operacional das Promotorias da Criança e
do Adolescente do Estado do Paraná. CAOPCA – PR. Disponível em <http://www.crianca.caop.mp.pr.gov.br/modules/conteudo/conteudo.php?conteudo=926#nota1
>. Acesso 31.08.2013.
http://canalconselhotutelar.wordpress.com/2013/08/31/a-nova-lei-de-adocao-e-suas-implicacoes-algumas-questoes-a-serem-respondidas-conselho-tutelar-e-cmdca/
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